Como segurar mais de 50% da frota de veículos brasileira

O Estado de S. Paulo

 

Mais de 70% da frota de veículos brasileira não tem qualquer tipo de proteção, exceto o DPVAT, o seguro obrigatório de veículos. Isso pode mudar rapidamente com a adoção do seguro auto  popular, em discussão desde o começo do ano. Recentemente foram feitas modificações importantes nas regras baixadas pela SUSEP. Mas ainda é cedo para dizer se serão suficientes para animar a s seguradoras.

 

Faz pouco tempo, foram baixadas as novas condições para o seguro auto popular. Bem mais flexíveis do que as originalmente definidas pelo órgão regulador, as novas premissas prometem pelo menos abrir o canal de vendas, completamente travado até agora.

 

A discussão do seguro auto popular vem se arrastando desde o começo do ano, sem que as seguradoras tenham se empolgado com o produto, ainda que podendo significar um forte crescimento na carteira de veículos, atingida de frente pela crise econômica que sacode o Brasil.

 

O que levou as seguradoras a não comercializarem o produto não foi a ideia, ou o conceito por trás dele. Ao contrário, a ideia é muito boa e tem tudo para inserir no mercado pelo menos 25% da frota nacional, composta pelos veículos com mais de cinco anos de idade, atualmente, em grande parte, não segurados.

 

As dificuldades ou a falta de apetite, vieram com as condições inicialmente impostas pela SUSEP. Elas poderiam deixar as seguradoras em posições vulneráveis diante de uma série de situações. Além disso, fugiam um pouco do conceito do produto, desenvolvido para atender os carros com mais de cinco anos de idade, que, em função do custo do seguro tradicional, simplesmente deixam de ser segurados por ser antieconômico para o proprietário.

 

É difícil prever qual o percentual da frota que aderirá ao seguro auto popular. Ainda há imponderáveis demais para determinar o preço real do seguro, quanto custará a menos que o seguro tradicional e quais as vantagens que o segurado terá ao optar por ele.

 

Enquanto as regras não estiverem claras e apresentadas de forma transparente, será complicado comercializar o seguro. De um lado, as seguradoras continuarão tendo restrições a ele e, de outro, o segurado se sentirá inseguro ao mergulhar em algo que não está completamente delineado, ou seja, ninguém vai entrar de cabeça em águas turvas.

 

As novas regras são um avanço importante, mas ainda insuficiente para que o produto decole. O uso de peças recondicionadas, o uso de peças do mercado paralelo, a idade mínima do veículo, a aceitação expressa das condições do seguro pelo segurado, etc., ainda são pontos que causam preocupação e podem atrasar o crescimento do novo seguro.

 

Para que o seu desenvolvimento se desse mais rapidamente seria necessário que a SUSEP permitisse que as seguradoras desenhassem o produto com base na realidade do mercado. Que as amarras fossem soltas e que as seguradoras desenvolvessem seus produtos em cima da experiência real, fruto da venda das apólices e de seu gerenciamento ao longo pelo menos do primeiro ano.

 

Ninguém sugere que as seguradoras fiquem completamente livres para fazer o que quiserem, mas é bom se ter claro que elas são empresas sérias, que trabalham baseadas na boa-fé recíproca e que não têm interesse em verem um produto que pode ser importante para seu faturamento naufragar por condutas equivocadas.

 

Há que ter parâmetros mínimos, mas eles não podem interferir na capacidade do mercado suprir convenientemente as demandas do produto. Será que tem peças recondicionadas em número suficiente para atender os veículos sinistrados? Será que as peças do mercado paralelo não podem ser tão importantes quanto as peças recondicionadas? Será que todas as regiões do país são semelhantes? Será que as diferenças regionais não podem impactar negativamente o seguro?

 

Por formação e por acreditar que é a melhor solução, eu sou a favor da liberdade do mercado. Não me parece razoável um burocrata sem experiência do mundo real determinar o que pode ou não pode ser feito. É muito mais razoável que os interessados no sucesso de um produto tracem o rumo e deem seus limites.

 

A função do órgão regulador é verificar se os contratos estão sendo corretamente cumpridos e se o consumidor não está sendo prejudicado. A hora que isso se transformar em regra, com certeza não só o seguro auto popular, mas todo o setor terá um crescimento bem mais significativo. (O Estado de S. Paulo/Antonio Penteado Mendonça)