Crise atinge todos os níveis da cadeia de autopeças e ameaça até a produção

DCI

 

O mercado de autopeças vive uma de suas piores crises. A queda das vendas de veículos afeta empresas de todos os portes, mas a recessão econômica ameaça o fluxo de produção dos próprios fornecedores da cadeia automotiva.

 

A alemã Freudenberg, que tem no setor automotivo sua maior receita, relata as dificuldades de alguns de seus fornecedores para garantir as entregas de insumos, principalmente diante da falta de capital de giro.

 

“Com a queda vertiginosa da demanda, muitos fornecedores da base não estão resistindo. Tivemos até que ajudar algumas empresas financeiramente para nos entregar os pedidos”, afirma o presidente da Freudenberg-NOK, George Rugitsky.

 

O executivo conta que o setor de compras da divisão tem trabalhado fortemente para garantir os insumos à produção da empresa, que atende montadoras e o mercado de reposição.

 

“Fornecedores disseram que iriam fechar as portas e conseguimos que alguns criassem pulmões para nos atender enquanto não arranjássemos substitutos. É um trabalho árduo”, acrescenta.

 

A brasileira Falcare Equipamentos, que realiza projetos para a maioria das montadoras instaladas no País, demitiu quase 40% do seu efetivo nos últimos três anos.

 

“Chegamos ao nível mínimo que a empresa pode rodar. Todos os investimentos das montadoras estão parados”, conta o presidente Nivaldo Falcare.

 

O executivo explica que, apesar da necessidade de substituição de equipamentos antigos nas linhas de produção, as marcas têm optado por esperar uma melhora do cenário econômico.

 

“Como o ritmo de produção de veículos caiu sensivelmente, o desgaste dos equipamentos é menor. Por isso, as montadoras têm conseguido adiar o investimento em manutenção”, pondera Falcare.

 

O fantasma da crise paira também sobre a norte-americana Cummins. “Estamos operando com 70% de ociosidade em motores no País”, afirma o presidente da companhia no Brasil e vice-presidente da Cummins Inc, Luís Pasquotto.

 

Considerada a maior fabricante independente de motores para veículos pesados, nos últimos anos a empresa adiou a construção de uma nova fábrica no País, reduziu seu quadro de funcionários e cortou uma série de custos.

 

“Para 2016, projetamos uma retração de 20% das vendas de caminhões no mercado brasileiro”, avalia Pasquotto.

 

O executivo afirma que o cenário de crise política e econômica, aliado ao quadro internacional de queda das commodities, impactou em cheio o segmento pesado.

 

“Há crédito, mas o empresário não quer investir. A crise política desencadeou a falta de confiança dos investidores estrangeiros”, observa.

 

O panorama também é desolador para a brasileira Cydak, que tem nas montadoras e sistemistas seus principais clientes. A empresa atua na área de estamparia, desenvolvendo projetos de reforma e retrofitting de prensas.

 

“O ano passado foi uma catástrofe para nós. Atingimos apenas 20% da nossa meta de vendas”, revela o presidente Clóvis Rueda.

 

Segundo ele, o mercado vinha em uma trajetória de crescimento expressivo de 2010 a 2014, quando a empresa atingiu recorde de faturamento em 20 anos de existência. “Com a crise, os pedidos caíram de forma substancial”, pontua.

 

Rugitsky, da Freudenberg, acredita que o mercado automotivo não deve atingir 2 milhões de unidades neste ano. “As dificuldades no segmento de autopeças são crescentes e os pedidos de recuperações judiciais só aumentam no mercado brasileiro”, observa.

 

Alternativas

 

Em momentos de retração da demanda, os fabricantes de autopeças geralmente se voltam para a reposição. “A rentabilidade é maior no segmento”, revela Rugitsky.

 

Ele informa que a Freudenberg-NOK deve ganhar participação na reposição, em 2016. “Apesar do cenário, investimos fortemente no after market. Vamos ganhar share e crescer acima do mercado”, garante.

 

A Cummins afirma que também está investindo na reposição e acrescenta o trabalho intenso na localização de peças. “Estamos nacionalizando motores para ganhar participação de mercado”, diz Pasquotto.

 

Para a Freudenberg, a nacionalização de componentes faz parte da estratégia de reduzir a exposição ao câmbio. “Em função da oscilação cambial, temos recebido consultas para vender no Brasil produtos que não fabricávamos localmente”, conta Rugitsky.

 

Segundo ele, o mix entre nacionais e importados da empresa mudou. “Passamos a produzir um portfólio maior no País devido à demanda das montadoras por produtos com conteúdo local”, destaca.

 

Sobre a recuperação do mercado, entretanto, executivos mantêm o ceticismo. “É difícil enxergar um horizonte de retomada”, declara Falcare.

 

Para Rugitsky, o mercado vai levar um tempo considerável para se recuperar. “Fizemos um investimento importante em modernização para estarmos preparados quando a demanda voltar com força. Mas até lá, vai ser um processo doloroso”, acredita.

 

Já Pasquotto garante que a Cummins não deixará de olhar para o Brasil. “O potencial do mercado é nítido, por isso temos que nos manter competitivos”, pontua. (DCI/Juliana Estigarríbia)