O Estado de S. Paulo Online
O sistema tributário brasileiro é tão disfuncional que pode ser considerado um morto-vivo a assombrar as empresas com um número exorbitante de regras, disputas judiciais e custos indiretos e invisíveis de impostos. Por isso, a reforma tributária já sancionada pelo presidente Lula, e que agora começa a ser regulamentada pelo Congresso, representa um enorme avanço, ainda que haja críticas a concessões feitas no Congresso a grupos de interesse.
O novo modelo conserta grandes distorções e tem várias vantagens, já de saída. Primeiro, os impostos passarão a ser cobrados “por fora”, e não por dentro do preço dos produtos. É difícil de acreditar, mas hoje o próprio imposto compõe a base de incidência de sua cobrança. Ele ajuda a tornar a carga maior e de forma pouco transparente.
Outro ganho é que a cobrança de impostos deixa de ser cumulativa. Só se paga imposto sobre o valor adicionado na cadeia de produção. Quem paga gera um crédito para o próximo elo da cadeia, que consegue abater esse valor do tributo a ser pago. Com isso, o custo é apenas sobre a diferença, em relação ao novo passo da produção.
É por isso que o novo tributo tem esse nome estranho de Imposto sobre Valor Adicionado (IVA). O Brasil, por exemplo, deixará de exportar impostos, o que tornará os nossos produtos mais competitivos internacionalmente.
A exceção vale para os setores de mineração, gás natural e petróleo, que ganharam um Imposto Seletivo, ou do “pecado”, pelo impacto que provocam no meio ambiente. A alíquota de 1% é baixa, e fora a reclamação dos representantes de classe envolvidos, não deve ter grandes impactos sobre a margem das empresas.
Para ficar apenas no setor de mineração, quem conhece o Estado de Minas Gerais sabe que essa atividade tem o poder de literalmente revirar terras do avesso, deixando um rastro de destruição para trás. E após as tragédias de Brumadinho e Mariana, fica difícil isentar a mineração de uma carga mais elevada, ainda que impacte a exportação.
O fim da guerra fiscal entre os Estados é mais um ganho considerável. Hoje, cada produto pode ter uma alíquota diferente em cada Estado, para a cobrança do ICMS, o mesmo valendo para o ISS, municipal. Com a reforma, esses entes continuam tendo autonomia para definir as duas alíquotas, mas ela terá de ser geral, valer para todos os itens, o que irá desestimular as renúncias para empresas e setores específicos.
Um governador, se optar por reduzir a alíquota de IBS para atender a uma montadora, por exemplo, irá, por tabela, atender todos os outros produtos e serviços ofertados no Estado. A decisão é muito mais complexa.
Como explicou esta semana o secretário Extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, haverá um único formulário eletrônico de preenchimento do imposto. Com isso, as empresas poderão reduzir custos e serão mais rápidas para zerar obrigações com o Fisco. Vão ser mais eficientes, em uma ponta, e reduzirão gastos com contadores, advogados e em disputas nos tribunais, na outra.
A reforma pretende manter a carga tributária neutra em relação aos padrões atuais. Mas como a tendência é pela diminuição da sonegação, já que o pagamento de impostos na cadeia vai gerar crédito tributários na etapa seguinte, a base de contribuintes pode aumentar. O efeito seria uma carga mais leve, distribuída por mais brasileiros pagantes.
O processo de implementação da reforma será lento, e só irá acabar em 2033. Haverá percalços, dúvidas, ajustes e disputas nos tribunais até que as regras estejam pacificadas. Mas o horizonte para o País na próxima década melhora bastante no campo tributário, um dos nossos principais gargalos.
A luta agora é para que a proposta de regulamentação reforma não seja muito desidratada no Congresso. De toda forma, no pior cenário, o novo modelo vencerá o nosso regime atual por W.O. (O Estado de S. Paulo Online/Alvaro Gribel)