Ex-presidente da Mercedes-Benz diz que Brasil perdeu a credibilidade

Estradão

 

Ex-presidente da filial brasileira Mercedes-Benz, Philipp Schiemer disse que o Brasil perdeu a credibilidade. A afirmação foi feita durante o evento (virtual) de despedida do executivo, na quinta-feira, 25. O alemão deixou o cargo no País para assumir o posto de CEO da AMG, a divisão de veículos de alto desempenho do Grupo Daimler. De acordo com ele, se não fosse pela instabilidade política, o Brasil estaria em outro patamar.

 

“China e Índia, por exemplo, são países muito mais atraentes que o Brasil”, afirmou Schiemer. Ele disse que o tempo está correndo e que a indústria de veículos está entrando em uma nova era de eletrificação e digitalização. Para o alemão, isso vai requerer novos investimentos.

 

Segundo Schiemer, um país só atrai investimentos se for interessante. “O dinheiro vai ser cada vez mais escasso. Os investimentos só irão para países que tenham uma certa estabilidade e capacidade de planejamento. Nesse sentido, o Brasil ainda tem que fazer mais lição de casa.”

 

O executivo diz que acredita no potencial do País. Mas afirma que, por causa das instabilidades, o Brasil não consegue avançar nem explorar toda a sua capacidade. “Esse é um risco que o Brasil corre. É sempre visto como um país do futuro. Mas que nunca dá um passo adiante”.

 

Sete anos à frente da Mercedes-Benz

 

O executivo avalia que os sete anos em que esteve à frente da Mercedes-Benz do Brasil foram desafiadores. “No mesmo período em que começamos a fazer melhorias, o mercado piorou. Esses sete anos foram realmente difíceis. Tivemos de manter nossas estratégias e investimentos mesmo na crise”.

 

Foi durante a gestão de Schiemer que o a Mercedes-Benz passou a considerar o papel do cliente como fundamental na aposta de novos produtos. O slogan “As estradas falam. A Mercedes-Benz ouve”, saiu do campo do discurso para se transformar em ações práticas.

 

E, para entender a cultura do transporte brasileiro Schiemer trocou a sala de reuniões pela estrada. Como não podia estar na rodovia, ele fazia questão de ligar com frequência para os clientes. Falava tanto com transportadores quanto com caminhoneiros autônomos.

 

Esse esforço, em conjunto com a notável evolução na gama de produtos colocaram a Mercedes-Benz no topo do ranking de vendas de caminhões e ônibus no País. A marca alemã conquistou a posição por quatro anos consecutivos.

 

Se não houver nenhuma grande mudança, o feito será repetido em 2020. A Mercedes-Benz lidera os emplacamentos do setor no acumulado de janeiro a maio deste ano. Em números absolutos, a empresa vendeu 1.378 caminhões e 495 ônibus no mercado brasileiro ao longo do período.

 

Mercedes-Benz quer ser referência em pesados

 

Entre os desafios abraçados por Schiemer, o maior talvez fosse transformar a Mercedes-Benz em referência no mercado brasileiro de caminhões pesados. Trata-se de uma empreitada em tanto, sobretudo considerando que o segmento é dominado por Scania e Volvo.

 

Coube ao executivo recuperar a imagem do Actros, que chegou ao Brasil em 2010 importado da Alemanha. As soluções feitas para o mercado europeu, como freios a disco e eixo com redutor nos cubos de rodas de série não foram bem aceitas por aqui. O caminhão logo ganhou fama de ser muito pesado e beberrão.

 

Uma das boas tacadas de Schiemer foi trazer Roberto Leoncini para sua equipe. O atual vice-presidente de vendas e marketing da Mercedes atuou por anos como diretor-geral da Scania no País.

 

Foi durante a administração de Leoncini que a marca sueca trouxe as cabines P,G e R ao Brasil. Ele também foi responsável por introduzir os caminhões semipesados na linha de produtos oferecida pela Scania no País.

 

Pesados ganham boa fama

 

Leoncini foi fundamental para fortalecer a imagem da Mercedes no segmento de caminhões pesados. Menos de um após chegar à marca, vieram as novas gamas Axor e Actros (foto acima). O executivo mandou retirar tudo que acrescentava peso aos caminhões e custos extras de manutenção aos clientes.

 

Os caminhões da Mercedes também ficaram mais equipados. O Axor ganhou transmissão automatizada PowerShift e melhorias como ar-condicionado e suspensão pneumática de série.

 

No caso do Actros, as atualizações incluíram o terceiro facelift. Com as novidades, o modelo da marca alemã passou a disputar compradores e posições no ranking de vendas com Scania e Volvo.

 

Para encerrar sua gestão com chave de ouro, Schiemer lançou a nova geração do Actros. O modelo foi apresentado durante a edição de 2019 da Fenatran e começou a chegar às concessionárias agora. O novo cavalo-mecânico já é considerado como uma referência no que se refere à segurança.

 

O Actros não é o primeiro caminhão à venda no Brasil a trazer sistemas eletrônicos de segurança ativa. Esse mérito é da Volvo. Mas o Mercedes inova ao incorporar essas soluções com itens de série.

 

Na prática, isso faz toda a diferença. Sobretudo em um país como o Brasil, onde os índices de acidentes nas rodovias são extremamente altos.

 

Durante a gestão de Schiemer, a filial brasileira da Mercedes também se tornou referência no conceito de indústria 4.0. E a marca é a primeira do segmento no País a ter uma loja online para venda de caminhões novos e usados. Esse serviço foi lançado durante a pandemia do novo coronavírus.

 

Novos rumos no Brasil

 

Ao deixar o cargo, Schiemer disse que seu sucessor não vai assumir uma tarefa fácil. Sobretudo porque, além dos desafios inerentes ao cargo, o momento é ainda mais complexo.

 

A tarefa caberá ao também alemão Karl Deppen, que atua no Grupo Daimler desde 1990. O executivo tem grande experiência no setor de caminhões. Ele foi responsável, por exemplo, pelo lançamento do Atego BlueTec Hybrid na Europa e na Ásia.

 

Isso pode ser um indicativo das futuras apostas da Mercedes-Benz para o Brasil. Em dezembro do ano passado, a empresa confirmou ao Estradão que estuda vender a versão elétrica da Sprinter no País. (Estradão)