Jipão virou carro de mulher?

O Estado de S. Paulo

 

Seis anos atrás, fui a única mulher a participar de uma tarde de bate-papo entre jornalistas, consultores do mercado automobilístico e representantes de uma montadora asiática que se preparava para inaugurar fábrica no Brasil. Ao final da rodada de apresentações, fui cercada por diversos executivos, todos estrangeiros. O que eles queriam saber? Que tipo de carro atrai a mulher brasileira.

 

Como eles se dirigiram a mim exclusivamente pelo fato de eu ser mulher – afinal, havia ali outros especialistas -, eu poderia ter respondido: carros baixos, pequenos, ágeis no trânsito, com boa resposta de direção e suspensão com foco no bom desempenho em curvas. Ah, e com um moderno sistema de som, porque escutar música altíssima para enfrentar o trânsito é primordial. E bancos de couro, por favor.

 

Mas, se tivesse dado essa resposta, estaria sendo injusta. Essas são minhas preferências e, pelo menos quando um assunto é carro, elas estão muito longe da generalização do universo feminino.

 

Então, respondi baseada em minhas observações do consumidor ao longo de anos de atuação no jornalismo automotivo. Espaço é obrigatório e porta-objetos por todos os lados, essencial. Porta-malas generoso é muito bem-vindo, principalmente para as que têm filhos. Itens de série? Elas fazem mais questão dos de conforto, e prezam a segurança muito mais que os homens.

 

As peruas e minivans sempre serviram bem aos propósitos femininos. Até então, elas também eram boas clientes de sedãs, embora esse tipo de veículo não tenha aquele porta-malas que dá para ser usado até o teto.

 

Mas aí surgiu um novo fator: elas descobriram que os “jipões” reuniam o melhor de dois mundos, com um quê de perua e outro de minivan. A posição alta de dirigir é o principal apelo. Já ouvi muitas mulheres justificando essa preferência: “Eu me sinto poderosa no trânsito. Isso (a posição de guiar) passa mais segurança.”

 

Talvez elas tenham experimentado o SUV do marido, do namorado, do pai, do amigo. Só sei que elas descobriram o segmento, e agora não querem mais nenhum outro tipo de carro. E os másculos jipões, 4×4, muitos deles a diesel, aos poucos foram se tornando carro de mulher. Antes, o SUV da casa era deles. Agora, é delas.

 

As opções foram também ficando mais diversificadas. Em vez de 4×4, tração dianteira. No lugar do motor a diesel, o a gasolina (ou flexível). O conforto foi sendo aprimorado, com o uso de base de carros de passeio. Os itens de série, adaptados ao gosto feminino.

 

Então, na hora de responder à pergunta dos executivos asiáticos, listei as características que atraem as mulheres, mas, como eles insistiram para eu citar um segmento, não tive dúvida: SUV. As reações foram de surpresa, mas acho que agora eles se convenceram: anos após a inauguração da fábrica, essa marca lançará, no ano que vem, um utilitário-esportivo compacto no Brasil. Alvo: o público feminino.

 

Agora, da Europa, vem uma notícia que mostra que essa cisma da mulherada com SUVs não é exclusividade das brasileiras não!

 

Na Lamborghini, marca cuja linha é limitada a superesportivos rápidos, mas muito duros e desconfortáveis para o gosto generalizado das mulheres, apenas 5% do público é feminino. Mas a montadora pretende mudar isso. Como? Com o Urus, o primeiro utilitário-esportivo de sua história, a ser lançado em 2018.

 

O carro terá motor de 600 cv e promete entregar a rapidez característica dos Lamborghini, mas com um quê de conforto, que é disso que elas gostam.

 

Pelo jeito, os jipões estão virando carro de mulher no mundo inteiro. (O Estado de S. Paulo/Rafaela Borges)