Novo Sportage encara Q3, CR-V, ix35 e GLA

Car and Driver Brasil

 

É a hora dos SUVs compactos. Toda marca que tenha a pretensão de ver números azuis em suas planilhas no final do ano precisa criar seu hatch mais altinho e com jeito de que pode encarar uma enchente. Quem se deu mal nessa foram os SUVs médios, que surgiram antes da febre dos jipinhos e que, agora, saíram do holofote.

 

Com o lançamento do novo Kia Sportage, resolvemos juntar os cinco SUVs médios mais vendidos para um embate. Achou sem sentido? Bem, pense assim: se metade do pessoal que compra Honda HR-V e Jeep Renegade gostou dessa ideia de sentar alto e quiser dar um passo adiante, é para estes carros que eles vão olhar.

 

5º Lugar – Honda CR-V

 

Na edição 101 da C/D fomos para os Estados Unidos conhecer a décima geração do Civic, o carro que nos fez lembrar que a Honda sabe desenvolver um automóvel com boa dose de paixão e ajudou a tirar o gosto de cabo de guarda-chuva que a atual versão do sedã deixou em nossa boca. E por que estamos falando do Civic enquanto deveríamos estar falando do CR-V? Bem, é que o SUV sofre do mesmo problema que o irmão de sandália rasteirinha nesta última fase: uma tremenda falta de ambição.

 

Essa quarta geração do CR-V foi lançada em 2011 e é baseada na nona encarnação do Civic, esta que passa por seus últimos momentos de vida no Brasil e que, depois de sofrer com baixas vendas nos EUA, precisou apelar para um facelift de emergência. O SUV também passou por uma reestilização, no final do ano passado, que igualmente serviu para o distanciar em proposta do, na época, recém-chegado HR-V. E em preço também: o CR-V agora é vendido por aqui em versão única de R$ 145.800.

 

A grana não seria problema se, junto com a atualização no design, a Honda tivesse feito alguma renovação na essência do SUV. E é basicamente por isso que o CR-V fica, categoricamente, na rabeira deste comparativo. Sim, é verdade que ele tem o maior espaço interno dos cinco, além de ter tração nas quatro rodas sob demanda. Mas o latifúndio do interior não compensa a completa ausência de emoção que o Honda oferece.

 

Começando pela cabine que, apesar de grande, é pouco inspirada. Não estamos dizendo que um carro familiar precisa ter desenho agressivo, com volante de base chata e cockpit voltado para o pai de família que está na direção. Porém, a própria Honda já conseguiu reunir melhor a sua capacidade de criar soluções inteligentes com um design mais entusiasmante.

 

Aí vem a hora de apertar o botão de partida e a falta de tesão fica mais evidente. O motor 2.0 de 155 cv roda sempre silencioso, sem exclamar, mas entrega pouco desempenho. Aliado a um já obsoleto câmbio automático de cinco marchas, o SUV faz 0 a 100 km/h em quase 13 segundos e apanha de muito popular 1.0 nas retomadas. De novo: um carro familiar não precisa ser uma máquina de acelerar, mas imagine o sofrimento de subir uma serra com cinco ocupantes e todos os 589 litros do porta-malas cheios de tralha? No final, a impressão é que a única ambição do CR-V é ser grande. O que, em tempos de vagas apertadas e gasolina cara, já deixou de ser argumento de compra.

 

4º Lugar – Hyundai IX35

 

Ele já foi mais popular, porém o ix35 continua sendo o SUV mais vendido nesta faixa de preço e tamanho, inclusive com crescimento nas vendas em 2015, ano em que até pão francês sentiu a crise. E não dá para dizer que é por causa do quesito novidade: desde que ele foi lançado por aqui, em 2010, não recebeu grandes alterações estéticas ou mecânicas. A última foi recente, em setembro do ano passado, quando o SUV ganhou nova grade, faróis e alguns equipamentos extras. Bem, se a novidade não explica o sucesso do Hyundai, sobram duas possibilidades que justificam a sua popularidade. A mais óbvia seria que ele é, simplesmente, o melhor do segmento e que nenhum concorrente superior apareceu em seis anos. Como sua posição neste comparativo já antecipa, este não é o caso.

 

O ix35 é o retrato de uma fase de afirmação das montadoras coreanas no mundo. Depois de ficar décadas reproduzindo com atraso o que as japonesas produziam, Hyundai e Kia – que fazem parte do mesmo grupo – resolveram fazer barulho. E não há melhor forma de chamar atenção do que pelos olhos. O SUV talvez seja a melhor encarnação da filosofia visual da marca à época, cheio de linhas fluidas e ousadas. Seis anos depois, achamos que o desenho já cansou, mas as vendas em alta podem indicar que precisamos procurar um oculista.

 

Valores nutricionais

 

Se há discussão sobre o desenho externo, na cabine a impressão é que o tempo passou mais velozmente. Aqui, a culpa é das linhas agressivas e incomuns que envelheceram mais rápido, já que o ix35 em nenhum momento foi referência de acabamento de primeira. Assim como a iluminação azulada que fez sucesso nos anos 2000. O espaço, ao menos, é dos maiores e permite que cinco viajem confortavelmente.

 

Acelere o Hyundai e você atesta a tese de que ele necessita de uma renovação mais profunda: as respostas de direção, suspensão e chassi não têm a precisão do novo Kia Sportage – que compartilha a plataforma com a nova geração do ix35 lá fora. Ao menos, surpreende nas acelerações. Achávamos que a perda de 11 cv do 2.0 para se adaptar às normas de emissões fosse prejudicar o SUV. Mas o câmbio bem escalonado e com trocas rápidas ajudou e fez com que o Hyundai atingisse o 0 a 100 km/h em 11 s, 0,9 s antes do primeiro ix35 flex que testamos em 2012 e que tinha 178 cv contra os atuais 167 cv.

 

O que explica o sucesso, então? Bem, os cinco anos de garantia e a baixa desvalorização (ele já mostrou ser bem aceito entre os usados) são duas boas razões. Mas, convenhamos, comprar um carro pensando somente nos benefícios do pós-venda é como comer hambúrguer por seus valores nutricionais: não faz sentido.

 

3º Lugar – Mercedes GLA

 

Pode até ser surpreendente ver um Mercedes-Benz atrás de um carro coreano neste comparativo. Mas não chega a ser surpresa ver o GLA atrás dos demais SUVs do seu segmento. E a principal razão para isso é que ele faz muito pouco para ser, de fato, um SUV. Feito sobre a mesma plataforma para compactos que é usada por Classe A, CLA e Classe B, o GLA mais parece uma versão aventureira do hatch original. Os números mostram isso: a diferença de altura entre o A e o GLA é de apenas 6 cm, contra 17 cm que separam um Audi A3 de um Q3 – apesar destes não compartilharem plataforma. E isso diminui muito o principal apelo de um SUV desta faixa de preço, que é aliar boa dose de luxo com espaço interno suficiente para levar mais gente do que você gostaria.

 

Além do espaço que não deixa um Volkswagen Golf com inveja, o GLA tem uma cabine sem os luxos que esperamos de um Mercedes-Benz. E aqui não estamos nem falando de qualidade do acabamento do painel ou dos bancos – ambos são bem feitos. É que luxo, hoje em dia, também envolve a capacidade de juntar bem tantas tecnologias e controles de forma intuitiva no interior. E aí jogam contra itens como a central multimídia confusa – e que trocou o sistema do GPS para um genérico, não mais de desenvolvimento da Mercedes – e os nada ergonômicos botão do freio de estacionamento eletrônico e alavanca de câmbio na coluna de direção.

 

Linhagem

 

O GLA tem qualidades, no entanto. E elas são na maioria relacionadas aos benefícios de fazer parte da família. O chassi é muito equilibrado e previsível, apesar de a suspensão ser mais dura que deveria. A direção, por outro lado, é a melhor desta disputa. Com precisão e peso certo mesmo para um carro que não inspira a uma tocada mais esportiva.

 

E olha que o Mercedes foi o mais rápido dos cinco deste comparativo, demorando 8,4 segundos para atingir os três dígitos. Nas retomadas ele também foi bem, sendo um segundo mais ligeiro que o Audi Q3, na média. Aqui, a culpa é da curva de torque, mais plana que Brasília e que já entrega o torque máximo em 1.250 rpm. O entrosamento com a transmissão não é tão bom quanto no Audi, mas a dupla da Mercedes consegue trocar passes sem drama.

 

No final, a impressão que fica é que o Mercedes-Benz GLA  não é necessariamente um carro pior que Kia Sportage e Audi Q3, que estão à sua frente. Mas é, definitivamente, um SUV pior que ambos.

 

2º Lugar – Kia Sportage

 

Antes de explicar a segunda colocação do Sportage na disputa, vamos aos fatos: esta é a quarta geração do SUV, o modelo que existe há mais tempo na gama da Kia no mundo, e que começa a ser vendida no Brasil em junho. Serão duas versões. A de entrada custa R$ 109.990 e a topo, que tem tração nas quatro rodas, vale R$ 134.990. A geração anterior partia de R$ 103.900 e atingia R$ 122.900, o que significa um aumento até pequeno no preço.

 

Principalmente se levarmos em conta o quanto o Sportage mudou na troca de geração. O design, por exemplo, está completamente diferente. O que não é necessariamente uma boa coisa, já que o antigo é um dos melhores trabalhos de Peter Schreyer. O novo é… exótico. Eu não gostei da dianteira, com faróis em posição muito alta e aquele imenso farol de neblina com quatro canhões de luz. Lembra uma miniatura do Porsche Cayenne de primeira geração. Que é tão bom quanto dizer que a sua capacidade de entender futebol está no mesmo nível da de Dunga. Mesmo assim, muita gente aqui na C/D curtiu. A lateral segue a filosofia do anterior, com muita lata e pouco vidro, e a traseira está elegante, com lanternas finas e com filetes de LED.

 

O interior é um avanço indiscutível. O encaixe das peças está muito mais preciso e os materiais usados em volante e alavanca de câmbio, por exemplo, são de alta qualidade. A disposição dos controles na cabine também foi bem feita, inclusive com o console central ligeiramente inclinado para o lado do motorista para tentar criar uma sensação de cockpit. O espaço interno também evoluiu, com 0,5 cm a mais para cabeças na dianteira, 1,5 cm na traseira e 0,7 cm a mais para os joelhos de quem senta no banco de trás. No total, o Sportage ganhou 3 cm no entre-eixos (totalizando 2,67 m) e 4 cm no comprimento.

 

Entre os equipamentos mais interessantes estão a central multimídia com tela sensível ao toque, controle de descida em ladeiras, detector de ponto cego, seis airbags e cruise control adaptativo.

 

32 Bit

 

A evolução mais importante, no entanto, não dá para ver. Mas dá para sentir. A carroceria agora usa 51% de aços de alta resistência contra 18% da geração anterior. Isso, segundo a marca, fez com que a rigidez torcional aumentasse 39%. Mais mudanças foram feitas na suspensão: a montagem das buchas do arranjo dianteiro foi revista. Atrás, o sistema multilink tem braços inferiores duplos e amortecedores mais modernos. A caixa de direção está mais perto do eixo dianteiro, ganhou uma central eletrônica de 32 bit (16 bit no anterior) e tem novas buchas de montagem. A versão topo, com tração integral, conta com um diferencial blocante central que trava em 50/50 a distribuição de força para cada eixo caso perceba diminuição na aderência.

 

Na prática, as mudanças serviram para deixar o SUV mais preciso e afiado, principalmente quando comparado ao Hyundai ix35, que compartilha a plataforma do antigo Sportage. O Kia é certeiro na direção e faz um belo trabalho para reproduzir o que está acontecendo na rua sem ser desconfortável. É um acerto bem justo que mostra o grande progresso em relação ao antigo e à concorrência. O carro que testamos estava calçado com rodas de 19 polegadas que prejudicaram o conforto – as rodas de 17 funcionam melhor.

 

A melhor capacidade de aliar boas respostas dinâmicas com um rodar tranquilo, aliás, é sinal da maior maturidade dos carros da Kia e da Hyundai desta última geração. Tivemos a mesma sensação ao andar na nova geração do Elantra nos Estados Unidos, que também perdeu o desenho agressivo e se tornou um sedã bem mais equilibrado de forma geral.

 

Carga pesada

 

Porém, assim como com o carro da Hyundai, o Sportage deixou de evoluir em um aspecto essencial: sob o capô. A Kia continua usando no País o mesmo 2.0 do ix35, com 167 cv. Falta força em giros médios para ajudar a levar os 1.630 kg, o que prejudica os dados de aceleração e retomadas, e maior refino no funcionamento de maneira geral. Ao menos, a transmissão é nova e melhor que a antiga, com trocas bem rápidas e software inteligente. É ela que faz com que o Sportage alcance os 100 km/h nos mesmos 11 segundos que o ix35 mesmo sendo 130 kg mais pesado. O pedal de freio é progressivo e morde bem, o suficiente para fazer o Kia parar antes do Hyundai, apesar da carga extra.

 

E é exatamente a capacidade de fazer um motor eficiente e moderno que ainda faz os coreanos ficarem abaixo dos alemães. A construção já chegou a bom nível e a Kia acertou no ajuste dinâmico do Sportage. Falta investir no coração dos seus carros. Se conseguir, será imbatível.

 

1º Lugar – Audi Q3

 

Sem meias palavras, Audi e Volkswagen fizeram besteira quando nacionalizaram A3 Sedan e Golf. Os dois, feitos na plataforma MQB, até ganharam motor flex na imigração, mas perderam itens muito mais importantes, como a suspensão traseira independente e a transmissão de dupla embreagem. É o tipo de coisa que dá razão ao espírito de vira-lata, aquela sensação que nada que é feito em solo nacional presta. O primeiro lugar do Q3 neste comparativo quebra em parte este mito. Nacionalizado em maio, ele manteve todas as qualidades que admirávamos quando ele era importado da Espanha, sem deixar nada de lado para aprender o português.

 

Parte disso é por causa de seu tamanho e de sua idade. Enquanto A3 Sedan e Golf são estampados e montados no Brasil, o Q3 vem até pintado da Europa. Aos brasileiros, cabe apertar meia dúzia de parafusos e encaixar tudo no lugar. É que, por ser maior e montado em outra plataforma, o maquinário usado no Paraná não comporta um carro do tamanho do SUV. O lado bom é que ele mantém o nível de montagem do modelo europeu e não perde qualidade ao ser finalizado por aqui.

 

Ou seja, sobra equilíbrio dinâmico e qualidade de rodar ao Audi. A manutenção da suspensão multilink atrás ajuda na tarefa de dar conforto e precisão ao conjunto e o carro todo sempre se mostra previsível e competente.

 

Dirigindo um Uber

 

A nacionalização fez tão bem ao Q3 que nem o motor precisou virar flex, transformação que geralmente significa um pior rendimento com gasolina em troca da liberdade da escolha de combustível. E o melhor: o 1.4 turbo tem a mesma potência e torque que o de A3 Sedan e Golf, que também bebem cana. Com 150 cv e uma curva plana para os 25,5 mkgf de torque, o Audi Q3 acelera como um carro de R$ 130 mil deve acelerar: sem medo de ser mais ágil que os outros.

 

Se nem o certeiro equilíbrio nem o melhor motor do comparativo fossem suficientes, o Audi ainda tem a excelente transmissão de dupla embreagem e seis marchas que também foi trocada nos hatches médios. E é dela o trabalho de fazer você não ter trabalho nenhum. O programa é tão inteligente e as trocas tão rápidas, que optar pelas mudanças manuais seria tão estúpido quanto pedir um Uber e solicitar para dirigir até o destino final.

 

No final, a vitória do Q3 não é por um quesito específico. Ele ganha por ser o que melhor prova que gastar a mais em um carro não é dinheiro jogado fora. Depois do Audi, você não vai querer voltar para seu SUV compacto. Qualquer que seja ele. (Car and Driver Brasil/Rodrigo Machado)