‘Combustível verde’ de avião avança pouco

O Estado de S. Paulo

 

A participação global do combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês) no mercado aéreo em 2027 deve atingir apenas 2%, patamar muito distante para contribuir com as metas climáticas de emissões líquidas de carbono até 2050. A estimativa é da pesquisadora do Centro de Política Energética da Columbia University, Luisa Palacios, em entrevista ao Estadão/Broadcast. O ideal seria uma participação de 10% em 2030 – o que, pelo ritmo atual, não será atingido, na avaliação dela.

 

Em contrapartida, segundo a pesquisadora, o Brasil deve ganhar um impulso no setor, com o marco regulatório sendo estabelecido no Congresso e o aumento da atratividade para o capital externo. O projeto de lei batizado de “PL do combustível do futuro” é classificado como um ponto de virada para o setor, ao criar programas nacionais de diesel verde, biogás, biometano e combustível sustentável para aviação.

 

“Eu vejo os frameworks (estruturas) regulatórios em outras partes do mundo, e o Brasil está colocando as peças no lugar para que os projetos de SAF sejam financiáveis, comerciais e de interesse para os investidores internacionais”, afirmou a pesquisadora de Columbia.

 

Ainda sem produção industrial no País, há diferentes anúncios de projetos em andamento para possibilitar a participação do combustível sustentável no setor aéreo, casos da Acelen, Brasil BioFuels, Petrobras, Raízen e Refinaria Riograndense.

 

“O Brasil pode ser um dos mais importantes, talvez o mais importante produtor de SAF no mundo. Só no caso dos resíduos agrícolas, a nossa capacidade de produção varia de 6 bilhões a 9 bilhões de litros considerando somente uma rota de produção”, analisa João Victor Marques, pesquisador da FGV Energia.

 

Esse patamar seria suficiente para suprir a demanda do mercado interno. O consumo do querosene de aviação (QAV) no Brasil foi de 7 bilhões de litros em 2019, antes da pandemia – número que caiu para 6,8 bilhões de litros em 2023. Os dados são da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).

 

Vantagem

 

A sócia da gestora eB Capital, Luciana Antonini Ribeiro, avalia que o País está estabelecendo uma vantagem competitiva na dinâmica de risco-retorno no setor de biocombustíveis. O amplo mercado consumidor interno também ajuda nesse cenário.

 

“Somos o segundo maior produtor de biocombustíveis e temos uma quantidade incrível de biomassa, o que é altamente relevante quando falamos de transição. O setor privado está aproveitando essa capacidade? Sim, mas poderia fazer muito mais”, diz Luciana.

 

O Anuário Estatístico Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis de 2024, divulgado em junho, aponta que a produção de biocombustíveis atingiu recorde de 43 bilhões de litros de etanol e biodiesel no ano passado.

 

Porém, especificamente no caso dos combustíveis que prometem substituir o querosene de aviação, a necessidade de infraestrutura e a existência de uma cadeia tecnológica de processamento são os principais gargalos para a garantia de competitividade econômica. Para 2024, a Associação do Transporte Aéreo Internacional (Iata) tem a projeção de produção de 1,9 bilhão de litros de combustíveis sustentáveis de aviação no mundo, ou apenas 0,53% da necessidade global.

 

No Brasil, o Estado de São Paulo é apontado como uma das áreas de maior relevância, em função da cultura de cana-deaçúcar. A implantação de biorrefinarias reduziria as restrições de logística e custos de transporte. (O Estado de S. Paulo/Renan Monteiro)