O Estado de S. Paulo
Após fechar 1,4 mil vagas na fábrica de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, na semana passada, reduzindo o quadro de pessoal em 15%, a Mercedes-Benz vai suspender os contratos de cerca de 500 trabalhadores. O novo lay-off começa em outubro e vai até fevereiro de 2017.
Segundo a montadora, a medida é necessária pois, apesar das dispensas, a fábrica segue com excedente de pessoal, porque opera com 50% da capacidade. A ideia é administrar a ociosidade até o mercado iniciar uma retomada, o que é esperado pelo presidente da Mercedes no Brasil, Philipp Schiemer, para o começo de 2017.
“Achamos que o mercado pode crescer 10% a 20% no próximo ano, embora em cima de uma base muito pequena”, afirma Schiemer ao jornal O Estado de S. Paulo. A previsão para as vendas totais neste ano é de cerca de 53 mil caminhões, retrocedendo a volumes da década de 90. A Mercedes detém 28% desse mercado.
Dos funcionários que deixaram a unidade do ABC, 1.047 saíram por meio de um Programa de Demissão Voluntária (PDV), que pagou R$ 100 mil extra a cada um deles, além das indenizações normais. Outros 370 foram demitidos, pois a meta da empresa era de 1,4 mil adesões.
“Vamos lutar para que os cortes sejam revertidos”, diz o vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Aroaldo Oliveira da Silva. Schiemer, contudo, diz que não há como recuar.
Nos últimos três anos, período em que ele está à frente da operação da marca alemã, a mão de obra do grupo – que inclui outra fábrica de caminhões em Juiz de Fora (MG) e o centro de distribuição em Campinas (SP) – foi reduzida em mais de 3 mil funcionários. Desde 2014, a empresa abriu vários PDVs, além de ter adotado medidas de flexibilização como lay-off e Programa de Proteção ao Emprego (PPE).
Hoje, a Mercedes emprega 10,9 mil pessoas, incluindo os contratados para a unidade de Iracemápolis (SP), inaugurada em março. A fábrica de carros de luxo é a exceção no grupo, pois vai ampliar seu quadro em cerca de 60 pessoas para iniciar a produção de um segundo modelo no próximo mês, o utilitário GLA, além de inaugurar a área de pintura. A unidade produz atualmente o sedã Classe C, tem capacidade para 20 mil veículos por ano e emprega 400 trabalhadores.
Novo governo
O alemão Schiemer foi um dos primeiros executivos do setor automotivo a criticar abertamente o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, por considerá-lo “intervencionista”, o que levou investidores a deixarem de acreditar no País.
Ele critica, entre outras ações, a política de preços administrados, o longo período de juros baixos, subsídios “sem fundamento” e a falta de previsibilidade no programa Finame, para financiamentos de caminhões.
Com o agora efetivo governo do presidente Michel Temer e sua equipe econômica, Schiemer acredita que “será mais fácil discutir os assuntos tecnicamente e sem ideologia”. Nesse sentido, diz, há chances de que a economia volte a melhorar. “Vai ser um caminho lento e difícil, mas com perspectivas para o futuro.”
No curto prazo, para que o País retome a credibilidade, ele espera que o governo promova as medidas já apresentadas, como a ajuste das contas públicas e a reforma da Previdência. “É uma discussão complexa e difícil mas não há a alternativa de não fazer pois, do contrário, o Estado vai quebrar; é uma questão matemática.”
Schiemer repete o discurso adotado mais recentemente por alguns executivos de que a política de subsídios tem de ser revista. “Incentivos às vezes ajudam, mas tem de ter um objetivo claro, e início, meio e fim. Se não se determina quando deve acabar, cria-se um vício e aí, quando há uma mudança grande, como a queda do mercado, percebe-se que não funciona mais assim.”
“Durante a intervenção na crise global de 2009, por exemplo, foi bem acertado porque trouxe confiança ao mercado; mas depois esqueceram de retirá-lo”.
O executivo admite que houve pressão das montadoras para a manutenção dos benefícios. “A Mercedes também se beneficiou disso, mas muitas vezes esquecem que investimos muito com base no funcionamento daquele sistema. Hoje todas as empresas têm grande capacidade ociosa e não sabem como encher as fábricas de novo”. (O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)