O Estado de S. Paulo
Mais do que reafirmar uma preocupante tendência de declínio observada há quase três décadas, a perda, pela indústria brasileira, de mais uma posição no ranking mundial em 2021 mostra a urgência de respostas do País. É preciso criar as condições para a recuperação da competitividade do setor manufatureiro e a retomada de seu papel essencial na modernização e no crescimento da economia. É desolador, no entanto, que, em plena campanha eleitoral, temas essenciais para o crescimento sustentado, que exige a restauração do papel da indústria, sejam ignorados pelos candidatos que disputam o segundo turno da eleição presidencial. O Brasil real não é alcançado pelos holofotes de seus marqueteiros nem parece ocupar espaço entre suas preocupações.
O País tem demonstrado baixa capacidade de resistência ao declínio da indústria, tanto na comparação com a de outros países como em relação a outros setores da economia. Em seu relatório Desempenho da Indústria no Mundo, baseado em dados da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que a participação da produção industrial brasileira na produção mundial diminuiu de 1,31% do total em 2020 para 1,28% em 2021. Por isso, o Brasil foi ultrapassado pela Turquia e agora ocupa a 15.ª posição entre os maiores produtores industriais do mundo.
O Brasil vem perdendo posições na indústria mundial pelo menos desde meados da década de 1990. Em 1996, por exemplo, a participação da produção industrial brasileira na produção mundial alcançava 2,55% do total, o dobro da registrada no ano passado.
A despeito do declínio, o Brasil conseguiu manter sua posição entre as 10 maiores economias industriais até 2014. Foi o começo de um período de dificuldades para a indústria brasileira e para toda a economia nacional que, com oscilações e algumas características novas, persiste até hoje. A recessão de 2014 a 2016 fez o Brasil perder posições para outros países, como México e Indonésia. A persistência da crise fez o Brasil continuar a perder posições, desta vez para Taiwan e Rússia.
Quanto às exportações, a participação do Brasil até cresceu entre 2020 e 2021, de 0,77% para 0,81% do total, mas outros países que estavam atrás na classificação tiveram desempenho melhor. Por isso, o Brasil caiu do 30.º para o 31.º lugar entre os maiores exportadores.
Os números mostram uma persistente e dramática perda de competitividade da indústria brasileira. “Precisamos de uma estratégia nacional de comércio exterior, que encare os velhos desafios de competitividade, como a burocracia e os resíduos tributários nas exportações, e, ao mesmo tempo, amplie e aprimore nossas redes de acordos comerciais”, avalia a gerente de Comércio e Integração Internacional da CNI, Constanza Negri.
Em suas palavras estão sintetizados alguns velhos e alguns recentes problemas que afetam as exportações e a competitividade do produto brasileiro. Burocracia excessiva, tributação ainda pesada, falta de acordos comerciais são, de fato, grandes obstáculos ao aumento das exportações de bens industriais. O total desprezo do atual governo pelas negociações internacionais piorou o quadro.
Mas a perda da competitividade e a redução da presença da indústria brasileira no cenário mundial retratam também outros problemas graves cujo enfrentamento exige, em primeiro lugar, políticas públicas adequadas. A transformação por que passa a indústria em todo o mundo exige cada vez mais investimentos em inovação, o que depende de ambiente e estímulos adequados. Exige também mão de obra cada vez mais criativa e cada vez mais preparada para o desempenho de múltiplas funções, cada vez mais complexas.
A pandemia atrasou a formação dos jovens. É necessário recuperá-la para que não se condene o futuro de milhões de brasileiros. A perda de competitividade da economia brasileira acrescenta novos desafios ao próximo governo, e seria bom que os candidatos a presidente ao menos se dessem conta disso. (O Estado de S. Paulo)