Ricardo Finocchiaro Bolsoni, o “Ricardinho”, é diretor executivo/fundador da Abstratti Produtora, aonde se concentram produções de shows do rock em geral, com ênfase no mais pesado, em Porto Alegre e em alguns casos, do Brasil. Já passaram por aqui através do esforço da Abstratti a turnê brasileira de Paul Di’Anno nos anos de 2009 e 2010; e shows de bandas como Simphony X, Millencolin, NOFX, Glenn Hughes, Richie Kotzen, Cradle of Filth, Epica, Blaze Bayley, Biohazard, Kip Winger, entre muitos outros. O que poucos associam é que a veia artística e roqueira da família já vem de longa data. IN UTERO.
Sua vida sempre foi cercada de música. Quando você percebeu que não iria escapar disso?
Acho que sempre fui tão envolvido nisso que nem me dei conta. Não tive oportunidade de reagir. (risos)
A ideia de deixar os holofotes para os artistas e gerenciar/produzir/promover a estrela deles foi espontânea?
Na verdade foi tudo muito natural, começou com uma tentativa de festa de aniversário, a festa de aniversário não saiu, mas o show sim e foi bom, fui convidado pela casa a ter uma data semanal e foi daí que começou tudo.
A Abstratti hoje é sinônimo de profissionalismo onde geralmente isso não existe, o que falta pra cena alternativa é organização?
O que falta para a cena é um melhor espaço, com mais estrutura, para as bandas de médio e pequeno porte, para que não fiquemos dependentes sempre dos grupos de fora. Falta muito é apoio e patrocínio das empresas, dentro do rock é quase impossível conseguir algo. Além disso, em relação a profissionalismo, falta respeito com o músico e com o público, sem eles, não existe cena alguma.
Quais foram os melhores shows que você produziu?
Isso é um pouco relativo. Existem shows que foram ótimos, mas que deram prejuízo para a produtora e houve shows que não foram tão bons e que nos proporcionaram lucro. Em termos de produção nossa gosto de citar o Shaaman em 2005 no Auditório Araújo Vianna (último show antes da interdição do local), que foi um divisor de águas para nós, o NOFX no Pepsi on Stage e o Millencolin no Opinião, ambos no ano passado.
Deve ter uma boa dúzia de histórias de backstage pra contar, qual você considera inesquecível?
Poxa, é pra citar uma só? (risos) teve uma que foi muito pitoresca. Aconteceu no show do Biohazard ano passado onde o Evan Senfield (vocal/baixo) da banda, que também é ator pornô, precisava fazer um teste negativo de HIV para poder participar de um filme que ele teria gravações dois dias depois do show. Passamos um dia inteiro atrás de um laboratório que conseguisse o resultado do exame em 24h, porém, no Brasil, isso não existe e ele perdeu a participação no filme, uma pena. (risos)
Dá pra dizer que o público do rock mais pesado é o público mais fiel? Por que isso acontece, ou se mantém a lenda?
Sim, em relação à fidelidade, é verdade. Claro que existem exceções à regra, mas de um modo geral é um tipo de público que ainda compra CD, compra camisetas, gosta de chegar cedo aos shows e se interessa mesmo por tudo que envolve a banda. Se fizermos uma média de público nos shows de som pesado e outras vertentes, veremos que, na proporção, o som pesado leva vantagem.
O que já podemos esperar de atrações da Abstratti em 2011?
Este ano já realizamos os shows do Blaze Bayley (ex Iron Maiden) e Richie Kotzen (ex Mr. Big e Poison). Temos confirmados ainda Kamelot (10 de abril), Helloween & Stratovarius (02 de maio), Pain of Salvation & Symphony X (07 de junho), A Day to Remember (08 de junho), Black Label Society (14 de agosto) e Blind Guardian (06 de setembro), mas com certeza teremos mais shows ainda este ano!
Na sua playlist caseira rola toda essa barulheira dos eventos, ou você é mais tranquilo?
Em casa não escuto NADA de som pesado, salvo raríssimas exceções. Aqui toca mesmo o rock and roll clássico dos anos 70 e 80, blues, soul e alguma coisa de música erudita.
Voltando às histórias de família, os Finocchiaro já conservam um bom legado. Vamos falar de ninguém mais ninguém menos que a sua mãe, Lory F.
Lory F. provavelmente foi a culpada de eu ser assim (risos). Na verdade, não tive muito contato com minha mãe, meus pais quase sempre foram separados e, em minha infância, eu morava com meu pai no Rio de Janeiro, vindo visitar ela aqui em Porto Alegre ou em São Paulo nas férias. Mas sempre que estava com ela era aquela coisa de ouvir música, escutar ela tocar, ter contato com os amigos músicos, ver aquele entra e sai de equipamentos e gente louca. (risos)
A Lory teve uma carreira curta e avassaladora, acompanhando o lifestyle da sua geração, tinha tudo pra ser mais uma mulher “papo firme” do rock, em nível até nacional, mas se foi de um jeito triste [Lory foi vítima do HIV]. O que poderia ser mais um motivo de alerta para os jovens de hoje fica meio esquecido. Como você enxerga isso? Essa inconseqüência que permanece no romantismo de sexo, drogas e rock and roll.
Sobre o potencial dela, eu acho que se fosse hoje em dia, ela estava feita. Pois hoje em dia é muito mais fácil das pessoas conhecerem o teu trabalho. Na época que ela estava na melhor fase de composições e projetos – entre 1989 e 1993 – foi uma entressafra braba do rock and roll no Brasil, uma fase BEM careta, onde você podia notar que nada realmente rock and roll despontava na cena, era só o pop que aparecia ou as bandas que já tinham alguma bagagem e/ou disco lançado.
Sobre o alerta aos jovens, acho que isso vai de cada um, a coisa sempre foi não exagerar em nada, pois é o exagero que leva a alguma consequência ruim. Vivo em um meio rock and roll sim, que rola droga com certeza, se é muita? Não sei, na minha visão é menos do que na geração anterior à nossa ou a coisa nas escritas da história nos parecem mais fortes do que foram. Vejo muito mais inconsequência nas atitudes interpessoais do que em relação a drogas ou sexo, acho que, de um modo geral essa lenda da tríade ‘Sexo, Drogas & Rock and Roll’ é muito verso e pouca prosa.
O que a gente percebe nas histórias do “rock gaúcho”, é que as mulheres geralmente ficam de fora, ou só são lembradas as “groupies”, ou as “magras do bonfa”… O “rock gaúcho” é machista?
Não acho machista nosso ‘Rock Gaúcho’, as mulheres, em um contexto geral do rock, sempre foram minoria. Vejo muito mais preconceito vindo das próprias mulheres em relação a mulheres no palco do que dos homens. Existem mulheres talentosas na nossa música, porém falta talvez um pouco mais de exibição destas mesmas para que se destaquem. Acho que o público as receberia bem sim.
A Deborah (Finocchiaro) chegou a fazer um esforço em resgatar a trajetória da Lory. Em 1996, produziu o cd póstumo (Lory F. Band) * e aos poucos surgem no Youtube alguns videoclipes. Vem mais coisa pela frente em termos de divulgação, ou é só uma iniciativa memorial?
A Débi (Deborah) sempre tentou divulgar como pôde, ela e minha outra tia, a Laura, sempre deram algum jeito de ‘colocar na roda’ o som. Os clipes foram gravados entre 1995 e 1997 se não me engano, são ‘antigos’ mas só agora está indo para a Internet graças a esforços de amigos e admiradores do trabalho dela.
Sendo bem franco, por hora, é mais uma iniciativa memorial, não há nenhum planejamento concreto de divulgação ou novos lançamentos. Na minha visão, de filho e admirador do trabalho dela, adoraria ver músicos da cena atual tocando as canções dela, para minha satisfação pessoal, nada poderia ser melhor do que isso.
O que é preciso “Pro amor viver em paz” **?
‘Pro amor viver em paz’ está faltando mais verdade no caráter das pessoas. Menos hipocrisia, parar com essa mania estúpida de julgar tudo e todos e de dizer o que os outros devem ou não fazer, pois, na maioria das vezes, quem julga não realiza o que prega. Falta viver mais, na paz do amor.
*Lory F. Band era formada por Lory Finocchiaro na voz e baixo, em parceria com uma série de músicos, como o sax inconfundível de King Jim (Garotos da Rua), entre muitos outros como Márcio Ramos, Marcelo Fornazier , Edinho Galhardi, João Guedes, Adriana Gazola, Janice Fenner, Márcia Ramos, Edinho Espíndola, Eduardo Pacheco, Chico Ferreti, Léo Ferlauto, Paulo Nequete e Miguel Cruz.