Diário do Grande ABC
A Mercedes-Benz do Brasil completou ontem 60 anos. Em 28 de setembro de 1956, a montadora alemã inaugurava sua sede brasileira na Vila Pauliceia, em São Bernardo. A solenidade, que marcou o lançamento do primeiro caminhão produzido em território nacional, contou, inclusive, com a visita do então presidente do Brasil, Juscelino Kubitschek.
No ano em que celebra seis décadas de existência em território nacional – e regional –, porém, a companhia passa por dificuldades devido à forte crise econômica, que tem reduzido drasticamente a demanda por veículos comerciais, os carros-chefes da marca. Somente neste ano, de acordo com dados da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), as vendas de caminhões da empresa caíram 23,5%, somando 10.044 unidades. As de ônibus recuaram 24,7%, com 4.745 exemplares.
Ao mesmo tempo, a montadora passou a enxergar excedente de 2.500 trabalhadores na planta são-bernardense e, em duas etapas de PDV (Programa de Demissão Voluntária), enxugou em 20% o efetivo da unidade. Em maio, havia em torno de 9.800 empregados, e numa primeira rodada, que começou em junho com teto de R$ 115 mil conforme o tempo de casa, e baixou para R$ 85 mil em julho, conseguiu a adesão de 638 profissionais. Em agosto, diante da inércia do mercado de pesados, elevou a proposta para R$ 100 mil, válidos para qualquer funcionário. Recrutou outros 1.047 diante de pressão e do aviso de que haveria cortes involuntários. Após o término do prazo, enviou telegrama a 370 operários informando sobre o encerramento do contrato de trabalho. Ao todo, portanto, 2.055 pessoas perderam o emprego em um intervalo de quatro meses.
Agora, a fábrica da região conta com 7.745 profissionais e, ainda, reconhece excedente de 500 deles, que entram em lay-off (suspensão do contrato de trabalho) em outubro, por cinco meses. Para efeito de comparação, nos anos 1990 a empresa possuía cerca de 13 mil trabalhadores.
Troca de papéis
Nna matriz, a situação é diametralmente oposta à da sede brasileira. “O ano de 2015 foi o melhor da história. E o primeiro semestre de 2016 está sendo ainda melhor”, celebrou o diretor executivo de vans da Mercedes-Benz, Volker Mornhinweg. Para se ter ideia, no segmento que chefia, a comercialização, nos primeiros seis meses, cresceu 21% em relação ao mesmo período do ano passado.
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Rafael Marques, lembra que, em 2011, quando a crise estava centrada nos países europeus, e no Brasil havia recorde de vendas – foram comercializados 75 mil veículos em solo brasileiro –, houve generosos repasses à matriz alemã. “Agora seria o momento de a montadora retribuir a ajuda enviada pelas fábricas brasileiras. Ainda mais porque quem está superando marcas de comercialização agora são as unidades alemãs”, afirma. “Embora a Mercedes esteja vendendo menos no País, nos últimos meses, devido às dificuldades da economia, as operações brasileiras são, historicamente, muito rentáveis. E até 2013 ainda geravam muitos ganhos à companhia.”
De acordo com o sindicalista, com base em dados do Banco Central, as montadoras no País enviaram remessas às suas matrizes que somaram US$ 22 bilhões de 2008 a 2013. “Em sua história no Brasil, a Mercedes quase sempre liderou o mercado de caminhões e ônibus, e está entre as três empresas que mais remetem recursos às sedes.”
Marques revela que a entidade acionou executivos da direção mundial para tentar frear o processo de demissões em São Bernardo, e reverter os cortes dos 370. Segundo ele, o comando brasileiro tem conversado apenas sobre os casos em que os operários têm estabilidade, sem precisar quantos são, mas em relação ao restante, diz que não tem como suportar o excesso de trabalhadores. “Na crise na Alemanha não houve tanta dispensa. Até porque eles usaram bem o PPE (Programa de Proteção ao Emprego – que reduz jornada de trabalho e salários em até 30%), modelo no qual nos inspiramos para criar o brasileiro. Algumas indústrias, inclusive, o utilizaram por até 24 meses, a fim de evitar demissões em massa”, assinala. “Aqui, a Mercedes não quis renovar a adesão ao programa e, ainda, realizou demissão sumária.”
O sindicalista aposta na melhora da economia no ano que vem, o que deve ajudar o segmento e gerar maior demanda por veículos comerciais. Além disso, ele diz que aguarda maior debate em torno da renovação da frota de caminhões que, a partir de incentivos do governo, permitiria a troca de caminhões usados por novos, por exemplo, o que reaqueceria o setor.
Aportes
A Mercedes destaca que a planta da região é a maior do Grupo Daimler fora da Alemanha. “Em situação estável da economia, o Brasil é o maior mercado de caminhões da marca Mercedes-Benz. Também é um dos maiores mercados de ônibus para o grupo.”
A montadora também afirma que, entre 2015 e 2018, tem investido R$ 530 milhões para modernização da fábrica do Grande ABC. Isso sem contar aportes de R$ 230 milhões para modernização da fábrica de Juiz de Fora (Minas Gerais) e de R$ 70 milhões no Campo de Provas de Iracemápolis (para caminhões e ônibus). (Diário do Grande ABC)