O Estado de S. Paulo
Marcas globais, como Coca-Cola, Microsoft e Volkswagen, iniciaram ontem nos EUA e em vários países, entre eles o Brasil, a suspensão de anúncios no Facebook em protesto pela propagação de mensagens de ódio racial na rede social.
O boicote de anunciantes às plataformas do Facebook começou ontem nos Estados Unidos, mas não se restringe apenas à maior economia do mundo. Gigantes globais estenderam a suspensão da veiculação de anúncios no Facebook e no Instagram a outros países, incluindo o Brasil – entre elas Coca-Cola, Heineken, Microsoft, Beiersdorf e Volkswagen. Marcas brasileiras, por enquanto, monitoram a situação e começam a se movimentar para entender se vale ou não a pena fazer parte desse movimento.
Incentivado pela organização não governamental Stop Hate for Profit, o protesto se concentra principalmente nas mensagens de ódio racial propagadas na rede social, mas também abrange questionamentos sobre como a empresa lida com informações de origem duvidosa ou notícias falsas. O boicote começou a se desenhar nas últimas semanas e conseguiu angariar mais de 400 marcas, entre negócios de diversos portes. A suspensão começou ontem e deve se estender por julho.
Apesar de o movimento ter se originado nos Estados Unidos, boa parte das multinacionais que se juntaram ao boicote ao Facebook decidiram estender a decisão para outros mercados, incluindo o Brasil.
A reportagem do Estadão entrou em contato com diferentes companhias globais ontem. Entre as que responderam à reportagem, cinco também bloquearam anúncios no Brasil – Microsoft, Volkswagen, CocaCola, Beiersdorf (dona da Nivea) e Heineken –, enquanto a Unilever restringiu a decisão ao território americano.
Entre as marcas brasileiras, a posição ainda é de “esperar para ver”. Algumas empresas consultadas disseram que o boicote se restringe a problemas concentrados nos Estados Unidos, ainda que a disseminação de discurso de ódio associado a notícias falsas em redes sociais no Brasil seja até alvo de uma investigação pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Entre as empresas que disseram acompanhar a situação estão o Magazine Luiza, o Itaú e a Natura. A fabricante de cosméticos, apurou o Estadão, vai realizar nos próximos dias reunião de alto escalão para tomar uma decisão relacionada à veiculação de anúncios no Facebook. A Vivo e a Via Varejo não comentaram o caso. As demais empresas procuradas – Bradesco, Grupo Boticário e Renner – não responderam aos contatos.
Segundo fontes do mercado publicitário, ainda que o movimento dos grandes anunciantes seja importante para chamar a atenção para a falta de curadoria de conteúdo do Facebook, a maior parte da arrecadação das plataformas está concentrada em pequenos negócios. A estimativa é que cerca de 75% dos anúncios online sejam feitos por empresas de pequeno e médio porte.
Embora o Facebook tenha ferramentas para evitar que anúncios sejam direcionados para certos temas, o modelo atual não consegue garantir de que o cliente vá ficar 100% livre de se associar a conteúdo indesejáveis. De acordo com Márcio Jorge, sócio e diretor de inteligência da Zahg, empresa especializada em publicidade digital, os algoritmos estão treinados para eliminar conteúdos de cunho sexual ou violento, por exemplo, mas não para analisar o detalhe dos posts para detectar fake news. “As plataformas não têm uma solução construída para enfrentar esse problema”, explica Jorge.
Justificativa
Ontem, o Facebook se pronunciou por meio de um artigo escrito por Nick Clegg, vice-presidente de assuntos globais e comunicações, na revista AdAge. O executivo afirmou que eliminar completamente discursos de ódio na plataforma é como “encontrar uma agulha em um palheiro” devido ao volume de conteúdo postado. “Tolerância zero não significa zero incidência.”
Ele defendeu práticas do Facebook, como a contratação de profissionais dedicados à segurança dos serviços – seriam 35 mil pessoas. Disse também que a empresa investe bilhões na área, incluindo o desenvolvimento de ferramentas de inteligência artificial.
“As plataformas não têm solução construída para enfrentar esse problema (dos conteúdos falsos ou discursos de ódio)”, Márcio Jorge, sócio e diretor da empresa de publicidade digital ZAHG. (O Estado de S. Paulo/Fernando Scheller)