Nada mais atual para as demandas do século XXI do que a busca por tecnologias que possibilitem o reúso de resíduos como matérias primas ou insumos em novos processos industriais. No Rio Grande do Sul, onde apenas 12% do esgoto são tratados, o descontrole já inutilizou metade das águas do Rio Gravataí, na Região Metropolitana de Porto Alegre. O mesmo que dá nome à cidade onde se localiza o Complexo Industrial da empresa. Segundo dados do IBGE, o Gravataí é o 5º rio mais poluído do País.
No Brasil, a aplicação de resíduos provenientes de esgoto sanitário no solo ainda é motivo de controvérsias, mas é amplamente utilizado em países desenvolvidos. Sabesp, Emater e Embrapa já conduzem estudos há pelos menos uma década, com resultados de eficácia e viabilidade econômica. Além de suporte e fonte de nutrientes minerais para os vegetais, o solo é um sistema heterogêneo com características físico-químicas e biológicas peculiares. Pode inativar íons e compostos por adsorção, precipitação ou complexação. Diversos estudos comprovam que os microrganismos do solo podem decompor os mais diversos resíduos orgânicos e parasitar outros organismos estranhos que ao mesmo tempo aportam.
O Projeto Zero Efluente da Dana passou por licenciamento da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (FEPAM), órgão regulador ambiental do Estado do Rio Grande do Sul. O volume de resíduos licenciado é de 100 m³/dia, ou 100.000 litros/dia.
De acordo com dados mundiais, o consumo médio de água, tratada e encanada, de uma residência com quatro pessoas é estimado em aproximadamente 22m³. Assim, o volume tratado em apenas um dia pelo Projeto Zero Efluente equivale ao consumo de água tratada de quatro famílias ao longo de um mês.
Quanto à área licenciada, não se trata de uma propriedade degradada. Optou-se por utilizar no experimento uma área de 2,87 hectares do terreno da empresa subdividida em nove módulos, entre 0,17 e 0,34 hectares. Em cada um deles foram analisadas características de solo e cultura a fim de avaliar a capacidade de absorção, evitando a geração de escoamento superficial que poderia provocar erosão. Assim, o sistema irriga alternadamente cada módulo.
O efluente é aplicado ao solo em um sistema de aspersão em cada um dos módulos com diferentes áreas. Toda a aplicação é controlada por um Controlador Lógico Programável (CLP), baseado em um microprocessador, que desempenha funções de controle com softwares desenvolvidos pela empresa. Estão programados o volume de efluente tratado máximo diário para cada módulo, de acordo com os volumes licenciados. O sistema possui também um detector de umidade que interrompe a aplicação dos efluentes nos dias de chuva a fim de evitar escoamento superficial e o risco de erosão.
Antes de ser lançado ao solo, o efluente bruto (efluente industrial e cloacal) recebe tratamento, que consiste na oxidação da matéria orgânica complexa, a carga poluidora, através de reações de oxidação geradas por micro-organismos que utilizam a carga poluidora existente nos esgotos como substrato (alimento). Utiliza-se a tecnologia skid para tratamento de águas residuárias domésticas/industriais, baseada na tecnologia de leitos móveis, na qual os micro-organismos crescem fixados em um meio suporte móvel, formando um biofilme de intensa atividade biológica, alto tempo de retenção celular e alta concentração de biossólidos com grande remoção de carga orgânica e carga nitrogenada. O tratamento é continuo e ocorre em meio aeróbio (em presença de oxigênio). O lodo, resíduo sólido resultante do processo tem como destino, previsto na legislação, a ETE.
Do ponto de vista técnico, os indicadores do projeto atestam sua eficácia. De acordo com o Relatório Técnico de Monitoramento do Efluente – Laudo de análise do efluente consta em anexo sob Registro número 100377/2015 (eurofins) de 18/11/2015, os resultados quantitativos do efluente final, em mais de 20 parâmetros, estão de acordo com os padrões para a aplicação em solo agrícola. Em uma avaliação quantitativa da aplicação em solo, considerando apenas os três principais nutrientes presentes no efluente e, fornecidos ao solo em kg/ha, com taxa de aplicação de 50,0 m³/ha/dia, temos:
- volume de Nitrogênio de 26,8 (mg/L) fornece 1,34 kg/ha em mineral.
- volume de Fósforo de 3,62 (mg/L) fornece 0,18 kg/ha em mineral.
- volume de Potássio de 15,5 (mg/L) fornece 0,77 kg/ha em mineral.
Pode-se dizer que o Projeto Zero Efluente corrobora positivamente para o atingimento dos ODS 11 e 12, porque:
- Se insere nas iniciativas do Brasil e de todo mundo sobre o uso do nitrogênio amoniacal, presente no esgoto doméstico e um agente poluidor de rios, lagos e mares, como nutriente para solos, com aplicação na agricultura e recuperação de áreas degradadas;
- Abre caminho para uma solução combinada entre o setor industrial e companhias de saneamento. Como demonstram os dados apresentados, atualmente, grande parte dos municípios brasileiros, despeja diretamente o esgoto sem qualquer tipo de tratamento nas bacias hidrográficas.
- A viabilidade econômica é comprovadamente um vetor para o desenvolvimento sustentável, por isso a fertirrigação pode ser uma solução alternativa para remoção do nitrogênio, fósforo e potássio (NPK), que embora vigente na lei ambiental, não é simples em tratamentos tradicionais. Isso se deve a dois fatores: à baixa biodegradabilidade do nitrogênio e do fósforo; e à predominância no Brasil dos tratamentos por meio biológicos, tendo em vista seu menor custo.
Reconhecimento
Esta iniciativa foi reconhecida na 5ª posição do Ranking Benchmarking Brasil 2016, com o Selo de Compromisso Ambiental da Câmara de Vereadores de Gravataí em 2016 e pela CNHI do Grupo Fiat com o Prêmio de Sustentabilidade no Suppliers Excellence Awards 2018
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