Crescemos! E com a pompa merecida. Nosso muito obrigado aos quase três mil amigos que prestigiaram a abertura da temporada 2014 dos Concertos Dana, no Auditório Araújo Vianna, dia 14 de agosto. Foi um grande espetáculo. Grande em números, significados e sentimentos. O público do Araújo Vianna nos recebeu com o mesmo entusiasmo que há mais de 50 anos recebe os importantes feitos e espetáculos históricos de Porto Alegre.
No palco, a impecável Orquestra de Câmara da Ulbra, sob a batuta do maestro Tiago Flores, e o swing de um convidado mais do que aguardado por estes pagos: Lenine. Compositor, cantor e arranjador, Lenine trouxe a ginga e a musicalidade de seus 30 anos de estrada. No repertório, composições de seis dos seus 10 discos de carreira. No semblante, o deleite e a honra de compartilhar a sensibilidade de suas canções com as cordas de uma orquestra.
Os arranjos orquestrais, um belo capítulo à parte, foram criados por Ruriá Duprat – “alter ego sinfônico” do próprio Lenine, como nosso próprio convidado costuma brincar – e Alexandre Ostrowski e Pedrinho Figueiredo, parceiros costumeiros de outros tantos Concertos Dana.Lenine abriu à capela com o maracatu lento “Gandaia das Ondas/ Pedra e Areia”. Em poucos segundos, a doce canção do disco “Olho de Peixe” (1993) – o segundo de sua carreira, lançado em parceria com Marcos Suzano – já reverberava no Araújo Vianna. Uma amostra da intensidade da poesia de Lenine. Tamanha é sua força – e que carisma! –, que emendou com naturalidade o ritmo caribenho “Rosebud (O Verbo e a Verba)”, composto com Lula Queiroga para o álbum “Falange Canibal” (2001).
A música seguinte, mais uma parceria com Queiroga, trouxe a composição título do disco “Chão” (2011). Muito aplaudido e totalmente à vontade – trata-se de seu último álbum, carregado de suaves ruídos de seu cotidiano real e íntimo –, Lenine retribuiu com a delicada “De Onde Vem a Canção” e fez questão de dividir com o público sua visível alegria: “Espero que vocês se divirtam da mesma maneira que eu estou me divertindo”.O concerto continuou por uma linha do tempo que ia e vinha, passeando por diversas fases, encontros e experimentos que condimentaram seu fértil repertório. De volta aos idos de 1993, dose tripla de “Olho de Peixe” com o hino pernambucano “Leão do Norte”, composta em parceria com César Pinheiro e oportunamente dedicada a Eduardo Campos; “O Último Pôr do Sol”, com Lula Queiroga; e “Miragem do Porto”, com Bráulio Tavares.
De seu primeiro álbum solo, “O dia em que faremos contato” (1997), a levada dançante de “Que Baque é Esse?” contagiou a plateia. Mas foi com a suingada “Jack Soul Brasileiro”, do disco “Na Pressão” (1999), que Lenine ganhou de vez o público. Prova de que o reconhecimento com os prêmios Sharp na categoria “Revelação” e APCA de “Melhor álbum de música popular”, respectivamente, foram mais do que merecidos para os dois trabalhos.
“Lavadeira do Rio”, outra parceria com Bráulio Tavares, preparou o terreno para uma das canções mais aguardadas da noite: “Paciência”. As cordas do arranjo intimista, os versos que suplicam freios nos ponteiros e a intensidade da apresentação fez muita gente lacrimejar e retribuir a emoção com uma chuva de aplausos.
Em seguida, Lenine apresentou seu filho mais novo, a canção “Envergo, mas não Quebro”, outra faixa de seu último disco, o mais conceitual de sua carreira. O músico convidou: “Presta atenção no bichinho”. A plateia riu e aceitou o convite, claro. E, com a mesma vibração, embarcou no compasso quebrado do rock “Do it” e nos versos suaves de “O Silêncio das Estrelas”, dos álbuns InCité (2004) e “Falange Canibal” (2001), ambos premiados com o Grammy Latino.Depois de muitos – e merecidos! – aplausos, Lenine voltou para o bis, brincou, reverenciou a orquestra e, acompanhado de um coral de quase três mil pessoas arrebatadas e felizes, derramou a linda “Hoje eu quero sair só” sem esquecer de sublinhar um importante recado: “Não demora eu tô de volta”. Sorte a nossa. Volta logo, Lenine!