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Paulo acredita no jornalismo - e na fotografia - compromissado, respeitoso, sincero e otimista. Imagem: Paulo Fehlauer

“Uma válvula de escape, ou uma daquelas chaleiras com apito, saca? Quando a pressão sobe, a chaleira apita e incomoda (…) Este blog é a transcrição daquela voz interna que diz porque estou aqui e o que me faz seguir em frente”.

Esse é Paulo Fehlauer, fotógrafo e repórter nascido em 1982, na pequena cidade de Marechal Cândido Rondon, interior do Paraná. Paulo já morou em várias cidades (na ordem: Palotina, Boa Vista da Aparecida, Curitiba (todas no Paraná), Campinas e São Paulo, Nova York e hoje mora na Capital paulista. ”Acredito que posso e tenho algo a dizer”. Por isso, inquieto, criou o blog Narua.org, onde publica suas experiências com fotojornalismo e webjornalismo e também o coletivo Garapa.

Como surgiu sua vontade de fotografar? Era uma coisa de sonho de criança ou foi da série “algo que descobri enquanto cursava jornalismo”?

Essa história não tem muito glamour não. Foi durante a faculdade mesmo, mais um jeito que encontrei de me expressar. Sempre tive uma percepção muito visual, uma ligação muito forte com a imagem. Certo dia, resolvi comprar uma câmera reflex toda mecânica e comecei a clicar. Aí fui aprendendo, estudando, descobrindo, e principalmente clicando.

Conte um pouco da sua experiência profissional, você morou em vários lugares… Quais as experiências profissionais mais marcantes da sua carreira?

Eu nasci no interior do Paraná, depois passei um ano em Curitiba, dois em Campinas e então vim para São Paulo. Depois de três anos aqui, resolvi fugir pra Nova York e tentar alguma coisa lá, viver a vida, sei lá. NY foi a experiência mais marcante até agora, eu acho, um divisor de águas mesmo. Entrei em contato com muita gente, trabalhei como assistente, dei aulas… foi ótimo. O melhor dessa experiência nem foi a parte objetiva, ligada à fotografia, mas a parte pessoal mesmo, as descobertas, viver em uma cultura diferente (ainda mais em um lugar como Nova York).

A chuva em São Paulo, pelo olhar de Fehlauer. Imagem: Paulo Fehlauer
A chuva em São Paulo, pelo olhar de Fehlauer.
Imagem: Paulo Fehlauer

E seu interesse pelo jornalismo multimídia, como iniciou? Em que momento você decidiu arregaçar as mangas e fazer algo que unisse foto, vídeo, texto e, principalmente, contação de histórias?

Acho que esse interesse veio de uma sensação de incapacidade de contar uma história em um formato apenas. Cada formato tem as suas especificidades, e eu sempre sentia que os formatos isolados deixavam a desejar. Isso é muito mais uma percepção em relação ao meu trabalho do que a produção alheia. No fundo, invejo quem consegue se dedicar a uma ”arte” e ser pleno nela. Meu pensamento é muito disperso, então procuro algo que reflita essa dispersão.

O que fascina você no jornalismo multimídia? Você cita ”A alma encantadora das ruas” no seu blog… Você acha que, com som, imagem e texto as histórias são melhor contadas?

Como falei antes, acho que é essa possibilidade de contar a história de formas diferentes, de aproveitar as especificidades e vantagens de cada formato. Não digo que as histórias são melhor contadas, isso depende muito da história e do contador. Ainda acho que não há melhor ”ferramenta” que o texto escrito. Mas comparar o tal jornalismo multimídia à boa literatura ainda não é algo que se deva fazer.

Quem são as suas principais referências – como repórter e como fotojornalista? 

Eu sou avesso à citação de nomes, acho estranho, principalmente porque eles variam muito. Meu gosto varia muito. Mas se é pra citar, fico com Guimarães Rosa, Machado de Assis, João do Rio, Cartier Bresson, só clássicos…

Você morou em várias cidades do interior. Acha que isso te ajudou a ”aprofundar” teu olhar para as cidades gigantescas em que trabalhou e trabalha, como NY e São Paulo?

Eu costumo dizer que, quando volto ao interior, aprendo a relativizar as minhas questões, necessidades, ansiedades. O ritmo mais lento faz você pensar melhor no que realmente importa (seja lá o que for). Mas depois de alguns dias já começo a sentir coceira e resolvo voltar para o caos.

Cruzando os Andes, entre a Argentina e o Chile.. Imagem: Paulo Fehlauer
Cruzando os Andes, entre a Argentina e o Chile..
Imagem: Paulo Fehlauer

Depois de morar em Nova York, você voltou para o Brasil porque acreditava que as histórias que queria contar estão aqui. Que tipo de histórias são essas? Como está sendo tua busca?

Essa busca varia tanto quanto cortes de cabelo. Voltei para o Brasil desejando conhecer o país. Cheguei e me mandei para Rondônia. Depois comecei a trabalhar na Folha de S. Paulo e passei a conhecer muito a cidade de São Paulo, o que foi ótimo. Hoje acho que a busca é muito mais pessoal do que geográfica. Quero conhecer pessoas e, a partir delas, conhecer também a mim.

Alguns jornais brasileiros, como a Zero Hora aqui do Sul, estão abrindo as possibilidades para o jornalismo multimídia. Como você sente isso? Acha que há abertura para este tipo de jornalismo, seguindo os passos dos grandes jornais americanos, que fazem isso com maestria em seus sites?

A abertura, nos grandes veículos, ainda é pequena, porque ninguém aprendeu a ganhar dinheiro com a internet. Os americanos e europeus experimentam mais porque apostam, arriscam mais. Nesse ponto, o Brasil é a terra do comodismo. As empresas estão mais interessadas no saldo bancário do que no conteúdo que produzem. E é aí que está a grande vantagem da internet: o seu ”sucesso” depende muito menos da sua conta bancária do que da sua própria criatividade e disposição. Todas as portas fechadas que encontramos serviram para que percebêssemos a grande vantagem que temos em nos auto-denominar ”independentes”. Como diz a célebre frase, é um caminho que se faz ao andar. De qualquer forma, fico feliz que alguma abertura comece a aparecer. Essa assimilação pelos grandes é importante porque cria respaldo, além de sinalizar com algum nível de experimentação, o que é sempre bom.

Como começou o Coletivo Garapa? Desde quando ele existe, e que tipo de feedback você e seus parceiros na empreitada têm recebido?

Nós “começamos” no final de 2007. Eu havia voltado de NY, o Rodrigo de Londres e o Leo estava aqui trabalhando para a Folha. Leo e Rodrigo são amigos desde a adolescência. Eu e o Leo nos conhecemos pela internet pouco antes de eu ir para NY, e só retomamos contato nesse momento. Papo vai, papo vem, começamos a produzir meio na marra, no nosso tempo livre. Com o tempo, fomos deixando de lado os trabalhos pessoais e a Garapa foi virando Plano A. Acho que isso já demonstra que a resposta tem sido positiva, né? Hoje vivemos exclusivamente da Garapa, e cada vez com mais liberdade. Mas, como falei antes, tudo isso passou por diversas portas fechadas (que continuam fechadas!). Nesse percurso, fomos descobrindo (e abrindo) outras portas, e o resultado tem sido bastante feliz.

Veja mais: Site do Coletivo GarapaFlickr de Paulo Fehlauer