Mercado espera que Copom mantenha taxa de juros em 13,75%

O Estado de S. Paulo

 

No último dia 5, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou em evento que o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) avaliaria um novo aperto na taxa de juros. No dia seguinte, o diretor de Política Monetária da autarquia, Bruno Serra, acrescentou ser “inconsistente” o mercado projetar inflação acima do centro da meta em 2024 enquanto discute a queda dos juros em 2023. Ou seja, o recado era de que o banco não iria “baixar a guarda”. Mesmo assim, bancos e consultorias acreditam que o ciclo de alta da Selic, a taxa básica de juros, chegou ao fim na reunião de agosto.

 

Para 41 das 50 instituições financeiras ouvidas pelo Projeções Broadcast, a taxa deve ser mantida em 13,75% na reunião que começa hoje e termina amanhã, movimento que encerraria o mais longo ciclo de aperto monetário da história. No entanto, economistas reconhecem que aumentou o risco de ajuste residual de 0,25 ponto.

 

Para Luís Otávio de Souza Leal, economista-chefe do Banco Alfa, o cenário é de manutenção dos juros em 13,75%, em uma decisão que deve ser acompanhada de um discurso duro por parte do BC. O economista reconhece que, diante do aumento das projeções de inflação para 2024, o Copom pode optar por um aperto residual como forma de sinalizar ao mercado o seu comprometimento com a meta.

 

“O único motivo pelo qual eu vejo o risco de um aumento para 14% é para reforçar não só com palavras, mas com ações, esse discurso ‘hawkish’ (inclinação por taxas de juros mais altas para conter a inflação). Em termos de convergência da inflação, não vejo esse 0,25 ponto de diferença ter um impacto relevante, mas poderia ser uma forma de fazer o mercado reverter essa expectativa de 2024”, diz.

 

Cenário dividido

 

O economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria Integrada, espera alta da Selic para 14% em setembro, mas reconhece um “cenário dividido” na reunião. “A possibilidade de encerrar o ciclo em 13,75% está em jogo, até porque os sinais desde o último Copom não foram claros”, diz.

 

O economista-chefe da Trafalgar Investimentos, Guilherme Loureiro, afirma que o mais provável é a manutenção da Selic em 13,75%, embora reconheça o risco de um aumento residual de 0,25 ponto. “Do ponto de vista prático, muda pouco, porque a gente está na boca de encerrar o ciclo”, afirma.

 

Loureiro pondera que a redução das projeções para a inflação de 2022 e 2023 no boletim Focus pode comprar um grau de conforto para o BC. Na mesma linha, a perspectiva de melhora do fiscal no curto prazo, com superávit primário este ano, sugeriria um cenário mais tranquilo.

 

O nível de inadimplência nas carteiras dos bancos está sendo acompanhado de perto pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), especialmente com a revisão das projeções do mercado de corte da taxa Selic neste segundo semestre, além do aumento da exposição dos poupadores às instituições menores.

 

O diretor executivo do FGC, Daniel Lima, afirmou que o volume de depósitos entre as instituições de menor porte – classificadas pelo Banco Central como S2, S3, S4 e S5 – dobrou em pouco mais de dois anos, velocidade nunca vista anteriormente. Segundo ele, de R$ 1,86 trilhão em depósitos que compõe o limite de cobertura do fundo, R$ 320 bilhões são de instituições S2, S3, S4 e S5. Esse risco era de cerca de R$ 150 bilhões antes da pandemia, diz Lima.

 

Criado em 1995, o fundo tem a função e ressarcir depositantes e investidores em caso de intervenção e liquidação extrajudicial de uma instituição financeira, respeitando determinados

 

“É um período em que temos de estar de olho e para ser acompanhado de perto”, Daniel Lima, Diretor executivo do Fundo Garantidor de Crédito.

 

“É um aumento que precisa ser observado. O risco está crescendo e tem mais depósitos no mercado em instituições não S1”, disse Lima. Ele ponderou que esse crescimento fora do S1 é natural, como reflexo da popularização de corretoras e distribuidoras de valores mobiliários e da agenda de descentralização do mercado. “Antes, quem queria captar tinha de gastar muita sola de sapato, agora está mais fácil”, lembrou.

 

O FGC começou a publicar mensalmente o detalhamento da exposição de sua cobertura entre as instituições financeiras S1 (de porte igual ou superior a 10% do PIB) e as S2 (abaixo desse patamar, mas superior a 1% do PIB). Lima disse que o fundo sempre teve essa visão segmentada de sua exposição, mas que resolveu torná-la pública para aumentar a transparência e dar ferramentas de análise de risco ao mercado.

 

Segundo ele, a inadimplência é uma questão que tem permeado as preocupações de todo o sistema financeiro, que, por sua vez, já vem se preparando para a nova realidade de pelo menos um ano e meio de inflação mais alta e de taxa de juro em patamar mais elevado. “Temos conversado bastante com as associadas, não enxergamos nenhum risco grande, mas é um período em que temos de estar de olho e para ser acompanhado de perto”, afirmou.

 

Medidas

 

Lima observou ainda que, com a inadimplência no radar, os bancos anteciparam a gestão de suas carteiras, com mudanças nas linhas de concessão para àquelas mais seguras, renegociações de contratos e tomada de mais garantias, especialmente de empresas. “Mas as instituições terão de trabalhar muito ainda.”

 

De olho na sua própria liquidez, Lima disse que o FGC tem reciclado seu patrimônio, tendo vendido metade das matrículas da carteira de imóveis do fundo e carteiras de crédito, entre 2020 e 2021. O executivo afirmou que o FGC não abre esses números detalhadamente em seu balanço, inclusive para preservar a estabilidade do sistema e não gerar especulações. (O Estado de S. Paulo/Cícero Cotrim, Marianna Gualter e Ítalo Bertão Filho)