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GP da Argentina de 1980: Keke Rosberg e Emerson. Imagem: acervo Lemyr Martins

Quando começou a temporada de 1975, a Fittipaldi já tinha montado uma base de apoio logístico na Inglaterra, em Reading, Londres, perto do aeroporto de Heathrow, de onde partiam e retornavam a cada corrida. Eram instalações suficientes para os reparos e revisões dos carros entre os grandes prêmios. Os motores eram revisados diretamente na Cosworth, organização que preparava os V8 da época.

Em 1980, a Fittipaldi cresceu. Comprou a Wolf, uma escuderia fundada em 1977 que disputou 47 grandes prêmios em três temporadas. Na estréia, venceu o GP da Argentina daquele ano e conquistou mais duas vitórias, em Mônaco e no Canadá, todas com o piloto sul-africano Jody Scheckter. A razão social passou de Fittipaldi Empreendimentos para Fittipaldi Automotive e a empresa passou a ocupar um prédio maior, também em Reading, ainda alugado.

Foi uma boa compra, não só pela melhora das instalações e dos caminhões-trailers e pelos motores a mais, mas principalmente pelo pessoal técnico que passou a trabalhar com a Fittipaldi. Migraram o projetista Harvey Postlethwaite, o diretor técnico Peter Warr (ex-Lotus), mecânicos experientes e o estagiário Adrian Newey, estudante laureado no famoso Empire College, um instituto de engenharia e aerodinâmica. É o mesmo Newey que trabalha como engenheiro da McLaren, e que foi elevado à categoria de gênio por projetar os Williams e McLaren campeões na década de 90. A compra ainda incluia o veloz piloto finlandês Keke Rosberg.

Emerson a bordo do F-7. Imagem: acervo família Fittipaldi
Emerson a bordo do F-7.
Imagem: acervo família Fittipaldi

O patrocínio da Copersucar permitiu apostas ousadas dos Fittipaldi durante cinco anos. Mas, em 1979, a nova diretoria da cooperativa tinha outros planos em sua política de divulgação. Decidiu portanto não mais participar da Fórmula 1, mesmo que o carro brasileiro fosse campeão do mundo naquela temporada.

A Fittipaldi voltava ao zero, restando ao Tigrão outra missão à altura de sua coragem: a busca de novo patrocínio. Eis como ele lembra a perda e a conquista do novo financiador: “Conseguir um novo parceiro foi uma briga, mas fechamos um bom acordo com a Skol. Nos primeiros três anos eram dois milhões de dólares por temporada, com reajuste de 10% a cada ano”.

De patrocinador novo, a Fittipaldi iniciou o ano de 1980 com Emerson testando o F-7 em Paul Ricard, na França. Depois de quatro temporadas como equipe Copersucar, o piloto entrava em seu décimo ano de Fórmula 1, pilotando o Skol-Fittipaldi F-7. Os testes no autódromo francês iniciaram em 12 de novembro de 1979, dia em que Emerson completava 33 anos. Estreava ali o sétimo modelo da linha Fittipaldi, o quarto pilotado pelo bicampeão mundial. O carro não tinha nada de revolucionário. Era, porém, um autêntico carro-asa, bem ao estilo da Fórmula 1 dos anos 70 e similar à linha do Williams da temporada 1979.

Em três dias de testes no circuito menor de Paul Ricard, o F-7 mostrou que tinha potencial e, em apenas 15 voltas, Emerson chegou à marca de 1 minuto e 9 segundos, só três décimos acima do recorde da pista. No segundo dia, o novo Fitti rendeu ainda melhor. Com algumas alterações aerodinâmicas, fechou os testes cravando 1’06″7 – o recorde era de 1’06″2.

Wilsinho estava mais uma vez esperançoso, mas resolveu esperar pelos treinos de Buenos Aires, uma semana antes do GP da Argentina de 1980, a chamada hora da verdade. Pelo menos nos testes de começo de ano, o novo Fitti deu bons motivos para otimismo. Bateu as marcas do McLaren e do Lotus e ficou só meio segundo atrás do Ligier, o melhor protótipo daquela temporada. E, se ainda não era um carro para ser campeão, pelo menos não decepcionou. A Fittipaldi, com Emerson e Keke Rosberg, fechou em sexto no campeonato dos construtores, terminando empatada com a McLaren, em 11 pontos, e à frente da Ferrari e da Alfa Romeo.

O começo do fim Imagem: clipping família Fittipaldi
O começo do fim
Imagem: clipping família Fittipaldi

Mas a proeza não foi suficiente para manter o patrocinador. No fim do primeiro ano, os diretores da Skol comunicaram a Wilsinho que tinham vendido a marca para a Brahma. Nada mudou nos primeiros seis meses, mas, em janeiro de 1981, os diretores da Brahma decidiram romper o patrocínio.

“Não entendi a atitude deles”, recorda Wilsinho, narrando o novo capítulo da nova novela do patrocínio: “Nós tínhamos um contrato em plena vigência, prevendo mais dois anos, mas a Brahma insistia no rompimento, propondo o seguinte acordo: nos pagariam de janeiro até junho e nos dispensavam de usar a pintura da Skol no carro. No outro ano e meio restante, eles não pagariam nenhum centavo”.

“Eu consultei três advogados, que foram unânimes em garantir que era causa ganha. Até porque, no contrato com a Skol foi incluída uma cláusula pela qual, na eventualidade da venda da empresa, a compradora teria de honrar o contrato. Mas mesmo assim eles queriam briga. Como era clara a má vontade deles, brigamos mais um pouco, mas acabamos aceitando as condições e encerramos a parceria. A nova situação complicou muito a nossa vida, pois além de entrar a temporada seguinte sem patrocinador, não poderíamos seguir com os projetos futuros”.

Também não houve auxílio de nenhum governo. Embora o general presidente João Batista Figueiredo recebesse Wilsinho e Emerson numa audiência, em janeiro de 1982, e acenasse com a mediação de um patrocínio de dois milhões de dólares (250 milhões de cruzeiros na época), a promessa não se concretizou. A única ajuda financeira para a Fittipaldi naqueles tempos bicudos foi um empréstimo de Mansur Ojeh, um bilionário árabe. Ojeh, dono da TAG – Tecnique d’Avant Garde –, organização que preparava os motores Porsche que equipavam os McLaren de 1983 a 1987, também foi quem carreou o megapatrocínio da companhia aérea Saudia Airlines, que propiciou à Williams o salto de equipe média à grande escuderia atual.

Esse árabe, que mais tarde tornou-se o sócio majoritário da McLaren, prorrogou a insolvência da Fittipaldi por alguns meses. No desespero, sem saber mais a quem apelar, Wilson e Emerson procuraram Mansur Ojeh no escritório da TAG, em Genebra, e expuseram seu drama. Tinham bons planos e chance de sobrevida na Fórmula 1, mas precisavam urgente de patrocínio. O árabe convidou os Fittipaldi para um almoço e, sem muito rodeio, desiludiu-os do patrocínio, mas passou-lhes um cheque de 250 mil dólares. Não exigiu qualquer tipo de garantia, apenas pediu-lhes o compromisso de que pagariam o empréstimo assim que pudessem. Isso, em meados de 1981, quando a Fittipaldi começava a naufragar.

O que a Fórmula 1 me ensinou

Se perguntado sobre o que aprendeu com o empreendimento e construção do F-1, Wilson Fittipaldi Jr responde de imediato: “tudo”. Ele primeiro se refere ao lado político dos bastidores do circo, onde vivenciou as manobras internas da Fórmula 1, mas acha que a grande abertura aconteceu na parte técnica e desportiva.

“Eu já conhecia o Bernie Ecclestone desde 1972, de quem fui piloto na época em que ele era proprietário da Brabham. Mas só quando me tornei construtor e membro da FOCA – Formula One Constructors Association –, que o Bernie preside, é que conheci a sua fantástica visão de negócios. Foi Ecclestone quem transformou a Fórmula 1 no grande showbiz que é hoje. Ele já defendia a entrada das montadoras no circo há 30 anos, numa época em que nós, os proprietários das escuderias, não acreditávamos que fosse o melhor caminho. Nos inclinávamos pela busca de patrocínios, que já era uma conquista difícil”.

E quem estava com a razão? Mister Ecclestone. Basta observar que a equipe deste milênio que não se associou a alguma montadora faliu ou vive capengando. São os casos da Minardi e da Jordan. “No lado pessoal, a Fórmula 1 também me mudou sensivelmente. Eu trabalho muito e exijo o mesmo das pessoas que trabalham comigo. Mas tropeçava no pavio curto, o que me criava enormes problemas. Portanto, era eu e não o mundo quem teria que mudar. Aprendi a ser mais político e a “aumentar” o pavio. E essa tolerância a Fórmula 1 me ensinou. Me preparou para as lições mais duras, como a de honrar os compromissos quando tivemos que encerrar as atividades da escuderia. Fomos obrigados a nos desfazer praticamente de todo o nosso patrimônio. Fechamos as portas na Inglaterra de forma criteriosa, sem criar problemas nem para o Emerson nem para mim.

Entregamos toda a massa falida ao fisco inglês, sem usar de nenhum expediente de má-fé na operação. Fechei a porta e entreguei a chave com todas as máquinas e equipamentos, entre os quais se incluíam os caminhões, 14 motores, os chassis e os protótipos. Enfim, a Fórmula 1 mudou tudo na minha vida e me tornou o que eu sou até hoje. Aprendi a lutar para subir, a refazer aquilo que não deu certo e a voltar a me equilibrar”.