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Lendas brasileras
Imagem: ilustração de Rodrigo Rosa

Silêncio. Aqui e ali o pio de um passarinho ou o barulho das águas nas pedras. Vez por outra o vento bate nas folhas das árvores produzindo um farfalhar agradável que é música para os ouvidos do pescador.

Ele está ali na beira do rio há horas. Chegou em sua canoa e está providenciando o alimento sagrado que o rio lhe concede. De repente, o barulho de algo ou alguém atirando-se na água. Um canto maravilhoso, uma voz sedosa. O pescador sabe que ninguém habita aquelas redondezas. E começa a ter uma certeza.

Espreitando aqui e ali, depara com a visão mais bela e terrível que poderia ter. De pé, magicamente sobre as águas, ele a vê: corpo esbelto de mulher bem-feita, pele alva, olhos mágicos, gestos sinuosos e uma cabeleira sedosa e incrivelmente dourada. Ela está ali. Alguns metros a sua frente, olhando fixo para seus olhos e chamando-o.

Sabedor do perigo que corre, embora extasiado com a visão de mulher tão fascinante, o pescador retira-se do local às carreiras, com a alma desesperada pelo terror. Ele conhece o destino dos que atendem ao chamado da Iara.

Imagem: ilustração de Rodrigo Rosa
Imagem: ilustração de Rodrigo Rosa

Mas ela é paciente. E aparecerá para o pescador solitário outras tantas vezes, até virar-lhe a cabeça e provocar-lhe o desejo que predominará sobre a prudência, jogando-o em seus braços. Totalmente encantado pela beleza da moça, o pescador será arrastado para as profundezas do rio, de onde só sairá morto.

Diz a lenda que a lara surge nos rios, chamando os homens para amá-la em seu reino, arrastando consigo os mais fracos. É mulher de exuberante beleza. Um tipo físico diferente daquele a que os moradores das regiões do interior do Brasil estão acostumados. E os homens caem de paixão pela Iara.

Dizem que os corpos são encontrados dias depois. Nos lábios, dilacerados pelas mordidas das piranhas, as marcas dos beijos da Iara.

Imagem: ilustração de Rodrigo Rosa
Imagem: ilustração de Rodrigo Rosa

Essa lenda explicaria a morte de tantos bons nadadores por afogamento. De nítida influencia européia, sendo o correspondente brasileiro das sereias que já atormentavam Ulisses na Odisséia, a Iara apresenta um tipo físico de olhos, pele e cabelos claros, fora dos padrões tupiniquins.

Habita, porém, todas as regiões do Brasil, chegando a ser apresentada como a versão feminina do Boto. Pobres dos homens. Se as mulheres o Boto ama, os homens a Iara mata.

Origem da lenda

Também confundida com a Mãe D’água, a Iara é facilmente identificada, principalmente pelas semelhanças de comportamento e características, com o mito das sereias.

Imagem: ilustração de Rodrigo Rosa
Imagem: ilustração de Rodrigo Rosa

Homero, ao descrever as aventuras de Ulisses em sua Odisséia, colocou seu herói em maus bocados ao enfrentar o canto das belíssimas sereias que arrastavam os marinheiros para a morte nos rochedos banhados pelo mar.

A lenda da Iara, como atualmente é conhecida, descrevendo a mulher bela que arrasta os homens para o fundo das águas, tem sua origem em meados do século XIX, conforme relata Luis da Câmara Cascudo, em seu Dicionário do Folclore Brasileiro.

Antes dessa época, as lendas indígenas apresentavam a Mãe D’água sob a forma de serpente devoradora de homens. Em momento algum, porém, utilizando a sedução como forma de apanhar suas vítimas.

Várias contradições apontam para o acerto dessa classificação da lenda da Iara como de origem européia, principalmente as descrições que a retratam como loura de olhos azuis, um biotipo completamente fora dos padrões indígenas brasileiros.

A lenda, porém, existe e é das mais populares. Talvez por essa identificação imediata com a imagem de mulher ideal, embutida na cultura brasileira pelos padrões europeus de beleza, nos últimos 100 anos.

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DobraDana

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