‘Atraso’ na redução de juro nos EUA impacta investimento e Selic no Brasil

O Estado de S. Paulo

 

A economia global pode ter um segundo semestre mais difícil do que o esperado. Cresceu a possibilidade de o corte de juros nos Estados Unidos começar apenas no segundo semestre, contrariando projeções do mercado financeiro.

 

Entre a maioria dos investidores, o cenário principal ainda é de uma redução das taxas de juros – atualmente, entre 5,25% e 5,5% ao ano – pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) na reunião de junho. A probabilidade, porém, perdeu força nas últimas semanas. Hoje, a chance de corte no encontro de daqui a dois meses é de cerca de 60%. Em março, era de 70%.

 

Confirmada a perspectiva do mercado até agora para o Fed, a reunião de junho pode ter o primeiro corte de 0,25 ponto porcentual de um total de três quedas projetadas. Mas o que tem feito parte do mercado acreditar numa postergação do início das reduções tem relação com o fato de a economia dos Estados Unidos ainda mostrar força, com um crescimento econômico robusto e um mercado de trabalho aquecido, o que dificulta a missão do BC americano de levar a inflação para a meta de 2%.

 

“A inflação não está na meta. Se o Fed cortar os juros muito cedo, e a inflação começar a divergir (da meta) em vez de convergir, o banco central dos EUA vai ter mais trabalho para depois fazer a inflação convergir de novo”, afirma Luís Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners.

 

Impacto

 

Uma eventual mudança na rota da política de juros nos Estados Unidos vai repercutir em todos os países. Taxas americanas mais altas drenam recursos de economias emergentes e mais voláteis, como é o caso da brasileira, e representam um dólar robusto – neste ano, até ontem, o dólar acumulava alta de 3,2%, em R$ 5,00.

 

“A probabilidade de o juro não começar a cair no meio do ano é muito significativa”, afirma José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central e chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

 

“À medida que as condições financeiras ficam mais apertadas nos Estados Unidos, é inevitável que o Banco Central no Brasil também tenha uma cautela ainda maior na condução desse ciclo de baixa.”

 

Segundo ele, os agentes econômicos e o meio político “podem se surpreender com a extensão desse ciclo de baixa”. “Tem uma chance boa de ser interrompido antes do que a pesquisa Focus, por exemplo, está indicando”, diz Senna.

 

Divulgada semanalmente pelo Banco Central, a pesquisa Focus mostra que a projeção dos analistas consultados é de que a taxa básica de juros brasileira (Selic) encerre este ano em 9%, recuando para 8,5% em 2025. “Acho um juro no nível de 9%, talvez, muito pouco provável”, diz Senna. A taxa atual do Brasil é de 10,75%. (O Estado de S. Paulo/Luiz Gilheme Gerbelli)