Empresas discutem redução de investimento e negociação de dívidas para preservar caixa

O Estado de S. Paulo

 

A famosa expressão do mundo dos negócios “Cash is King” é hoje a mais utilizada no dia a dia das companhias. Ao longo desta semana, o alto escalão das empresas, debruçado sobre o plano de contingenciamento para o período em que a população estará de quarentena para conter o ritmo de disseminação do novo coronavírus, colocou na mesa a necessidade de adoção de uma força-tarefa com a intenção de preservar caixa. Corte de investimentos, menor distribuição de dividendos e renegociação para alongamento de dívidas têm sido as alternativas mais citadas pela administração e conselho de administração das empresas nesse momento.

 

A rede varejista esportiva Centauro, por exemplo, que terá grandes impactos no seu negócio com o fechamento do comércio, criou um comitê focado para administrar os efeitos da crise provocara pela pandemia do coronavírus. O grupo está preparando providências para minimizar o dispêndio de caixa, comentou hoje o presidente da companhia, Pedro Zemel. Apesar de esperar efeitos, ainda não foram informadas redução de investimentos ou mudanças de planos.

 

Uma fonte, que atua em diversos conselhos de administração de companhias no Brasil, que falou na condição de anonimato, disse que, no geral, as empresas colocaram em seus planos de contingência a parada de investimentos, redução de contratos com consultorias, férias coletivas, dentre outras medidas. “As empresas estão tomando ações prevendo três meses de crise”, comentou a fonte.

 

Nas montadoras, tais planos já começaram a sair do papel. General Motors e Mercedes-Benz darão férias coletivas a partir do fim desde mês. A primeira incluiu em seu plano para preservar capital, ainda, o adiamento de seu programa de investimento. Já a Volkswagen protocolou ontem à tarde no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC a intenção de dar férias coletivas.

 

“Nesse momento, gestão de capital de giro é fundamental. Adiar investimentos em ativo fixo, em campanhas de marketing, em programas de treinamento são medidas que as empresas devem tomar”, lista uma fonte de mercado. Outra ação que deverá ser tomada pelas companhias de capital aberto, por exemplo, é redução na distribuição de dividendos ou postergação dos pagamentos para o segundo semestre do ano. “As empresas têm que ser prudentes e manter o máximo de caixa possível nesse período”, comenta a mesma fonte.

 

Para ajudar a lidar com esse período, as empresas estão direcionando também questionamentos aos seus advogados. “Começaram a surgir no escritório uma série de discussões de cláusulas de ‘Ato de Deus’ ou força maior. Muitos estão perguntando se tem como usar essa cláusula para não pagar fornecedores e bancos. Além disso, já surgem muitas discussões para reestruturação de dívidas”, diz uma fonte, também na condição de anonimato. No mundo jurídico, ‘Act of god ‘abrange as forças incontroláveis e inesperadas da natureza, ao passo que ‘force majeure’ (força maior) inclui também as consequências provocadas pela ação do homem, tal como uma guerra ou mesmo uma greve.

 

“As companhias precisam ficar de olho nos seus custos, isso em tempo real, e reduzir onde é possível, fazendo novas negociações com fornecedores, revendo a necessidade de compra ou expansão de maquinário e, infelizmente, avaliar a necessidade de demissões”, destaca o consultor empresarial e especialista em governança corporativa, Marcelo Camorim. “É preciso também, se possível com apoio dos sindicatos e associações patronais, desde já buscar incentivos do governo medidas como prorrogação para o pagamentos de impostos e criação de programas de empréstimos para fortalecimento de capital de giro das empresas, e claro, com taxas bem abaixo do mercado, ou até mesmo a juro zero, se possível”, conclui.

 

“A exposição dentro dos setores varia. Espera-se que os varejistas não alimentícios e especializados sofram, enquanto supermercados, hipermercados e farmácias devem registrar resultados sólidos. Dada a falta de uma grande presença online da maioria dos varejistas na América Latina, as empresas que dependem das vendas de shopping centers são vulneráveis ao fechamento dessas instalações por quarentena”, segundo relatório da agência de classificação de riscos Moody´s, sobre os impactos da quarentena. (O Estado de S. Paulo/Fernanda Guimarães)