RESULTADO DO PRIMEIRO TRIMESTRE E PERSPECTIVAS
No primeiro trimestre deste ano a balança comercial brasileira apresentou um superávit de US$ 1,03 bilhão, a comparar com um déficit de US$ 682 milhões em igual período do ano passado.Nos doze meses findos em março o saldo da balança comercial já atinge US$ 4,3 bilhões.
Esse resultado parcial sugere que parece viável a obtenção de um saldo próximo de 5 bilhões para o ano como um todo, como projeta o Governo. O saldo de US$ 594 milhões obtido em março superou as projeções mais otimistas e não parece impossível que isso ocorra para o ano como um todo. Seria, aliás, muito bom e até necessário que o resultado para a balança superasse as expectativas este ano. Isso poderia ser o nosso salvo conduto para atravessar as turbulências provocadas pela crise argentina.
O que não agrada no resultado do primeiro trimestre, para a balança comercial, é que ele tenha sido obtido pela redução das importações e não pelo aumento das exportações.
Isso tem a ver com a crise argentina, em boa parte, mas não somente com a crise argentina. As exportações não tem, até agora, apresentado resultados compatíveis com o tamanho da desvalorização cambial.
Com relação ao resto do mundo, as perspectivas para este ano são, em geral, favoráveis, na medida em que a recuperação econômica abra espaço para o aumento das nossas exportações, embora tenhamos que enfrentar problemas específicos como o da siderurgia.
BALANÇA COMERCIAL, CRESCIMENTO, CREDIBILIDADE E CÂMBIO
A obtenção de um superávit na balança comercial, igual ou maior que o projetado, é crucial para manter a confiança de investidores e financiadores estrangeiros. Isso, entretanto, poderá não ser suficiente.
Precisamos, também, demonstrar que podemos fazer isso e ainda crescer a um ritmo razoável. Precisamos, ao mesmo tempo, crescer e reduzir nossa vulnerabilidade cambial.
A única forma segura de se fazer isso é através do aumento das exportações. Gerar saldos comerciais exclusivamente com queda de importações seria passar a idéia de que precisamos de recessão para fechar o balanço de pagamentos. Isso em nada ajudaria a nossa credibilidade internacional. A Argentina está aí para nos lembrar que não basta a estabilidade. Sem o crescimento, um dia vamos ter problemas.
Em condições normais, já teríamos um menor ingresso de investimentos externos diretos este ano, em face do menor volume de privatizações. Diante das incertezas naturais de um ano de eleições, por outro lado, muitos investimentos tendem a ficar postergados. O mesmo tende a ocorrer com os financiamentos, principalmente em relação a um país vizinho e importante parceiro comercial da Argentina. Essa é uma realidade geográfica e geopolítica, que não podemos ignorar.
Para que não tenhamos pressões fortes no mercado de câmbio, o melhor remédio é diminuirmos nossa dependência dos recursos externos. O melhor remédio é, portanto, reduzirmos o déficit em conta corrente além do esperado (espera-se um déficit em torno de 20 bilhões de dólares para 2002, contra 23,2 bilhões em 2001).
Se o saldo da balança subir para 6 ou 7 bilhões de dólares e o déficit em conta corrente cair para 18 ou 19 bilhões, teremos duplo efeito: menor necessidade de recursos externos e maior oferta desses mesmos recursos. O efeito sobre o mercado cambial tenderia a ser semelhante ao ocorrido esta semana, ao anúncio de um saldo maior que o esperado na balança comercial.
Desvios para baixo, das projeções na balança comercial e, para cima, na conta corrente, por outro lado, tendem a produzir duplo efeito perverso: maior necessidade de recursos externos e menor oferta desses mesmos recursos. Neste caso, o dólar tenderia a subir, com seus efeitos sobre a inflação, os juros e o crescimento.
BRASIL 1999 X BRASIL 1983
Em l999, com a grande desvalorização cambial, o Governo (O FMI também acreditou) chegou a projetar um superávit de 11 bilhões de dólares na balança comercial. No final, deu um déficit de 1,3 bilhão, melhor que o déficit de 6,6 bilhões de 1998, mas completamente diferente da cifra inicialmente imaginada. Isso nos lembra como são precárias as previsões econômicas.
Em l983, fizemos uma desvalorização de 30% e o objetivo era sair de uma balança comercial equilibrada para um superávit de 6 bilhões de dólares. Na época, o autor destes comentários era Chefe do Departamento Econômico do Banco Central, que tentou, sem sucesso, convencer os economistas dos bancos credores da viabilidade daquela meta. Depois de muita argumentação aceitaram US$ 4 bilhões como projeção do superávit da balança comercial de 1983. Naquele ano, o saldo foi de US$ 6,4 bilhões, portanto, acima da própria projeção do Governo.
Fatos como esses costumam acontecer e nos fazem lembrar do professor Mário Henrique Simonsen, que gostava de dizer que economista é aquele que explica no futuro por que as previsões do passado não se cumpriram.
Tomara que, neste ano, tenhamos um resultado melhor que os 5 bilhões de dólares previstos pelo Governo para a balança comercial. Isso não é impossível. Aliás, estamos precisando que isso aconteça, para que a crise argentina não nos prejudique mais do que já prejudicou.
A tranqüilidade que estamos vivendo na área cambial, neste momento, mesmo com a aguda crise argentina e as altas nos preços internacionais do petróleo, poderá ser preservada nos próximos meses, pela conjugação de resultados francamente favoráveis na balança comercial com expectativas razoáveis no cenário político interno. Ambas parecem possíveis, embora não se possa dar como certas.