O Estado de S. Paulo
A fabricante de carros de luxo Porsche driblou o mau humor generalizado no mercado de ações mundial e conseguiu emplacar na noite de ontem a maior oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) desde 2011 na Europa e uma das maiores do mundo este ano. Com captação de 9,4 bilhões de euros e avaliada em 75 bilhões de euros, a montadora atraiu tanto interesse que metade dos investidores que reservou ações não conseguiu comprar os papéis, isso na mesma semana em que a libra despencou em Londres.
Nesta quinta-feira, 29, dia de queda da Bolsa de Frankfurt, o papel da Porsche, montadora que pertence à gigante alemã Volkswagen, chegou a subir mais de 3%, para fechar estável.
O mercado de IPOs passa por uma escassez de ofertas este ano, no Brasil e no mundo, em decorrência do aumento dos juros pelos bancos centrais para conter a disparada da inflação e das incertezas geopolíticas com a guerra na Ucrânia em seu oitavo mês. Na Europa e nos Estados Unidos, maior palco de IPOs do mundo, este vem sendo o pior ano para captações via ações desde a crise financeira global de 2008.
No mundo, houve um total de 992 IPOs neste ano, que levantaram US$ 146 bilhões, uma queda de 57% frente ao montante financeiro registrado no mesmo período de 2021, conforme relatório recém-divulgado pela consultoria EY. Enquanto a atividade de IPOs atingiu seu nível mais baixo em 20 anos nas Américas, a Ásia sediou cinco dos dez principais IPOs globais neste ano.
Mesmo nesse ambiente mais adverso, a Porsche conseguiu precificar o IPO no topo da faixa sinalizada aos investidores, com a ação saindo em 82,50 euros. “A Porsche terá um valor de mercado na faixa de 75 bilhões de euros após o seu IPO. Isso quase iguala o valor de mercado da Volkswagen de cerca de 83 bilhões de euros”, observa a Swissquote Research, em comentário a clientes. O maior IPO na Europa nos últimos anos foi da suíça Glencore, em 2011, que levantou US$ 10 bilhões.
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A oferta atraiu interesse de grandes investidores do mundo, como os fundos soberanos do Catar e da Noruega, segundo a imprensa internacional. Foi a segunda maior listagem da história da Alemanha, só perdendo para a Deutsche Telekom, em 1996. O IPO da Porsche foi coordenado por Bank of America, Citigroup, Goldman Sachs e JPMorgan.
A Swissquote Research destaca que a Porsche conseguiu emplacar seu IPO mesmo em meio a um mercado sem brilho para ofertas de ações, citando como justificativas para o interesse dos investidores o prêmio pago pela companhia, de 7,5% em relação ao preço preferencial do IPO, bem como sua estrutura de dívida.
Volkswagen vai pagar dividendo especial
Com o sucesso do IPO da Porsche, a Volkswagen anunciou o pagamento futuro de um dividendo especial de 49% de sua receita bruta. A recompensa aos acionistas é positiva, segundo a Morningstar, uma das grandes casas de análises dos Estados Unidos. Também é visto como positivo o destino do restante dos recursos do IPO, que serão aportados na transição para veículos elétricos a bateria, nos quais a empresa planeja investir mais de 50 bilhões de euros nos próximos cinco anos.
O momento do IPO e a atual estrutura de gestão da Volkswagen levantam preocupações, na visão da Morningstar. “As avaliações de mercado do setor automotivo foram atingidas pela possibilidade de recessão nos principais mercados, escassez de chips, guerra na Ucrânia, escassez de gás natural na Europa, custos mais altos de matérias-primas, preços mais altos de combustível e outras pressões inflacionárias de custos”, diz o analista sênior de ações da Morningstar, Richard Hilgert.
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Bem menor que a operação da Porsche, o maior IPO dos EUA também ocorreu neste mês. A Corebridge, subsidiária da AIG com foco em seguro de vida e previdência, arrecadou US$ 1,68 bilhão após ter adiado a operação em meio à volatilidade dos mercados. No mundo, o maior IPO este ano foi da LG Energy Solution, que levantou US$ 10,8 bilhões em janeiro.
Retomada de IPOs ainda não chegou
Apesar das captações da Porsche na Alemanha e da Corebridge nos EUA, especialistas não esperam uma retomada dos IPOs no curto prazo. A elevada volatilidade nos mercados por conta da subida de juros nas principais economias, em especial nos EUA, e a queda nos valores de mercado afastam eventuais interessados.
“A mudança dramática nas taxas quebrou o ciclo, e muitas empresas que planejavam abrir o capital recusaram as avaliações reduzidas e cancelaram IPOs pendentes”, diz o Goldman Sachs, em relatório a clientes.
O gigante de Wall Street afirma que o mercado de IPOs nos EUA “congelou” e vive um ambiente de “colapso”, sem sinais de reversão à frente. Jogam contra os níveis de confiança de empresários e consumidores fora os temores com o processo de aperto monetário no país, sob o risco de levar a maior economia no mundo à recessão, alerta. “Ainda é muito cedo para esperar um aumento significativo dos IPOs no curto prazo”, afirma o Goldman Sachs. (O Estado de S. Paulo/Altamiro Silva Junior e Aline Bronzati)