A estação do otimismo

O Estado de S. Paulo

 

O crescimento projetado para o PIB em 2020 é de pelo menos 2,3%, mas, com frequência, o resultado do ano fica abaixo do previsto. Desta vez será diferente?

 

O crescimento econômico valerá dois brindes, no próximo fim de ano, se o Produto Interno Bruto (PIB) avançar pelo menos 2,3% em 2020. O primeiro será para festejar o resultado. O segundo, para marcar um evento excepcional. Com frequência o desempenho da economia é inferior ao projetado em janeiro pelos analistas do mercado. Desta vez será diferente? Expectativas de tempos melhores parecem razoavelmente fundadas. Diante dos juros em queda, investidores têm de rever estratégias, consumidores podem aumentar seus gastos e o setor imobiliário começa a reagir. Mais construções abrem perspectivas de maior demanda de aço, cimento, vidro e outras matérias-primas. A isso se acrescenta, como sempre, a expectativa de criação de empregos. Mas também vale a pena levar em conta a experiência.

 

Entre 2015 e 2019 só uma vez o desempenho econômico foi melhor que o inicialmente apontado na pesquisa Focus, publicada semanalmente pelo Banco Central (BC). Em 2017 a expansão teria sido de apenas 0,50%, se estivesse correta a projeção divulgada no dia 6 de janeiro. Depois de dois anos de recessão muito severa, os economistas apostaram num desempenho levemente positivo. Mas a economia avançou 1,1%, apesar das dificuldades políticas do presidente Michel Temer, pressionado por uma tentativa de impeachment. O processo resultou de uma ação combinada entre a Procuradoria-Geral da República e os irmãos Batista, do Grupo J&F, envolvidos num dos maiores escândalos de corrupção da história da República.

 

A realidade voltou a ser pior que as previsões em 2018, quando o PIB cresceu 1,3%. No começo de janeiro a mediana das projeções havia apontado expansão de 2,69%. A expectativa de aceleração era razoável. Havia sinais de firme reação da atividade industrial. Mantida a recuperação nas fábricas, estímulos poderiam espalhar-se por toda a economia, aumentando a ocupação de máquinas e equipamentos e gerando empregos. Mas os sinais positivos sumiram no primeiro semestre, com o aumento da incerteza política e os danos causados pelo bloqueio das estradas, ação apoiada pelo candidato Jair Bolsonaro.

 

Em 2018 a economia cresceu, segundo 0 primeiro balanço oficial, 1,1%. Teria repetido, portanto, o desempenho do ano anterior. Uma revisão divulgada no fim de 2019 mostrou um resultado melhor. Apesar das muitas dificuldades, o PIB cresceu 1,3%, confirmando a tendência de aceleração herdada do ano anterior.

 

Só em março o primeiro retrato geral da economia em 2019 será divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por enquanto, a avaliação do mercado é muito ruim. Pela mediana das projeções, o PIB deve ter crescido apenas 1,17% – menos, portanto, que no ano anterior, o último do governo Temer, marcado pela insegurança política, pela incerteza quanto à orientação econômica da administração seguinte e pelo desastre resultante da ação dos caminhoneiros.

 

Talvez o resultado final seja menos vexaminoso. Faltam informações, ainda, para uma revisão das estimativas. De toda forma, dificilmente o balanço de 2019 será muito melhor do que hoje se estima. O primeiro semestre foi pantanoso, com pequeníssima reação no período de abril a junho. O desemprego se manteve próximo de 12% na maior parte do ano. No trimestre móvel encerrado em novembro ainda havia 11,9 milhões de desocupados e 26,6 milhões de pessoas subutilizadas. Números como esses foram tratados pelo governo, durante a maior parte do ano, como detalhes desimportantes. Só a partir de setembro surgiram os primeiros estímulos proporcionados pelo Executivo. Até aí, só a redução dos juros básicos, decidida pelo BC, ofereceu algum combustível ao consumo e à produção. O esforço de correção fiscal, dirão alguns, deu o espaço necessário ao corte de juros. Mas esse espaço já vinha sendo criado pelo governo anterior.

 

Apesar de tudo, pode-se apostar num ano melhor. Uma recuperação mais firme e duradoura dependerá de mais ajustes e de mais investimentos. Algum cuidado para evitar desastres políticos também ajudará. (O Estado de S. Paulo)