O Estado de S. Paulo
A reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que começou ontem e termina hoje, não deve trazer surpresas. É unânime entre os analistas do mercado financeiro, segundo pesquisa feita pelo Estadão/Broadcast, a projeção de que a taxa de juros será mantida nos atuais 10,5%. No entanto, com as incertezas que cercam a economia, cresce na avaliação de economistas – embora ainda não seja o cenário-base – a possibilidade de a taxa de juros voltar a subir ainda neste ano.
O debate sobre a necessidade de um eventual aumento dos juros surgiu no início de junho, depois de o dólar disparar ao patamar de R$ 5,70 nas negociações diárias. Agora, a moeda opera acima de R$ 5,60, mais de 6% sobre os R$ 5,30 fixados como referência nos cenários do Copom. Ao mesmo tempo, as expectativas de inflação continuam subindo.
A combinação dessas variáveis deve levar a uma elevação das projeções de inflação do BC, e o aumento dessa estimativa poderia sugerir que apenas manter a Selic seria insuficiente para fazer o índice convergir ao centro da meta, de 3%.
‘Extrema cautela’
Em um relatório enviado a clientes, o diretor de pesquisa macroeconômica para América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, destacou que esses fatores, combinados ao mercado de trabalho forte, ao crescimento da renda das famílias, à pressão na inflação de serviços e à baixa credibilidade da política fiscal, requerem “extrema cautela” na calibragem da política monetária. “(Esse cenário) aponta para uma longa pausa no ciclo de normalização das taxas e para um crescente risco de aumento dos juros no curto prazo”, diz Ramos.
Nas contas do economista Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro e sócio da Oriz Partners, já é possível falar em uma chance de 40% de alta dos juros ainda neste ano, ante 60% para o cenário básico, de manutenção da Selic em 10,5%. Com a piora das variáveis que influenciam a inflação, diz ele, o BC precisa reforçar as demonstrações de seu compromisso com o centro da meta e afastar as preocupações do mercado, especialmente em relação à transição no comando da autarquia.
O mandato do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, termina em 31 de dezembro, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que repetidamente critica o nível dos juros, que considera elevado, vai indicar seu sucessor, além de dois outros diretores. Assim, a partir de 2025 o petista terá nomeado a maioria dos membros do Copom.
“Existe essa preocupação de como será essa transição, se teremos uma mudança na condução da política monetária (a partir de 2025). Mas o BC ainda tem quatro reuniões para trabalhar este ano e atuar, com os juros, sobre a inflação de 2025. Você não pode condenar a próxima gestão do BC a lidar com um problema que você poderia ter resolvido antes”, diz Kawall. (O Estado de S. Paulo/Cícero Cotrim)