A Tarde
A recente redução dos juros básicos da economia para 6% ao ano, com corte de 0,5 ponto percentual pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central, e a sinalização de novas quedas na taxa Selic nos próximos meses abrem caminho para uma retomada do crédito. Esse cenário estimula a economia porque juros menores barateiam o crédito e incentivam a produção e o consumo, em um cenário de baixa atividade econômica.
Mesmo com a taxa Selic estacionada em 6,5% por 16 meses (desde março de 2018), as vendas por crediário no segmento automotivo cresceram. Entre veículos novos e usados, o Brasil teve 2,87 milhões de vendas financiadas no primeiro semestre deste ano. Esse volume representa um aumento de 9,1% em relação ao mesmo período do ano passado. Do montante, 37% são veículos novos (alta de 9,7% em relação ao primeiro semestre de 2018) e 63% usados (avanço de 8,7%). Essas vendas são de todos os tipos de veículo: automóveis, motocicletas e pesados.
Os números são da B3, que opera o Sistema Nacional de Gravames (SNG), maior base privada do país a reunir o cadastro das restrições financeiras de veículos dados como garantia em operações de crédito em todo o Brasil.
Boa parte desse avanço em financiamentos deve-se aos veículos pesados. Nesse segmento foram financiadas 128.877 unidades, entre novas e usadas, nos primeiros seis meses do ano, uma alta de 23,47% na comparação com o mesmo período de 2018, quando 104.226 veículos pesados foram vendidos a crédito.
Entre todos os veículos leves comercializados por financiamento no primeiro semestre de 2019, 635,3 mil são zero quilômetro, 316,4 mil têm até três anos de uso e 875,5 mil unidades somam entre quatro e oito anos de uso, segundo os dados da B3.
A modalidade CDC (Crédito Direto ao Consumidor) é a mais escolhida na hora de financiar veículos no Brasil, com 86%. Já os consórcios, com cotas contempladas mas não quitadas, representaram 12,3% nos primeiros seis meses do ano.
Dos automóveis, o prazo médio de financiamento é de 42,5 meses, mas entre os modelos mais antigos (de quatro a oito anos de uso) esse período chega a 44,5 meses.
Reflexos
Para o professor de matemática financeira e economista José Dutra Vieira Sobrinho, a redução da Selic “é muito pequena diante de taxas tão absurdas”. Mesmo ocorrendo esse repasse proporcional à diminuição de 6,5% para 6% ao ano da taxa básica, o reflexo no bolso do consumidor é pequeno. Ainda assim, Dutra considera que as taxas de juros cobradas pelos bancos para financiamento de veículos são “razoáveis” e bem menores do que as praticadas em cartão de crédito, cheque especial e crédito pessoal.
Logo após o anúncio do Copom, no dia 31 de julho, alguns bancos anunciaram redução de juros em várias linhas de crédito, mas apenas o Banco do Brasil e o Bradesco diminuíram suas taxas no financiamento de veículos. Na linha BB Crédito Veículo Próprio, em que o cliente oferece seu automóvel como garantia, as taxas foram reduzidas de 1,57% para 1,53% ao mês, na faixa mínima, para contratações realizadas pelo aplicativo do BB para mobile. A taxa mínima das linhas de financiamento de veículos novos e seminovos, contratados pelo mobile, passará para 0,84% ao mês, contra 0,88% ao mês cobrados até então.
O Bradesco promove redução no CDC Veículos. Embora o banco esteja estruturando as novas condições, já antecipou que para pessoas físicas e jurídicas o financiamento de veículos pelo CDC terá taxa mínima reduzida de 0,89% para 0,85% ao mês.
Os bancos das montadoras também promoveram reduções das taxas repassadas a concessionários.
Projeções em alta
Bons ventos sopram, finalmente, avalia Gercino Coelho Filho, diretor-executivo Grupo GNC. “Estamos começando a sentir uma retomada do mercado, principalmente pela melhoria da aprovação de crédito e reduções consecutivas nas taxas de juros para financiamentos. Imediatamente após o anúncio do Copom, os bancos das montadoras já nos passaram novas tabelas com redução das taxas, e o que mais nos surpreende também é a melhoria na aprovação. Temos bancos com aprovação superior a 80% sobre o total das fichas de análise enviadas”, afirma, ressaltando as boas perspectivas. “A redução da Selic está sem dúvida pressionando para que os bancos operem com um apetite bem maior do que estávamos acostumados nos últimos cinco anos”, conclui Gercino.
O principal banco que trabalhamos, o Banco Honda, reduziu suas tabelas. Antes tínhamos taxa de 0,99% e caiu para 0,94 %. Hoje com 40% de entrada temos taxa de 0,86% até 24 meses e 0,89 % em 36 prestações. Acreditamos que o segundo semestre será muito bom. Com o aquecimento da economia e a redução da Selic”, analisa Ismael Oliveira, diretor comercial do Grupo Imperial.
Para Luiz Pimenta, diretor da Fenabrave Regional Bahia, o segmento automotivo será beneficiado a médio e longo prazos com a redução da Selic. “A consequência direta disso é que quanto menor a taxa, maior o volume de vendas. Então, é de se esperar que nos próximos meses as vendas venham a ter um leve aumento”, estima. E não é pouco: a sinalização do Banco Central cria ânimo no setor. “As expectativas de vendas para o segundo semestre já são maiores porque normalmente é um período com alta de vendas de automóveis. Com as taxas reduzidas, consequentemente a gente vai financiar um maior volume de veículos”.
Com essa nova perspectiva, as estimativas para o ano também mudam. “Como a economia não decolou (leia-se PIB), a projeção caiu para 5% de crescimento em 2019. Mas com o aumento de confiança do consumidor e a redução de taxa, podemos chegar aos 10% projetados para este ano”, pondera Pimenta.
Pesquisa e tendências
A Webmotors, empresa de tecnologia de mercado de veículos, fez uma pesquisa com quase cinco mil usuários da plataforma sobre a intenção de compra e venda de veículos neste segundo semestre. O estudo aponta que 68% dos entrevistados já têm carro. Destes, 79% pretendem trocar o veículo nos próximos seis meses. Para os 32% que não possuem automóvel, 71% planejam comprar ainda este ano.
A maior intenção de pagamento na troca é o financiamento parcial do novo carro e para os usuários que ainda não possuem um automóvel, a tendência é por financiamento total. (A Tarde/Lúcia Camargo Nunes e Núbia Cristina)