O Estado de S. Paulo/The New York Times
Quem estará vencendo a corrida por empregos entre robôs e seres humanos? Ano passado, dois renomados economistas descreveram um futuro em que os humanos ficavam na frente. Agora, porém, eles declararam um vencedor diferente: os robôs.
A indústria mais afetada pela automação é a manufatureira. Para cada robô por mil trabalhadores, até seis trabalhadores perderam seus empregos e os salários caíram até 0,75%, segundo um novo estudo dos economistas Daron Acemoglu do MIT e Pascual Restrepo da Universidade de Boston. Este parece ser o primeiro estudo a quantificar os efeitos grandes, diretos e negativos de robôs.
O estudo é também particularmente significativo porque os pesquisadores, cujo trabalho é muito considerado em seu campo, foram mais otimistas sobre o efeito da tecnologia em empregos. Num estudo do ano passado, eles consideraram provável que o aumento da automação criaria novos e melhores empregos de modo que os salários acabariam voltando a seus níveis anteriores. Reza a teoria que do mesmo modo como os guindastes substituíram estivadores, mas criaram empregos afins para engenheiros e financistas, a nova tecnologia criou novos empregos para desenvolvedores de software e analistas de dados.
Mas esse estudo era um exercício conceitual. O novo usa dados do mundo real – e sugere um futuro mais pessimista. Os pesquisadores se disseram surpresos de ver pouquíssimo aumento do emprego em outras ocupações para compensar as perdas de empregos na indústria manufatureira. Esse aumento ainda poderia ocorrer, eles disseram, mas por enquanto há muita gente sem trabalho e sem uma perspectiva clara de futuro – em especial trabalhadores fabris sem formação universitária.
“A conclusão é que mesmo que o emprego total e os salários se recuperem, haverá perdedores no processo, e vai levar muito tempo para estas comunidades se recuperarem”, disse Acemoglu.
“Se você trabalhou em Detroit por 10 anos, não tem as habilidades para trabalhar em assistência à saúde”, disse ele. “A economia de mercado não vai criar, sozinha, os empregos para esses trabalhadores que estão suportando a maior parte da mudança.”
As evidências de deslocamento de emprego pela tecnologia expostas pelo estudo contrastam com um comentário do secretário do Tesouro, Steve Mnuchin, que disse num evento Axios na semana passada que o deslocamento de empregos humanos pela inteligência artificial “nem sequer estava em nossa tela de radar”, e sim “a 50 a 100 anos à frente”. (Nem todos os robôs usam inteligência artificial, mas um painel de especialistas – consultado pela Iniciativa sobre Economia Digital do MIT em reação aos comentários de Mnuchin – expressou a mesma preocupação geral com um grande deslocamento de empregos).
O estudo também ajuda explicar um mistério que vem intrigando economistas: se máquinas estão substituindo trabalhadores humanos, por que a produtividade não tem aumentado? Na indústria manufatureira, a produtividade vem aumentando mais do que em outros setores – e agora vemos evidências disso nos dados sobre emprego também.
O estudo analisou o efeito de robôs industriais em mercados de trabalho locais nos Estados Unidos. Os robôs são “culpados” pela perda de até 670 mil empregos manufatureiros entre 1990 e 2007, concluiu a análise, e esse número aumentará porque o número de robôs industriais deve quadruplicar.
O estudo acrescenta às evidências que a automação, mais do que outros fatores como comércio e terceirização no exterior que mereceram campanha do presidente Trump, foi a maior ameaça no longo prazo aos empregos no chão da fábrica. Os pesquisadores disseram que as revelações – “os efeitos negativos grandes e pesados de robôs em emprego e salários” – permaneceram fortes mesmo depois de se considerar importações, terceirização no exterior, software que substitui empregos, demografia do trabalhador e o tipo de indústria.
Os pesquisadores revelaram que os robôs afetaram tanto empregos masculinos como femininos, mas os efeitos sobre o emprego masculino foram até duas vezes maiores. Os dados não explicam o porquê, mas Acemoglu tem um palpite: as mulheres estão mais dispostas que os homens a aceitar uma redução de salários para trabalhar num campo de menor status.
Os economistas observaram o efeito de robôs em economias locais e também mais amplamente. Numa área isolada, cada robô por mil trabalhadores reduziu o emprego em 6,2 trabalhadores e os salários em 0,7%. Em escala nacional, porém, os efeitos foram menores porque empregos foram criados em outros lugares.
Tome-se o caso de Detroit, sede das montadoras de veículos, as maiores usuárias de robôs industriais. O emprego foi pesadamente afetado. Se as montadoras podem cobrar menos pelos carros porque empregam menos pessoas, o emprego deve aumentar em outras partes do país, como nos fabricantes de aço e operadores de taxi. Por outro lado, as pessoas em Detroit provavelmente gastarão menos em lojas. Considerando esses fatores, cada robô por mil trabalhadores reduziu o emprego em três trabalhadores e os salários em 0,25%.
As revelações alimentam o debate sobre se a tecnologia ajudará as pessoas a fazerem seus trabalhos com mais eficiência, e criará novos trabalhos, como no passado, ou acabará por substituir humanos.
David Autor, um colaborador de Acemoglu no MIT argumentou que as máquinas complementarão em vez de substituir os humanos, e não podem reproduzir traços humanos como senso comum e empatia. “Não acredito que esse estudo seja a última palavra sobre o assunto, mas ele está construído com extremo cuidado e é muito instigante”, disse ele.
Restrepo disse que o problema poderia ser que os novos empregos criados pela tecnologia não estão nos lugares que estão perdendo empregos, como o Rust Belt (cinturão da ferrugem, estados onde houve um declínio acentuado da produção industrial). “Eu ainda acredito que haverá empregos nos próximos anos, embora provavelmente não tanto como hoje”, disse ele. “Mas os dados me deixaram preocupado com as comunidades diretamente expostas a robôs.”
Além dos carros, os robôs industriais são mais usados na fabricação de eletrônicos, produtos metálicos, plásticos e químicos. Eles não requerem humanos para operá-los, e realizam várias tarefas como solda, pintura e embalagem. De 1993 a 2007, os Estados Unidos adicionaram um novo robô industrial para cada mil trabalhadores – a maioria no Meio-oeste, Sul e Leste – e a Europa ocidental adicionou 1,6.
O estudo, um documento de trabalho do National Bureau of Economic Research publicado na última segunda-feira, usou dados sobre o número de robôs da International Federation of Robotics (não há dados consistentes sobre o valor monetário dos robôs em uso). Ele analisou o efeito de robôs em emprego e salários em “commuting zones” (zonas usadas em análises econômicas e populacionais), uma maneira de medir economias locais.
A questão seguinte é se a próxima onda de tecnologias – como aprendizado de máquinas, drones e carros sem motorista – terá efeitos similares, mas sobre muito mais pessoas. (O Estado de S. Paulo/The New York Times/Claire Cain Miller, com tradução de Celso Paciornik)