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Paulo Renê Bernhard comemora os 10 anos do Banco de Alimentos Imagem: acervo Banco de Alimentos

Em mais de 10 anos de atuação, o Banco de Alimentos de Porto Alegre – o primeiro do país – já arrecadou mais de 16 milhões de quilos de alimentos. Com uma equipe enxuta, mas com apoio de empresas, universidades e muitos voluntários, esta OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) está mudando o cenário da fome na capital do Estado e expandindo suas boas práticas para outras cidades do Rio Grande do Sul e do Brasil. Todos os meses, o Banco de Alimentos distribui 250 toneladas de alimentos em Porto Alegre, atingindo uma média de 40 mil pessoas, entre crianças, jovens e idosos. Além de arrecadar, armazenar, separar e distribuir alimentos em perfeitas condições de consumo, o Banco também promove ações de Segurança Alimentar nas 360 instituições atendidas. Confira a entrevista com Paulo Renê Bernhard, Presidente Executivo voluntário, e saiba como você, seus amigos e a empresa em que você trabalha também podem fazer parte da luta contra a fome.

O Banco de Alimentos foi criado em dezembro de 2000. Como surgiu a ideia de criar esta organização e como foram os primeiros passos?

Nos idos de 1999, nós fomos convidados pelo Conselho de Cidadania da Fiergs para tratar deste assunto tão relevante que é o problema da fome. Na época, 11 ou 12 entidades (Fundação dos Rotarianos de Porto Alegre, Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, Parceiros Voluntários, sindicatos, etc.) se reuniram e resolveram enfrentar este desafio. Nós começamos a identificar quais seriam os pilares e as necessidades para que pudéssemos fazer este enfrentamento tão grande. Foram dois anos preparatórios para criar o Banco, já que este foi o primeiro Banco de Alimentos criado no Brasil e nós não tínhamos nenhum comparativo no país. O primeiro pilar identificado foi o da Segurança Alimentar e todas as orientações que envolvem este assunto. Então o primeiro grande convite foi feito para as universidades e tivemos a participação inicial da Unisinos, que montou uma extensão da Faculdade de Nutrição dentro do Banco.

Caminhões do Banco em frente aos depósitos Imagem: acervo Banco de Alimentos
Caminhões do Banco em frente aos depósitos
Imagem: acervo Banco de Alimentos

O segundo grande desafio seria o da logística, já que não adianta ter o alimento acumulado e ter um custo maior de operação pra transportá-lo. Então o Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas começou a participar da Diretoria do Banco. E assim nós fomos convidando várias instituições que foram os grandes articuladores. A partir deste grupo, criou-se o Banco de Alimentos e no ano de 2000 nós começamos a desenvolver as nossas atividades. A grande vitória desta iniciativa foi conseguir reunir a sociedade: instituições, empresas, imprensa, agências de publicidade. Foi um esforço da sociedade para a sociedade, uma ação empresarial pela cidadania, focada no problema que atinge a dignidade humana.

Baseado em modelos de Portugal e outros países que já tinham Banco de Alimentos, nós desenvolvemos um cadastro inicial, que chamamos de mapa social, que identifica aquelas forças vivas da sociedade que fazem a coisa acontecer. Fizemos uma identificação destas pessoas, das creches, lar de excepcionais, asilos. Levantamos onde estavam, por quem eram coordenadas, quantas pessoas atendiam. Sempre tendo como referencial apoiá-las e fortalecê-las. Foi um processo invertido: nós fomos visitar estas instituições ao invés de elas nos procurarem. Fomos procurá-las, cadastrá-las e estabelecemos uma prioridade de atendimento, até porque nós não tínhamos muitos alimentos no início. Mas nós fomos nos especializando, nos modernizando, fomos aprendendo e lá pelo quarto, quinto ano de existência, nós já tínhamos uma prática reconhecida em nível mundial.

Cestas básicas prontas para distribuição Imagem: acervo Banco de Alimentos
Cestas básicas prontas para distribuição
Imagem: acervo Banco de Alimentos

Na prática, como funciona o trabalho do Banco de Alimentos?

O Banco faz o gerenciamento dos alimentos captados e distribuídos de forma organizada, funciona como se fosse uma empresa. Nós já temos o mapa social, já sabemos das necessidades das instituições. Então nós coletamos os alimentos por intermédio de campanhas, junto às empresas principalmente, buscamos formas inovadoras de captação de alimentos, armazenamos, avaliamos através dos alunos e professores do curso de Nutrição, e depois distribuímos utilizando a logística administrada pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas. Hoje, em Porto Alegre, o Banco atende 360 instituições e todos os meses doa 250 toneladas de alimentos, atingindo uma média de 40 mil pessoas todos os meses, entre idosos, jovens e crianças. Além disso, o Banco também prevê auxílio nas tragédias. Na última tragédia em Santa Catarina, o Banco atendeu com 250 toneladas de alimentos. Na recente tragédia no Rio de Janeiro, com mais de 100 toneladas. O atendimento é feito sempre de forma criteriosa, organizada, com nota fiscal, sem risco de roubos e uso indevido dos alimentos.

Em 2007, foi criada a Rede de Banco de Alimentos do RS; em 2010, foi criada a Rede de Banco de Alimentos do Brasil. Como aconteceu esta expansão?

A metodologia do Banco é muito simples e de muito fácil replicabilidade. Cidades como Pelotas e Caxias começaram a nos procurar, solicitando que o Banco atendesse estas cidades. Então nós começamos a fornecer a receita, nós orientamos em como estas cidades poderiam criar os seus próprios bancos. Hoje, Caxias distribui mais de 100 toneladas de alimentos por mês. O Banco funciona lá, com as lideranças deles, com captações de lá, usando o mesmo modelo daqui. E assim proliferou, Guaíba, Gravataí, Cruz Alta e várias outras cidades do Estado aderiram a esta Rede.

Em 2010, nós tivemos a oportunidade de participar de um evento nos Estados Unidos que reuniu bancos do mundo inteiro e percebemos que a relação destes bancos com o mundo se dá a partir de redes nacionais. Então quando nós retornamos, criamos na Fiergs a primeira rede brasileira de banco de alimentos. Até porque esta metodologia já está em outros Estados, como Rio de Janeiro, Pernambuco, etc. A criação da rede brasileira acaba estabelecendo um relacionamento e um fortalecimento para todos os bancos. Quando acontece uma tragédia como a que ocorreu no Rio de Janeiro, por exemplo, imediatamente todos os bancos de alimentos se movimentam para ajudar aquele Estado. Então o processo se expandiu e eu tenho certeza de que nos próximos cinco anos toda esta experiência adquirida vai ter uma rapidez ainda maior para sua difusão.

Projeto Hortifrutigranjeiros do Banco de Alimentos Imagem: acervo Banco de Alimentos
Projeto Hortifrutigranjeiros do Banco de Alimentos
Imagem: acervo Banco de Alimentos

Além da arrecadação e distribuição de alimentos, o Banco também atua em projetos de Segurança Alimentar e Nutricional. Como funcionam estas iniciativas?

A parte mais rica do Banco é esta. O Banco não teria uma base sólida se não tivesse a participação da Academia. Nós temos a felicidade de ter dentro do Banco uma estrutura de extensão das faculdades de Nutrição, Gastronomia e Engenharia Alimentar. São coordenadores de curso dando orientações, estagiárias defendendo suas teses, doutorandos escrevendo livros. E estas alunas vivem a prática dentro das instituições. Elas percebem que a pessoa tem a água, mas não tem o gás para ferver a água. Tem o peixe, mas não tem a refrigeração. Hoje, a entrega do alimento já é secundária, foi a abertura da janela para estabelecer a parceria com as instituições. Nossas nutricionistas percorrem as vilas orientando e implantando projetos como o “Nutrindo o Amanhã” e o “Cozinha nota 10”.

O “Cozinha nota 10”, por exemplo, não é uma certificação para quem tem uma cozinha com condições mínimas ideais. Não é isso que nós queremos. O que nós queremos é identificar aquela cozinha que não tem esta condição e apoiar de todas as formas: colocamos os azulejos na parede, o piso que está faltando, a pia, etc. Nós organizamos o processo e criamos estas cozinhas. Viabilizamos isto por intermédio de empresas parceiras e de outros bancos que criamos, como o Banco de Materiais de Construção e o Banco de Mobiliários. Agora mesmo já são 87 cozinhas que estão participando deste processo. E quando termina o processo fica a certeza de que ali estão acontecendo boas práticas. Mas não só de estrutura, como também de operação: elas estão usando as luvas, estão sabendo como devem acondicionar e higienizar os alimentos. O alimento é importante, mas as orientações sobre Segurança Alimentar também têm um peso muito grande.

Clique Alimentos. Imagem: www.cliquealimentos.com.br
Clique Alimentos.
Imagem: www.cliquealimentos.com.br

O Banco de Alimentos criou o website “Clique Alimentos”. Como funciona esta iniciativa e quais os resultados já alcançados?

O Clique Alimentos é um doador virtual. Nós criamos um website, onde você clica no pratinho que fica no centro da tela, aparece uma mensagem de agradecimento por você ter clicado e a informação de que através do seu clique determinada empresa doou um quilo de alimento ao Banco de Alimentos. É extremamente simples. Você clica e doa um quilo de alimento sem gastar nada. Na verdade, tem uma empresa por trás que faz a doação. Aparece o logotipo da empresa e um convite pra conhecer o website da empresa. A empresa tem um retorno de imagem e nós tivemos a doação de um quilo de alimento. Esta ação tornou-se uma coqueluche na internet e nós estamos fechando hoje mais de 1.267.000 cliques em pouco mais de um ano de Clique Alimentos. O site também está em inglês e espanhol, nós somos clicados em todo o mundo, mais de 120 países. Cada Banco do Estado tem as suas empresas parceiras que participam da campanha. Se uma empresa doa 100 quilos de alimentos, ela recebe 100 créditos, que correspondem a 100 cliques no seu logotipo. O internauta pode clicar a cada 15 minutos. Até agora 458 empresas já participaram do Clique com doações, mas ainda é muito pouco. Tenho certeza que daqui a três, quatro anos este número vai ser muito maior. Clique aqui e participe do Clique Alimentos.

De onde vem a maior parte das doações? Empresas privadas, pessoas físicas, campanhas em supermercados, espetáculos culturais?

Nós dividiríamos assim: o Clique Alimentos se mostrou um canal fantástico de arrecadação e a tendência natural é aumentar bastante, mas as doações maiores são de empresas. E eu ainda dividiria em empresas e supermercados, pois os supermercados se constituem em um segmento separado. Nós fazemos campanhas de arrecadação em supermercados, o Sábado Solidário, e os próprios supermercados também fazem doações bastante volumosas, mas nem todos. Felizmente, os grandes participam.

Também buscamos fórmulas eficientes de buscar doadores por intermédio de campanhas do quilo dentro de empresas e universidades: você faz um chamamento para que os funcionários e alunos tragam um quilo de alimento. Por exemplo, numa universidade de 30 mil alunos, se cada aluno trouxer um quilo, uma vez por mês, são 30 toneladas de alimentos por mês. Num jogo de futebol são 50 mil torcedores que podem trazer um quilo de alimento. Só no ano passado o Internacional nos doou mais de 100 toneladas. O Sebrae nos doou 16 toneladas de alimentos arrecadados na última edição da Feira do Empreendedor. Aqui na Fiergs nós temos um Centro de Exposições onde acontecem shows, feiras, exposições, e todos estes eventos também promovem doações de alimentos para o Banco.

Crianças de instituição beneficiada pelo Banco. Imagem: acervo Banco de Alimentos
Crianças de instituição beneficiada pelo Banco.
Imagem: acervo Banco de Alimentos

Há mais de 10 anos, a Dana promove os Concertos Dana, onde o valor do ingresso de grande parte dos espetáculos é um quilo de alimento não-perecível, sempre doado ao Banco de Alimentos. Como o senhor vê esta iniciativa?

A Dana é uma das empresas que já tem esta sensibilidade dentro do seu processo de administração. A Dana foi uma das pioneiras no apoio ao desenvolvimento do Banco de Alimentos sob todos os aspectos. Com os eventos culturais, com a participação de seus executivos – Paulo Born, Tito Lívio Goron, Bressiani e tantos outros – e com a prática de aproveitamento de excedentes de alimentos. Quando nós criamos o Banco e foi identificada a possibilidade de aproveitamento de excedentes de alimentos das cubas das cozinhas dos refeitórios, a Dana ficou entre as cinco empresas que imediatamente assumiu e se tornou benchmarking para o Brasil inteiro. Alimento excedente é aquele produzido a mais, mas que não foi consumido e que está em perfeitas condições de consumo, mas que a grande maioria das empresas coloca fora. A Dana acondicionava em “hot box” (caixas hermeticamente fechadas que mantém o alimento nas mais perfeitas condições de consumo) e levava para duas creches. Aquele modelo adotado pela Dana se propagou e outras empresas do mesmo porte passaram a fazer também. Uma empresa com o prestígio da Dana fazendo isso é um grande exemplo. Além da Dana praticar, ela ainda estimula outras empresas a participar também. A Dana participou de um processo, que tenho certeza, ela pode se orgulhar muito.

Como o senhor avalia a participação da comunidade nesta luta contra a fome?

A sociedade está sempre disponível. Em todos os tempos, mesmo quando não existia o Banco de Alimentos, a sociedade executava esta tarefa, realizava estas doações, se movimentava. Eu diria que o Banco é apenas a forma organizada, pois a sociedade, sempre que é chamada, comparece, participa, tem dado demonstrações incríveis. Basta ver o que acontece nestas tragédias, onde imediatamente a sociedade se disponibiliza. A sociedade tem um coração pronto para ajudar. O que a sociedade não dispõe, às vezes, é a forma bem estruturada. E é isso que o Banco procura atender. Hoje, as pessoas sabem que podem contar com o Banco de Alimentos, com uma estrutura de logística e de Segurança Alimentar. Esta estrutura do Banco nos permite oferecer ajuda com muita dignidade.

Voluntários participando do Sábado Solidário. Imagem: acervo Banco de Alimentos
Voluntários participando do Sábado Solidário.
Imagem: acervo Banco de Alimentos

De que maneira cidadãos comuns, como nossos colegas, amigos e vizinhos poderiam ajudar? Qual o recado para quem está nos lendo agora?

Hoje, existe a oportunidade das pessoas compartilharem. Às vezes as pessoas têm dificuldade, pois não têm conhecimento de como participar. Mas todos podem colaborar com uma iniciativa chamada Sábado Solidário. Todos os primeiros sábados de cada mês, em todo o Estado, pessoas da sociedade (Rotary, Lions, Parceiros Voluntários, etc.) colocam um colete do Banco e ficam nos supermercados arrecadando alimentos. Aquele que não se predispõe a fazer este trabalho voluntário de arrecadação, também pode ajudar indo ao supermercado e doando o quilo de alimento. O Banco oportuniza. Dificilmente alguém que queira participar, que queira doar, que queira exercer o voluntariado e a sua solidariedade, poderá dizer que não dispõe de oportunidade.

Quais os planos para o futuro? O que esperar para os próximos 10 anos?

O ideal seria que o Banco terminasse, pois se acontecesse isso certamente seria em função de não existir mais a fome. Mas, lamentavelmente, diante de tudo que nós conhecemos e vemos acontecer, diante da diminuição das áreas plantadas, o custo dos alimentos vai se tornar maior. A expectativa na área alimentar no mundo é muito negativa. Os bancos de alimentos terão uma importância muito grande. Foi isso que nós fomos discutir nos Estados Unidos. O mundo está se preparando para apoiar, principalmente, aqueles países mais pobres. Então o nosso Banco de Alimentos tem muito a fazer e vai buscar se organizar cada vez melhor e ampliar a sua Rede para que assim possa se fortalecer.

E o senhor, como se sente fazendo parte de tudo isso?

Todas as pessoas que participam do Banco de Alimentos reconhecem que é uma oportunidade se tornar um instrumento da sociedade, de Deus, para poder contribuir. Pessoas que participam como voluntários são pessoas que estão prontas para servir. Elas participam destas ações para fazer alguma coisa para alguém, por alguém.

Participe desta causa

Você, seus amigos e a empresa onde você trabalha podem colaborar de diversas formas. Entre em contato com o Banco de Alimentos e faça a sua parte para acabar com a fome no mundo.

Website Clique Alimentos: www.cliquealimentos.com.br
Website Banco de Alimentos: www.bancodealimentosrs.org.br
E-mail: bancodealimentos@bancodealimentos.org.br
DDG: 0800 5416 000
Telefone: 51 3026.8020