Conselho tenta blindar Petrobras de futuras ingerências políticas

O Estado de S. Paulo

 

O conselho de administração da Petrobras aprovou ontem uma proposta que garante ao colegiado maior poder para supervisionar a política de preços da estatal. A decisão é tomada em um momento em que o governo tenta emplacar novos conselheiros, mais alinhados com o presidente da República, Jair Bolsonaro. Segundo um executivo com assento no alto comando da empresa, a medida busca ampliar a blindagem contra futuras ingerências políticas.

 

Apesar de a medida dar mais voz ao conselho no tema, a decisão final sobre a necessidade de reajustes permanece com a diretoria executiva. Um dos objetivos da proposta era dar visibilidade e formalizar práticas, que antes eram adotadas informalmente pela diretoria, como apresentação de relatórios trimestrais sobre eventuais reajustes nos combustíveis.

 

Uma fonte na empresa explica que a Diretriz de Formação de Preços de Derivados e Gás Natural no Mercado Interno, que acaba de ser aprovada, estará no site da empresa e, com isso, o público externo passará a ter acesso aos procedimentos que eram informais.

 

Com a mudança, o conselho poderá a partir de agora impedir uma eventual alteração na política de preços e receberá trimestralmente informações sobre os reajustes praticados pela companhia para diesel, gasolina e gás de cozinha. O documento destaca que a política de preços da companhia deve ter como principais balizadores a competitividade e o equilíbrio de preços com os mercados nacional e internacional, o chamado preço de paridade de importação (PPI).

 

“A diretriz coloca uma lupa sobre o cumprimento da política

 

de preços da Petrobras, mas não mexe nessa política, que continua focada no resultado econômico. Ela (diretriz) reforça esse recado para a diretoria”, avaliou o especialista em governança Renato Chaves. Segundo ele, por ser um tema sensível, a política de preços precisava formalizar esse acompanhamento.

 

Ele observa, no entanto, que a redação da diretriz levanta algumas questões. Entre as determinações, o texto explica que a diretoria deverá executar a política de preços observando gerar valor para a companhia, “bem como a preservação de um ambiente competitivo salutar, nos termos da legislação em vigor”. Para Chaves, o termo “salutar” gera dúvidas, porque não fica claro o que seria um ambiente salutar. “Se ocorrer greve de caminhões, o ambiente deixa de ser salutar?”, questionou.

 

Caminhoneiros

 

Um dos líderes dos caminhoneiros, o presidente licenciado da Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava), Wallace Landim, mais conhecido como “Chorão”, ironizou a mudança. “A reunião do conselho da Petrobras não muda em nada a política de preços da companhia, pelo contrário, só reforça que a diretoria executiva cumpra o PPI, o mercado está contente, as ações subiram”, disse ele, em nota.

 

A decisão dos reajustes, segundo a Petrobras, continua sob a responsabilidade de três diretores – o presidente, o diretor financeiro e o diretor comercial –, levando em conta o PPI, implantado na Petrobras em 2016, após a Operação Lava Jato, para blindar a estatal de ingerências governamentais. Por essa política, os reajustes levam em conta o preço do petróleo no mercado internacional, o valor do dólar em relação ao real e os custos de importação (frete, portos).

 

O presidente Jair Bolsonaro tem atacado a política de preços e deixado claro, em várias declarações públicas, que a estatal vai voltar a “ter uma função social”, o que para ele significa reduzir o preço dos combustíveis. No dia 19 de julho, a estatal, que está no quarto presidente da gestão Bolsonaro, anunciou uma queda de 4,9% no preço da gasolina. Segundo fontes, apesar de já ter promovido um corte de preços nas primeiras semanas de trabalho, Caio Paes de Andrade tem sido pressionado no comando da estatal para baixar também o preço do diesel.

 

A queda da gasolina foi uma decisão técnica, segundo fontes no comando da Petrobras, que aproveitou uma janela de oportunidade quando o preço do petróleo cedeu abaixo dos US$ 100 o barril (ontem, fechou cotado a US$ 101,67). (O Estado de S. Paulo/Denise Luna)