“Não estou lá” é a cinebiografia perfeita para um artista como Bob Dylan: complexa, criativa, inteligente e muito bem roteirizada.
O diretor Todd Haynes soube escrever um roteiro em que a figura icônica de Bob Dylan, um dos músicos mais influentes de todos os tempos, fosse dividida em 6 personagens, todos interpretados por atores diferentes. Inclusive por uma mulher – Cate Blanchett interpretou o Dylan cínico e arredio do começo dos anos 60 com tal maestria que foi indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante do ano passado.
A narrativa é não-linear, exatamente como é o estilo de composição do próprio Dylan, famoso por suas letras de música pelas quais, inclusive, já ganhou o Prêmio Pulitzer.
Há cenas em preto e branco e cenas em cores, e centenas de referências que são facilmente captadas pelos fãs do cantor americano.
Marcus Carl Franklin, um jovem ator negro, interpreta o Bob Dylan de 11 anos, fã de Woody Guthrie que pega carona em trens de carga tocando violão. Christian Bale interpreta Jack Rollins, o jovem Dylan cantor de folk e músicas de protesto, engajado politicamente que, mais tarde, tornaria-se “Pastor John,” a versão de Dylan quando ele se converteu ao cristianismo, cantando canções gospel em uma pequena capela.
Uma impressionante Cate Blanchett interpreta Jude Quinn, a versão mais conhecida de Dylan, no auge da fama e da loucura dos anos 60, quando seus fãs folk o chamava de “vendido”. Esta parte do filme faz referência ao romance de Dylan com Edie Sedwick, uma superstar de Andy Warhol que foi símbolo daquela época e morreu muito jovem. O ator Ben Whishaw vive o jovem rebelde Dylan que se auto-denomina “Arthur Rimbaud”. Heath Ledger interpreta “Robbie Clark”, um ator de Hollywood, e ele também interpreta Dylan na época do seu divórcio de Sara Dylan, mãe de seus filhos e mulher da sua vida, interpretada no filme por Charlotte Gainsbourg. Por fim, Richard Gere interpreta o Dylan envelhecido, vivendo em uma cidade surreal.
Parece confuso, mas a estratégia funciona com perfeição. A fotografia é linda, a trilha sonora é imperdível.
Ou seja: da mesma forma que Dylan se aproveitou de muitos estilos musicais e se reinventou por toda a carreira, Todd Haynes fez a mesma coisa neste filme, usando todo seu conhecimento cinematográfico e suas próprias influências (Godard, Fellini, Lester).
O resultado é um complexo mosaico, mas também uma homenagem magistral à Bob Dylan que mistura drama, documentário e musical. Enigmático, mágico, ardiloso – como o próprio Dylan.
Veja mais: Site Oficial de Não estou lá – Site do filme no Internet Movie Database