Marcelo Delacroix é um cantor e compositor gaúcho que também atua como arranjador, produtor e educador musical. Pode-se dizer que ele respira música.
Marcelo iniciou sua formação na Escola de Música da OSPA (Orquestra Sinfônica de Porto Alegre), cursou o bacharelado em Música na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde cursou também Licenciatura em Música. Com dois discos gravados, ”Marcelo Delacroix” (2000), Prêmio Açorianos de Música, melhor disco de MPB, e ”Depois do Raio” (2006), que também ganhou o prêmio de melhor disco na categoria MPB e, desta vez, venceu como disco do ano, entre todas as categorias do Prêmio Açorianos. Além dos seus discos solo, ele participou de diversos outros, entre os quais com o grupo Quebra cabeça, Cuidado que Mancha, com Adriana Marques e com o Bando Barato pra Cachorro e com Arthur de Faria e Seu Conjunto.
O violonista e cantor ainda se dedica à produção musical para o teatro e a dança, trabalho reconhecido por diversos prêmios e indicações. Delacroix realizou trilhas para espetáculos e direção musical de espetáculos teatrais, além de trabalhar com criação musical na área da publicidade, compondo jingles e trilhas para comerciais de rádio, TV e documentários.
Como e quando a música entrou na sua vida?
Nós somos em cinco irmãos, e eu sou o irmão do meio. Cresci com todo mundo cantarolando muito em casa, era algo muito natural. Eu, como professor, percebo que a maior barreira para as pessoas é a vergonha de cantar, e acho que essa criação me influenciou bastante positivamente nesse sentido. Conta-se na minha família que, quando eu tinha cinco anos, pedi para o meu pai um “violhão” (risos). O meu irmão, José Luis, foi quem acabou ganhando o violão quando já éramos mais velhos, e eu via aquele violão pegando pó em cima do armário… Resolvi pegá-lo e um vizinho de rua me ensinou dois ou três acordes. Peguei um daqueles livros de método, que não explicava coisa alguma, mas tinha as grades com os acordes. Passei três meses enlouquecendo a minha família porque tocava sempre o mesmo dedilhado (risos)! Quando eu tinha 12 anos, percebi que não tinha mais vontade de brincar na rua com meus amigos, chegava do colégio e ficava só tocando violão. Depois, passei a ser aquele cara que leva o violão pra rua. Minha irmã, Virgínia, me incentivava cantando junto comigo, escolhendo músicas que ela achava legais para que eu tirasse. Um guri da minha rua que já tocava melhor me ensinou a tocar “Vento Negro”, dos Almôndegas, que eu queria muito aprender.
E quando você percebeu que era isso que queria fazer da vida?
Foi nessa época. Meu pai sempre foi um grande incentivador, veio me perguntar se eu queria mesmo ser músico, me avisou que era dureza, mas sempre me incentivou. Entrei para a Escola de Música da OSPA com 14 anos. A aula era no Araújo Vianna e no primeiro dia o professor começou a colocar as notas na pauta do quadro negro e perguntar para os alunos “que nota é essa?”. Aí me apavorei, eu não sabia responder! Anotei todas as notas no meu caderno e fui para casa. Voltei só no ano seguinte, com as notas decoradas e fui adiante. Foi aí que conheci o Arthur de Faria, meu amigo até hoje: estudando teoria musical.
Quando chegou a época do vestibular, eu não tinha um violão para fazer o teste – até tinha, mas o meu era meio “rastaqüera” (capenga). Um amigo meu estava vendendo o dele pela metade do preço que custava na loja, com estojo e tudo – lembro até hoje, ele estava vendendo por 60 mil cruzeiros. Nossa família numa dureza e falei pro meu pai que precisava do violão para o vestibular. Ele era autônomo, pensou, pensou… E me deu a grana. Passei de primeira no vestibular da UFRGS.
Como foi o período da graduação?
Foi um período bom, mas tive vários dilemas. Eu não queria tocar violão clássico, queria tocar MPB, bossa nova. Eu fiquei no curso de 1985 até 1990, fiz praticamente todo ele, mas me perguntando “por que eu estou fazendo essa faculdade?”. Comecei a trabalhar no Banrisul, mas só durei um ano lá (risos). Tentei fazer jornalismo na PUC, mas não consegui pagar. Comecei, então, a tocar baixo no “Bando Barato pra Cachorro”, fazer shows na noite, o que te dá uma cancha bem bacana, aprende-se muita coisa – e te faz perceber que é difícil, mas pode-se viver com música. Comecei também, em 1993, a tocar baixo num grupo instrumental, o “Quebra Cabeça”, e isso me fez aprender bastante sobre ritmo, já que o baixista é o responsável por isso na música. O Bando Barato pra Cachorro ganhou o Prêmio Açorianos daquele ano. Voltei para a UFRGS para concluir meu Bacharelado em Música, meus colegas já tinham se formado, mas faltava muito pouco.
Quando ocorreu teu reencontro com a voz e violão, com o teu estilo?
Foi em 1995, quando já tinha composições suficientes para montar meu primeiro show solo, no Teatro Renascença. A experiência de fazer um show tocando músicas minhas foi muito forte, eu já tinha esse repertório acumulado e também participado de muitos projetos legais, o Bando Barato pra Cachorro, que tocava músicas da década de 30 e 40 de MPB, o grupo Quebra Cabeça… Eu lembro de um momento especial, quando eu estava trabalhando na trilha da peça “Homem Branco e Pele Vermelha”, gravando com o Marcelo Figueiredo de madrugada. Na gravação de uma das músicas, “Canto da Purificação”, percebi que, no auge da pressa e do cansaço, eu descobri que podia cantar diferente também, com ‘pegada’, sem aquela suavidade toda que eu trazia comigo. Foi um momento importante. Como foi importante ter cantado no Coral 25 de Julho, e também no Conjunto de Câmara de Porto Alegre, tendo aulas de técnica vocal com a Marlene Goidanich, voltada para o repertório de música antiga (Medieval e Renascentista).
E o primeiro disco, como nasceu?
O primeiro disco, “Marcelo Delacroix”, independente, nasceu de um projeto pro Fumproarte, que foi aprovado de primeira. O disco ganhou o Prêmio Açorianos de Melhor Disco de MPB de 2000, uma coisa absolutamente inesperada pra mim. Eu me considerava vencedor só por concorrer com o Vitor Ramil e o Bebeto Alves, realmente não esperava. Subi ao palco para receber o prêmio falando isso, meio sem saber o que falar. Quando desci do palco, o Ernesto Fagundes me esperava e disse: “Que história é essa de se desculpar porque ganhou o prêmio? Não é assim não, se ganhou foi porque mereceu!” (risos).
O Marcelo é compositor, cantor, professor, compõe jingles… Qual o ponto de intersecção entre todos estes seus “Marcelos”?
Desnecessário dizer que o que une todos estes “Marcelos” é a música, mas houve um tempo em que eu acreditava que estes diferentes papéis não influenciavam um ao outro. Mas hoje vejo que eles têm tudo a ver, e que um influencia muito o outro. Enquanto estou dando aula, estou exercitando o meu papel diante de um público, exatamente como faço num show. É preciso motivar, entreter, e os dois públicos são muito exigentes – especialmente as crianças e adolescentes (risos). Hoje, com esta intersecção entre o Marcelo compositor e cantor e o Marcelo professor de música, vejo que me transformei em uma pessoa muito mais comunicativa. E, ao mesmo tempo, vejo que o fato de eu ser artista muda a postura dos alunos em relação a mim – eles percebem que posso transmitir a eles não apenas a teoria musical, como também a parte prática da profissão.
Você compõe muito em parceria com outros artistas. Como funciona este processo?
Eu confesso: não me sinto à vontade o suficiente para compor letras. Acho que me exponho demais quando escrevo poemas, textos, e por isso acabo usando pequenos fragmentos do que escrevo para minhas músicas. Então, encontro parceiros para que eles possam me ajudar nessa questão da letra. Outra coisa que faço muito é musicar poesias de escritores que admiro, como Fernando Pessoa. Nestes casos, é difícil ter uma letra ruim (risos).
No seu segundo disco, isso aconteceu bastante, certo?
O meu segundo disco, também independente, “Depois do Raio”, foi lançado em 2006 e traz novas composições minhas em parceria com Gustavo Finkler, Arthur de Faria, Arnaldo Antunes, Nelson Coelho de Castro, Sérgio Napp e Ronald Augusto, além de um poema musicado de Ricardo Reis e a regravação de Cantiga de Eira, de Barbosa Lessa. O disco foi premiado com os Prêmios Açorianos de Melhor Disco de MPB e Melhor Disco do Ano.
Como está sua expectativa para os Concertos Dana?
Será a primeira vez que toco junto com uma orquestra. Mesmo sendo oriundo do Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, tive bastante da minha formação – a maior parte, eu diria – da rua, durante um período de 17 anos, mais ou menos. Na universidade, escutei e me familiarizei muito com música orquestrada e estou muito feliz por ver meu trabalho chegar neste nível. Eu acredito que, dos trabalhos que temos em cena aqui em Porto Alegre, o meu combina bastante com os arranjos de uma orquestra, ele tem muito a ver com essa sonoridade. E, pela primeira vez também, fiz um arranjo de uma música minha para a orquestra.
Como foi isso? Qual das tuas músicas foi arranjada por ti para o Concertos Dana?
Foi “Amigo do Rei”. Eu nunca havia me aventurado a escrever para uma orquestra, dentro das formas de uma partitura para orquestra. No disco, eu já tinha gostado do arranjo de sopros e cordas dessa música, então pensei: “até que eu poderia usar esses arranjos…” (risos). Falei com o maestro e ele topou. A partir daí, tive que reduzir o arranjo para que ele ficasse apenas de cordas e montar o quebra-cabeças. Depois disso, tive que separar o arranjo para cada instrumento da orquestra. Talvez se eu não tivesse aquela ideia inicial, teria sido mais fácil, gosto de manter aberta esta janela da criação, da criatividade. No final, gostei bastante da experiência e do resultado – tomara que as pessoas curtam também.
Você compõe muito em parceria com outros artistas. Como funciona este processo?
Eu confesso: não me sinto à vontade o suficiente para compor letras. Acho que me exponho demais quando escrevo poemas, textos, e por isso acabo usando pequenos fragmentos do que escrevo para minhas músicas. Então, encontro parceiros para que eles possam me ajudar nessa questão da letra. Outra coisa que faço muito é musicar poesias de escritores que admiro, como Fernando Pessoa. Nestes casos, é difícil ter uma letra ruim (risos).
No seu segundo disco, isso aconteceu bastante, certo?
O meu segundo disco, também independente, “Depois do Raio”, foi lançado em 2006 e traz novas composições minhas em parceria com Gustavo Finkler, Arthur de Faria, Arnaldo Antunes, Nelson Coelho de Castro, Sérgio Napp e Ronald Augusto, além de um poema musicado de Ricardo Reis e a regravação de Cantiga de Eira, de Barbosa Lessa. O disco foi premiado com os Prêmios Açorianos de Melhor Disco de MPB e Melhor Disco do Ano.
Como está sua expectativa para os Concertos Dana?
Será a primeira vez que toco junto com uma orquestra. Mesmo sendo oriundo do Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, tive bastante da minha formação – a maior parte, eu diria – da rua, durante um período de 17 anos, mais ou menos. Na universidade, escutei e me familiarizei muito com música orquestrada e estou muito feliz por ver meu trabalho chegar neste nível. Eu acredito que, dos trabalhos que temos em cena aqui em Porto Alegre, o meu combina bastante com os arranjos de uma orquestra, ele tem muito a ver com essa sonoridade. E, pela primeira vez também, fiz um arranjo de uma música minha para a orquestra.
Como foi isso? Qual das tuas músicas foi arranjada por ti para o Concertos Dana?
Foi “Amigo do Rei”. Eu nunca havia me aventurado a escrever para uma orquestra, dentro das formas de uma partitura para orquestra. No disco, eu já tinha gostado do arranjo de sopros e cordas dessa música, então pensei: “até que eu poderia usar esses arranjos…” (risos). Falei com o maestro e ele topou. A partir daí, tive que reduzir o arranjo para que ele ficasse apenas de cordas e montar o quebra-cabeças. Depois disso, tive que separar o arranjo para cada instrumento da orquestra. Talvez se eu não tivesse aquela ideia inicial, teria sido mais fácil, gosto de manter aberta esta janela da criação, da criatividade. No final, gostei bastante da experiência e do resultado – tomara que as pessoas curtam também.
Como nasceu seu mais recente projeto, o “Canciones Cruzadas”?
Eu fui tocar em Montevidéu e conheci o cancionista Dany López, que atua como pianista. Em 2009, no espetáculo “POA-Montevieo – Sin Fronteras”, apresentei-me com o Vitor Ramil e com os uruguaios Ana Prada e Daniel Drexler (com participação de Dany López no acordeon). Na ocasião, viramos amigos e começamos a pensar em fazer algo juntos – nascia o “Canciones Cruzadas”. A ideia era que eu fizesse arranjos para as músicas dele e, ele, para as minhas. Queríamos ver como as minhas músicas soavam em espanhol e, as dele, em português. Quando ele me enviou por email a primeira versão que ele fez, vi que a música tinha ficado absolutamente diferente – o Dany tem uma forte veia pop, misturada com música folclórica. Fiquei “na obrigação” de mandar algo para ele também e isso me levou a investir num estúdio caseiro. Assim, começamos a produzir as músicas um do outro e as coisas começaram a andar. A riqueza desta troca foi tão grande que o projeto fluiu naturalmente. Depois disso, daqui, eu fiz ensaios das músicas dele, e ele ensaiou as minhas por lá, já com os shows agendados em Montevidéu e Maldonado. Quando chegamos lá, tivemos três dias para ensaiar juntos, integrarmos os arranjos. No palco, nos acompanharam os músicos uruguaios Gerardo Alonso (contrabaixo), Tato Bolognini (bateria), Eduardo Mauris (Guitarra elétrica) e os brasileiros Marcelo Corsetti (guitarras) e Giovani Berti (percussão). Foram dois shows lindos, sucesso absoluto – e queremos transformar esse projeto num disco.
E quais teus novos projetos?
Tem esse disco do “Canciones Cruzadas” que queremos muito fazer, estou pensando também em gravar outro disco, mas sem muita pressa… Tem um projeto muito legal que gravei com os alunos do Santa Inês, onde dei aula de música, em que musiquei poemas do Sérgio Caparelli – o disco chama “Poemas Musicados”, e as crianças cantam as músicas comigo.
Outro trabalho que quero fazer é um show reunindo as composições que o Carlinhos Hartlieb deixou gravadas em fitas de rolo, descobertas depois da sua morte. Eu participei bastante da produção do documentário “Um risco no céu”, sobre a carreira dele, vencedor do prêmio “Histórias Curtas” de 2008, da RBS. Mergulhei fundo na obra dele, desde os tempos do Liverpool, até o lançamento do disco “Risco no céu”. Ele era genial, uma figura muito marcante na cena musical de Porto Alegre dos anos 60, 70 e 80. Eu, o diretor do documentário, Rene Goya Filho, a Viviane o Nicola Spolidoro (guitarrista, violonista, arranjador e professor de música) selecionamos 25 músicas destas que encontrei nas fitas, fizemos os arranjos e queremos montar um show que, com certeza, vai ser muito emocionante.
Quais são os discos que você está escutando no momento?
Redescobri um disco do Zé Ramalho de 1978, homônimo, que estou ouvindo bastante. Escuto também coisas novas, trabalhos de amigos que caem na minha mão. Atualmente, ouço os discos do Pablo Gringot, Fernando Cabrera, Leo Maslíab e Magno Mello.
E o que cita como influências do teu trabalho?
MPB em geral, especialmente do final dos anos 70 – gosto daquele “boom” do Nordeste, com Fagner, Belchior, Zé Ramalho, Alceu Valença. Gosto de músicas étnicas, folclóricas, descobri cedo a música latino-americana de Mercedes Sosa, Violeta Parra, gosto de tocar instrumentos diferentes. Das influências de adolescência, de pop, tem Beatles, Jethro Tull, Led Zeppelin, Janis Joplin, Jimi Hendrix. Parei no AC/DC, no Van Halen (risos).