O Estado de S. Paulo
O câmbio mais competitivo e a busca por mercados no exterior para escoar parte da produção não consumida pela economia doméstica em recessão produziram um crescimento de 12% no número de empresas exportadoras neste ano. Agora, no entanto, o real mais valorizado desafia esses novos participantes a se manterem no jogo.
Das 19,4 mil companhias que embarcaram produtos ao exterior nos últimos oito meses, 2,1 mil não exploravam rotas internacionais até um ano atrás, segundo balanço do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC). Na maioria, os novos exportadores são empresas pequenas – cujos embarques, desde janeiro, não chegam a US$ 1 milhão – que viram a oportunidade de despachar ao exterior produtos encalhados em estoque quando o dólar deu competitividade à produção nacional ao engatar trajetória de valorização a partir de julho de 2015.
Dos mais de R$ 4,00 do início do ano, o dólar ficou mais barato no embalo da melhora de humor do mercado com a troca de governo. Na média, o valor da moeda em agosto (R$ 3,21) foi o mais baixo dos últimos 14 meses, aproximando-se do patamar em que, para algumas empresas, as exportações deixam de ser competitivas e rentáveis.
Heitor Klein, presidente da Abicalçados, entidade que representa a indústria de calçados, diz que, com o dólar rondando a casa de R$ 3,20, a maioria dos associados não consegue mais formar preços para brigar com a concorrência asiática. Estados Unidos, França e a vizinha Argentina são os principais destinos do setor, que no ano passado exportou US$ 960 milhões, mas chegou a embarcar US$ 1,5 bilhão em 2010.
“No início do ano, havia confiança de que o câmbio se acomodaria em R$ 3,60 e as empresas posicionaram preços com base nessa taxa. Agora, há uma dificuldade grande para elas honrarem negócios fechados durante feiras realizadas na Europa em julho”, lamenta Klein. “A tendência é que passem a exportar menos porque ninguém quer vender com prejuízo.”
O dólar recuou a um patamar “perigoso”, segundo Fernando Pimentel, diretor-superintendente da Abit, entidade que abriga as empresas da indústria têxtil nacional. “Essas idas e vindas do câmbio são deletérias para se criar compromissos com o mercado mundial.” Segundo ele, todos os mercados ficaram mais difíceis, mas a tendência é de que as empresas deixem, primeiro, aqueles destinos que demandam maior investimento.
Sem ter um câmbio que ajude a aliviar custos de produção em moeda forte, empresas que investiram em automação industrial têm mais condições de seguirem vivas na competição internacional do que aquelas que dependem de mão de obra intensiva, como ocorre, nas indústrias têxtil e de calçados.
As grandes empresas tendem a se dar melhor do que as pequenas, as primeiras a deixar as exportações quando o real entra em trajetória firme de apreciação, segundo Pimentel.
Produtos com elevado porcentual de conteúdo importado conseguem, em maior ou menor grau, equilibrar perdas. Montadoras de carros, assim como fabricantes de eletrônicos e de produtos de alta tecnologia, como a Embraer, fazem parte de um grupo onde insumos importados representam uma espécie de hedge (proteção) natural aos choques cambiais. (O Estado de S. Paulo/Eduardo Laguna)