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O artista das cores entra em ação para restaurar e pintar os carros da Equipe Fittipaldi. Imagem: Marcelo Spatafora

Um homem que mesclava cores e formas harmoniosas e dinâmicas com uma força que ampliava o envolvimento do público com o espetáculo da corrida. E sem pretensão, fez de sua arte um importante instrumento de marketing, um símbolo que engrandeceu o automobilismo. Guardadas as proporções, representou para o esporte o mesmo que Portinari foi para a arte. Foi um mestre que criou o estilo e a técnica do realce de carros e capacetes. Seu talento deu ao automobilismo, aos pilotos e também ao público, um importante patrimônio, que enriqueceu e tornou mais belo o ambiente das corridas.

Cloacyr Sidney Mosca, ou simplesmente, Sid Mosca, nasceu em Jaú e veio para São Paulo trazido por seus pais com apenas seis meses de idade. A família Mosca instalou-se em Santo Amaro, bairro paulistano de onde nunca mais saiu. Ele começou a trabalhar cedo, com apenas 14 anos de idade, e exerceu diversas funções, até que se tornou funileiro em uma oficina mecânica. Foi lá que descobriu a sua vocação, em uma época em que as peças dos carros não eram simplesmente trocadas como hoje. Era serviço para artesão. Não tardou e seu talento começou a despontar. Sentia prazer em, espontaneamente, polir e pintar detalhes nos acabamentos dos seus trabalhos para valorizar o visual dos carros e surpreender os clientes.

Depois de alguns empregos, montou a sua primeira oficina de funilaria e pintura em uma das ruas centrais do tradicional bairro e depois se transferiu para um espaço maior, onde comercializava carros e também realizava reparos para vendê-los sem defeitos aos clientes. Posteriormente, fixou-se em outro espaço, onde deu início à atividade de pintura artística.

Sid com Wilson Fittipaldi e Ingo Hoffmann. Imagem: Marcelo Spatafora
Sid com Wilson Fittipaldi e Ingo Hoffmann.
Imagem: Marcelo Spatafora

Com muito esforço comprou um Fusca e inscreveu-se em corridas para novatos, disputadas em Interlagos. Evoluiu nas provas e chegou à principal divisão da categoria Turismo. Como os dos demais pilotos, inicialmente seu carro tinha os números de identificação colados na carroceria com adesivos ou fita isolante. Os capacetes eram uma simples proteção, moldados em fibra de vidro e pintados de cor qualquer. E essa tradição não o agradava. Um dia viu em uma revista o carro de Bob Unser, um dos ídolos norte-americanos da época, com o número 76 pintado com efeitos sombreados. Entusiasmou-se com a ideia e adotou uma personalização em seu carro e em seu capacete causando admiração nos demais pilotos e no público.

Logo surgiram encomendas e depois de algumas aprovadas pelos clientes surgiu o primeiro famoso: o piloto Ingo Hoffmann, com pedido para o seu capacete e para o carro. Logo, a lista de clientes cresceu e incluiu, entre outros, a pintura dos carros da única equipe brasileira de Fórmula 1, a Copersucar dos irmãos Fittipaldi, e também os capacetes de Emerson, de quem recebeu carta branca para criar alguns dos mais arrojados e belos trabalhos, que receberam a assinatura Painted by Sid – Brasil.

O mestre ensina os segredos de sua arte. Imagem: Marcelo Spatafora
O mestre ensina os segredos de sua arte.
Imagem: Marcelo Spatafora

A carreira de Sid foi ponteada por fatos emblemáticos, como a recuperação da carenagem da Lotus de Mario Andretti, incendiada na prova de classificação para o Grande Prêmio do Brasil de 1977. Chamado por Wilsinho Fittipaldi, em menos de seis horas de trabalho intenso, madrugada adentro, Sid Mosca fez o milagre de, com a sua equipe, entregar o carro pronto, o que todo o Team Lotus e o próprio Colin Chapman, lendário projetista, consideraram um trabalho fantástico.

Outro ponto alto da carreira de Sid foi o desenvolvimento de um projeto especial, a pedido de Bernie Ecclestone, principal executivo das corridas de Fórmula 1, para a pintura de capacetes a serem entregues a personalidades do automobilismo internacional em comemoração aos 50 anos da Fórmula 1.

Sid Mosca, com a sua arte, foi o responsável pelo design dos capacetes de praticamente todos os pilotos brasileiros de renome e de muitos outros da Fórmula 1, Fórmula Indy e de várias categorias. Um dos que mais marcaram Sid foi o de Ayrton Senna, que adotou as cores da bandeira brasileira e cuja base foi mantida desde o início da carreira do piloto. “Esse tema me dá muito orgulho, porque foi um dos símbolos que mostraram ao mundo o lado altamente positivo do Brasil e que eu ajudei a criar”, comentava com emoção.

Muito próximo de comemorar 60 anos de carreira, Sid Mosca fez um de seus grandes e, infelizmente, últimos trabalhos: a restauração e a pintura do Copersucar, ato final do projeto desenvolvido pela Dana para salvaguardar um dos principais patrimônios históricos do automobilismo brasileiro.

Sid Mosca maquiando o novo Fitti-1. Imagem: Marcelo Spatafora
Sid Mosca maquiando o novo Fitti-1.
Imagem: Marcelo Spatafora

Esse trabalho importante foi feito em sua loja-atelier no número 893 da Avenida Washington Luís, onde seu filho, Alan, mantém o rico acervo histórico criado por Sid Mosca. Um acervo histórico, formado por alguns carros da Fórmula 1, Fórmula Indy e de outras categorias, assim como réplicas de capacetes que desenhou, diplomas e premiações internacionais que recebeu por sua brilhante carreira.

Apesar de todo o seu talento, Sid foi um homem simples, despojado. Sempre reconheceu que começou do zero e nunca imaginou que pudesse conquistar tanto prestígio com a sua arte. “Quando comprei este prédio, tinha vergonha de utilizá-lo como minha nova empresa, porque achava demais para a minha simplicidade de vida. Só um ano depois ganhei coragem e não posso deixar de ser grato a tudo o que me foi permitido produzir”, foram algumas de suas últimas declarações, provocando emoção.

Sid atribuiu parte de seu sucesso a Santo Amaro por ser essa a região com a maior concentração de equipes e de oficinas preparadoras de carros de corrida do Brasil, segmento no qual se especializou e com sua arte encantou pilotos e os que amam as corridas em todas as partes do mundo.

Arte nas pistas - nosso Portinari do automobilismo devolve as cores para o Fitti-1 de Wilsinho. Imagem: Marcelo Spatafora
Arte nas pistas – nosso Portinari do automobilismo devolve as cores para o Fitti-1 de Wilsinho.
Imagem: Marcelo Spatafora

loja-atelier de Sid Mosca guarda o patrimônio que construiu. São lembranças de um dos maiores artistas do automobilismo, do qual sentimos falta e temos saudades desde que nos deixou, no dia 20 de julho de 2011. Deve ter ido para o céu. Onde, com todo o seu talento, o tornará ainda mais bonito, para continuar a extasiar os que tiverem a felicidade de merecer entrar no paraíso.

Por Luiz Carlos Secco
lcsecco@secco.com.br

Luiz Carlos Secco, atualmente diretor da Secco Consultoria de Comunicação, é jornalista do setor automobilístico desde 1961. Trabalhou nos jornais O Estado de São Paulo e Jornal da Tarde e na revista AutoEsporte, até se transferir para a Ford para assumir a gerência de imprensa. Na fusão da Ford com a Volkswagen foi nomeado gerente-executivo de Imprensa da Autolatina até 1992, quando deu sequência às suas atividades profissionais na empresa cuja direção divide com seus filhos, José Carlos e Luiz Fernando. Foi, também, o jornalista que deu apoio a Emerson Fittipaldi nos primeiros anos de sua carreira internacional e a diversos outros pilotos, principalmente José Carlos Pace, Luiz Pereira Bueno, Ricardo Achcar, Antonio Carlos Avallone, José Maria Ferreira e Ronald Rossi. Foi a ele que Sid Mosca concedeu a última entrevista de sua vida, publicada no Canal Dana.