Moacir Knorr Gutterres, o Moa, nasceu em Porto Alegre, em 1962, e é formado em Jornalismo pela PUCRS. Começou a desenhar profissionalmente em 1986 e já publicou seus desenhos em jornais sindicais e de empresas, campanhas políticas, materiais publicitários, publicações culturais e jornais diários (Diário do Sul, Jornal do Comércio e Zero Hora).
Na mídia eletrônica, colaborou com a autoria de três vinhetas animadas, uma para a campanha publicitária da Feira do Livro e duas para o “Plim-Plim” da Rede Globo. Como cartunista, ganhou prêmios no Salão Internacional de Desenho para Imprensa de Porto Alegre, Salão de Humor de Piracicaba, Salão de Humor do Rio de Janeiro, Salão de Humor de Foz do Iguaçu, The Yomiuri International Cartoon Contest, entre outros.
Em 2004, se lançou como autor de literatura infantil com o livro “Planetinhas”, editado pela RBS Publicações. Além de trabalhar como ilustrador de livros didáticos, revistas e materiais institucionais, integrou também a equipe de criação do longa-metragem de animação “As Aventuras do Avião Vermelho”, com roteiro baseado no livro homônimo de Erico Verissimo.
Moa desenhou e roteirizou a coleção de cartilhas da Dana ”Quer saber?”, que traduzem em uma linguagem simples e bem-humorada temas importantes do dia-a-dia de uma empresa, como Sistema de Gestão Ambiental, 5 Ss, Metrologia, Ética, entre outros.
Como era o Moa criança? Gostava bastante de histórias em quadrinhos? Quais eram as favoritas? Como os quadrinhos entraram em sua vida?
Eu gostava das aulas de artes, de desenhar, e adorava gibis. Lembro que meu irmão comprava os do Pato Donald, os Almanaques Disney… lembro em especial de uma edição que começava com o ”Manual do Escoteiro Mirim”. Eu também me impressionava muito com as ilustrações do almanaque Readers Digest. Eu adorava elas, que sempre vinham acompanhadas de longos relatos, e também havia belas ilustrações naqueles resumos de livros – me lembro especialmente de um do Moby Dick, que era maravilhoso. As histórias em quadrinhos do Pato Donald eram as favoritas, e eu também gostava do Gastão e do Huguinho, Zezinho e Luizinho; além, é claro, do Professor Pardal. Quando criança, eu vivia desenhando, rabiscando, mas não levava isso a sério. Eu gostava “desde sempre” de cartuns, mas nunca fui um grande fã de super-heróis. Aprendi a amar a ironia e o sarcasmo, indispensáveis a um cartunista, com a revista Mad.
Como você se iniciou na carreira de desenhista/cartunista?
Eu estava na faculdade, cursando jornalismo, e fazíamos um jornal na faculdade (eu estudava na PUC), que se chamava ”Experiência”. Como eu gostava bastante de desenhar, me ofereci para fazer ilustração neste jornal – mas ainda não pensava que esta seria a minha profissão. Em seguida, já fiz uma capa, ilustrando uma matéria sobre algo ligado à legislação. Fiz essa capa e comecei a achar que o dom de desenho poderia servir pra alguma coisa na minha vida (risos). Sempre gostei de fotografia, diagramação, dessas coisas ligadas à imagem. Eu também gostava da redação, por causa de um professor de quem sou amigo até hoje, uma referência e sei que, muita coisa que uso nos meus roteiros, vem da influência desse professor.
Você é jornalista formado pela PUC/RS. No que esta formação ajudou na sua carreira como cartunista?
Acho que o fato de eu ser jornalista me ajudou na carreira de cartunista pelo direcionamento do meu desenho. Na verdade, o primeiro vestibular que fiz foi pra Publicidade e Propaganda e, no segundo ano, passei pro Jornalismo, que me inspirou muito mais, me deu uma nova visão de mundo. Uma visão jornalística, reforçando a minha consciência, a minha crítica, a ironia, o oposto da publicidade. O jornalismo, por princípio, tinha uma outra missão. E trazia também o lado da irreverência, às vezes presente no jornalismo, essencial para um cartunista. O jornalismo mostra uma verdade, e fez a minha cabeça nesse sentido.
Como estava o mercado para desenhistas no Brasil quando você começou? E como está agora?
Foi bom você falar no Brasil porque o fator forte, principal, da minha situação hoje no mercado é ocasionado pela internet. Sem a internet, eu teria que me mudar daqui, ou estaria mal de trabalho. O mercado aqui no Rio Grande do Sul é muito estreito, imagino que uns 90% da minha produção seja feita para fora de Porto Alegre. E a maior parte da divulgação começou agora, que inaugurei meu site. Com ele, cheguei a clientes que eu não poderia atender antes. Essa é a principal diferença da época em que comecei a desenhar pra agora. Além do fato de eu olhar pra trás e eu me horrorizar com o amadorismo dos meus próprios desenhos, meu começo é meio doloroso (risos). Mesmo assim, certas pessoas pra quem eu trabalhei no início levaram a sério meu trabalho, principalmente o pessoal dos Sindicatos. Meu primeiro trabalho foi para o Sindicato dos Profissionais em Processamento de Dados, onde fazia diagramação, fotografia e ilustração de um informativo. Meio que por exclusão, fui pendendo pro lado da ilustração (risos). Na época, me sentia à vontade com o que estava fazendo. Por volta de 86, reza a lenda urbana, no dia da formatura, decidi que ia trabalhar como ilustrador e cartunista.
Qual a importância das outras artes para a sua profissão? O cinema e a música te influenciam?
Sim, e muito! Eu curto estas outras artes como espectador, mas também sempre estou aprendendo algo com elas e também sendo influenciado. Ainda mais porque, no caso do cinema, eu gosto de ver várias vezes um mesmo filme, quando gosto dele, justamente para descobrir o que me fez gostar tanto daquela obra em particular. O Blade Runner, por exemplo, acho que vi 12 vezes! O filme é uma obra-prima do cinema, parece todo coreografado, o diretor teve uma grande noção de tempo e de roteiro. Eu sou perfeccionista e detalhista e admiro pessoas que trabalham assim também.
Sobre a influência da música, ela também é bastante grande, até porque meu estúdio é repleto de instrumentos musicais, e eu gosto muito de trabalhar escutando música. Eu não tenho um estilo favorito de música pra escutar trabalhando, tenho fases – atualmente, ando escutando rock inglês, sambas e boleros – mas meu iPod tem de tudo, desde coisas mais alternativas até as mais modernas.
Que desenhistas, cartunistas e ilustradores você admira e que foram fundamentais na sua formação?
Gosto muito do trabalho de três cartunistas gaúchos, que me influenciam de formas diferentes. O primeiro é o Santiago, cuja obra é muito simples, os desenhos dele carregam uma grande simplicidade, justamente por ele ser um cartunista tão bom quando simplifica as coisas. Ele se garante naquele desenho simples, que na verdade, é o ‘falso simples’, porque é muito difícil de se fazer. Outro cara de quem gosto é o Edgar Vasques, que prima pelo texto exato, pela perfeição textual. Além disso, é um grande desenhista. O terceiro é o Kayser, que tem uma grande capacidade de contar histórias engraçadíssimas de uma forma até meio intuitiva. Também cito como grandes influências o trabalho de dois gênios: Laerte e Angeli. Os dois têm o que eu chamo de ‘genialidade no último grau’. Quando vejo alguns desenhos de charges, penso ”por que eu não tive essa ideia?”. No caso do Laerte e do Angeli, eu penso: ”eu NUNCA teria essa ideia!” (risos). Além disso, tem o trabalho do Rodrigo Rosa, que também é gaúcho, do Louzada. Além, é claro, do francês Sempé, grande influência pra mim, até hoje.
Em 2004, você lançou um livro voltado para o público infantil, chamado ”Planetinhas”. Na sua opinão, qual é o segredo de um bom roteiro pra histórias infantis?
Qual o segredo, eu não sei. Mas, no caso do ”Planetinhas”, fiz um laboratório em casa com os meus filhos Rodrigo (7 anos) e Eduardo (10). Eu lia para eles a minha história, e também peguei influências de livros de outros autores que eu lia para eles, na hora de dormir. Hoje, os dois adoram ler.
Como é o seu processo de criação, da ideia até a arte-final?
É sofrido (risos). O primeiro momento é o do pânico. Antes de tudo, faço uma conta rápida do número de ilustrações que preciso criar, leiautar e finalizar até o prazo final para entregar o serviço, calculo qual deve ser a minha performance para cumprir o combinado, respiro fundo e dou por iniciado o trabalho. O tamanho do sofrimento é medido pelo tamanho do trabalho – quanto maior, mais sofrido. Depois de encontrar um ponto de equilíbrio interno, perco o medo e consigo ‘colocar a mão na massa’. Posso dizer que trabalho da mesma forma que um carrinho de brinquedo, daqueles de fricção. Primeiramente, fico naquela angústia do início da ideia, do processo, produzindo uma adrenalina para seguir em frente. Aí, começo a ler textos sobre o assunto, produzir rascunhos, para tentar descobrir o foco do meu trabalho. A partir daí, vou pensando no trabalho e rabiscando as primeiras ideias, que sempre são jogadas no lixo (risos). Quando consigo encontrar o fio da meada, me entusiasmo e, a partir daí, as coisas fluem com naturalidade. Procuro sempre tornar o texto mais simples porque, acho que quanto mais simples ele for, melhor. Busco a exatidão.