Ford busca a medida certa para o carro “conectado”

The Wall Street Journal

 

À medida que a Ford Motor Co. busca deixar de ser só uma montadora e se tornar uma empresa de “serviços de transporte” altamente tecnológica, o papel da área de informática da firma está mudando rapidamente, diz Marcy Klevorn, uma veterana da Ford que se tornou diretora de tecnologia de informação em janeiro de 2015.

 

Nos últimos 12 meses, Klevorn, de 56 anos, ampliou a presença da Ford no Vale do Silício e assumiu um papel mais abrangente no desenvolvimento de produtos, num momento em que o software vira parte integrante de todos os veículos.

 

A Ford também está experimentando com compartilhamento de caronas e o aluguel de carros cujo pagamento é feito por quilômetros rodados. A montadora vem ainda ampliando sua frota de testes de veículos autônomos e, em abril, vai lançar um aplicativo, chamado FordPass, que permitirá aos usuários, sejam eles donos de carros da marca ou não, reservar e pagar vagas de estacionamento ou alugar seus veículos para outros motoristas. (O FordPass chegará primeiro aos Estados Unidos e Canadá, com previsão de lançamento em vários outros mercados, incluindo o Brasil, ainda este ano).

 

O The Wall Street Journal conversou com Klevorn sobre seu papel na meta de transformar a Ford numa líder de mercado em tecnologias de carros conectados. Abaixo, trechos editados da entrevista:

 

WSJ: Com a inclusão de novas tecnologias nos carros Ford, como a forma de ver a tecnologia de informação mudou na empresa?

Klevorn: O escopo mudou totalmente. Quando comecei, há 32 anos, tecnologia de informação era processar pagamentos de salários numa sala nos fundos de algum lugar. Aí, ela passou a lidar com a mecanização dos processos corporativos para ganhar eficiência. E, agora, temos que pensar como usaremos a TI para ajudar nossos clientes e ajudar a Ford. Agora temos que pensar mais sobre o aspecto da receita na equação.

 

WSJ: Da perspectiva do cliente, o que vou ver em um carro da Ford que não via antes?

Klevorn: Quando se pensa no FordPass, é realmente como a Ford pode ajudar a melhorar sua vida e torná­la mais eficiente, quer você compre um carro ou não. Pode ser dentro do veículo; pode ser fora. Uma das mudanças de paradigma que estamos vendo como empresa ­ e onde estamos como que transformando a nós mesmos ­ é que nosso modelo de negócios costumava ser uma relação entre uma pessoa e um veículo. Isso está mudando.

 

WSJ: Qual o maior desafio para colocar o FordPass e outras tecnologias de “carros conectados” no mercado?

Klevorn: Haverá muitas coisas para se colocar nos veículos e coisas com as quais o cliente poderá interagir fora deles. Creio que o que importa é obter a mistura certa e descobrir como a inteligência artificial participa disso e como fornecer suporte quando algo der errado. A forma como tudo isso se encaixa e como vamos integrar cada parte vai determinar o vencedor.

 

WSJ: O que você quer dizer com a mistura certa?

Klevorn: Eu penso em coisas como: há algo que posso fazer dentro do meu carro que hoje tenho que fazer fora dele? Se eu puder fazer essas coisas dentro do carro, então, quando estiver presa no trânsito, poderei usar o tempo para resolver mais problemas. Melhorar a vida do cliente pode não ter nada a ver com o veículo, mas há coisas que as pessoas precisam fazer que podem ser trazidas para dentro do veículo. O desafio é encontrar o equilíbrio certo para não virar um fardo e nem distrair o motorista, para você realmente melhorar e não complicar a vida deles.

 

Outra questão é o suporte ao cliente. Nos últimos anos, incentivamos as pessoas a procurar o site da empresa e tentar resolver seus problemas sozinhas. Vejo a tendência retornando para um suporte mais participativo.

 

Permita­nos interagir com você e usar essa interação para saber mais sobre você como cliente. Mas, aí, você tem que estar ciente dos custos e respeitar o tempo das pessoas. É mais uma questão de equilíbrio.

 

WSJ: Como convencer as pessoas a usar as novas tecnologias que a Ford está desenvolvendo?

Klevorn: Temos modems em nossos veículos elétricos há algum tempo, então estamos usando isso para começar a plataforma de dados de veículos conectados. E vamos extrair os dados dessa plataforma ­ com a permissão de nossos clientes, porque é um programa optativo ­ e analisá­los para descobrir modos mais proativos de avisar ao cliente sobre oportunidades de serviços.

 

Por exemplo, podemos oferecer um caminho melhor, sabendo que sua rota é sempre a mesma? Podemos conectar você com sua casa e ligar o aquecimento ou abrir a porta da garagem quando você estiver chegando?

 

WSJ: Como você vai educar as pessoas sobre esse software?

Klevorn: Isso me lembra uma experiência pessoal. Eu me mudei para Alemanha há poucos anos ­ fui diretora de TI da Ford na Europa ­ e pensava em minha mãe. Ela tinha uns 70 anos na época. Ela queria se comunicar comigo via FaceTime ou manter contato de alguma forma. Então, compramos um MacBook Air para ela e ela foi até a loja da Apple porque podia sentar­se com alguém e tirar dúvidas. Depois de ficar mais esperta e tentar algumas coisas, ela então podia voltar e fazer mais perguntas. Não era algo intimidante.

 

Quando penso em nossos veículos, ninguém vai pegar o manual e ler tudo, embora nós forneçamos um. Hoje, as pessoas geralmente querem aprender através da experiência e conversando com outras pessoas que tiveram essas experiências.

 

Então, eu sinto que faremos mais pesquisas com clientes, criaremos experiências em grupo e em chats, e repensaremos o apoio dado aqui na Ford.

 

Há situações em que as pessoas querem se sentar com alguém com a tecnologia que possuem e conversar a respeito. Para os consumidores e seus veículos, acho que nós temos que ser mais como uma loja da Apple, onde existe alguém com quem eu possa conversar, que seja acessível e não intimidante. E, aí, depois que eu aprender algumas coisas, posso levar meu veículo para casa e talvez tirar outras dúvidas, ou entrar em um grupo on­line com outras pessoas de 75 anos que possuem um carro igual ao meu. Nós precisamos pensar mais dessa forma. (The Wall Street Journal/Steven Norton)