Cenário de inflação e juros altos é barreira para o investidor em 2022

O Estado de S. Paulo

 

Enquanto a economia global deve estar mais aquecida em 2022, com a retomada do consumo de serviços como restaurantes e viagens, a previsão para o cenário brasileiro no mesmo período é de desaceleração. É o que aponta o estudo Investment Outlook 2022, do Credit Suisse, que levantou as principais tendências da economia global para o próximo ano. A pesquisa foi finalizada no início de novembro, antes da descoberta da variante Ômicron do coronavírus, que pode influenciar as perspectivas para o próximo ano.

 

Entre os motivos para a expectativa negativa em relação ao Brasil em 2022 estão o aumento da taxa básica de juros (a Selic), o aperto das condições financeiras e o menor poder aquisitivo da população devido à alta da inflação. “Esperamos que a taxa de política monetária (Selic) atinja 11,5% em 2022, ante 2% no início de 2021, um nível de juros muito restritivo, mas necessário para trazer a inflação de volta à meta”, afirma Philipp Lisibach, head de Global Investment Strategy do Credit Suisse.

 

O banco prevê ainda que a inflação ao consumidor fique em 10,2% em 2021, valor próximo ao divulgado pelo Boletim Focus do Banco Central (BC) no último dia 29, que indicou que a estimativa do mercado para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), em sua 34.ª semana seguida de alta, chegou a 10,15%.

 

Para 2022, o cálculo do Credit Suisse aponta para 6%, o que representaria dois anos consecutivos de inflação acima da faixa superior da meta do BC, em razão da forte depreciação do real, alta indexação de preços e inflação global.

 

Em relação ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), a projeção da instituição financeira é de crescimento de 4,8% em 2021, e retração de 0,5% para o ano que vem.

 

Economista e gestor de fundos da CTM Investimentos, Daniel Alberini lembra que a questão inflacionária é um problema mundial, fruto de um grande desequilíbrio entre oferta e demanda causado pela covid-19, bem como pelos estímulos fiscais para enfrentar a crise sanitária. “O maior impacto, que pode realmente trazer alguma revisão relevante para o crescimento do ano que vem no Brasil fica por conta da rápida movimentação da curva de juros e a própria alta da Selic”, afirma.

 

A Selic vem numa crescente desde março deste ano e foi fixada a 7,75% ao ano na última reunião do Copom – e deve subir ainda mais nos próximos meses.

 

Contexro global

 

Na conjuntura mundial, a inflação deve diminuir, mas pode ficar acima dos níveis pré-pandemia. Segundo o Credit Suisse, os aumentos de preços que se seguiram aos bloqueios não serão incluídos nos cálculos de inflação e os problemas da cadeia de abastecimento também deverão diminuir, reduzindo a pressão inflacionária.

 

Sobre a quarta onda de covid-19 que avança especialmente na Europa, Philipp Lisibach afirma que se os casos da doença continuarem aumentando, a atividade econômica pode ser prejudicada, mas não é esperada uma retração nas economias desenvolvidas.

 

“Restrições de circulação são politicamente impopulares tanto para as populações vacinadas quanto para as não vacinadas”, afirma.

 

Lisibach acrescenta que, caso as restrições realmente precisem ser intensificadas, a zona do euro até pode sofrer, mas o avanço das campanhas de vacinação e uma maior disponibilidade de medicamentos antivirais devem manter a previsão delineada no Investment Outlook 2022. Ele também pontua que a volatilidade do mercado deve persistir até que mais fatos sobre a variante Ômicron sejam conhecidos.

 

Em comparação com o restante do mundo, o Brasil tem um ponto de atenção extra: a instabilidade política, potencializada pela proximidade das eleições presidenciais, e a falta de avanço na agenda de consolidação fiscal.

 

O Credit Suisse pontua que o debate sobre as reformas fiscais necessárias para a estabilização econômica só deve ser retomado após a disputa eleitoral. O banco considera como mais urgentes a reforma administrativa e a flexibilização do orçamento.

 

Já para Daniel Alberini, da CTM Investimentos, um candidato que apoie políticas econômicas mais “exóticas” pode provocar maior volatilidade no câmbio e nos juros, o que trará reflexo para a economia.

 

“Há também de se destacar que surpresas positivas no processo eleitoral poderiam auxiliar a atividade econômica em função da confiança futura, mas atualmente só assistimos a notícias ruins”, diz. (O Estado de S. Paulo/Murilo Basso)