Coronavírus e retomada do crescimento

O Estado de S. Paulo

 

Além de sofrimento e angústia, a propagação da covid-19 acarretou a difusão de uma gigantesca e imponderável crise econômica. De início, a economia mundial sentiu o impacto da forte redução da produção na China, consequência da epidemia em seu território. Posteriormente, a constatação de uma pandemia fez com que amplas restrições fossem impostas à circulação, ao consumo e à produção na Ásia, na Europa e nas Américas. Desarticularam-se as cadeias produtivas e atividades econômicas em escala mundial. É claro que o papel crescente da China no comércio global, nas cadeias produtivas e de suprimentos e viagens tornou o impacto inevitável e global.

 

Se as perspectivas de crescimento econômico mundial pareciam animadoras, repentinamente se tornaram sombrias. Surtos subsequentes se espalharam pelo mundo, gerando frustração no crescimento de outras economias em diferentes escalas. Países altamente dependentes das cadeias produtivas do turismo e de serviços, ou indústrias globalizadas nos seus suprimentos de componentes e insumos, de uma hora para outra tiveram essas atividades postergadas ou paralisadas. As perspectivas de crescimento ainda são incertas. Se os picos da pandemia forem moderados e contidos, a redução do crescimento global será menor que o inicialmente previsto. Há o risco, porém, de a difusão do coronavírus ser mais duradoura e intensiva, o que enfraqueceria as perspectivas mais otimistas.

 

É claro que ações governamentais proativas e bem coordenadas poderão dar suporte à recuperação econômica mais ampla. Neutralizados os efeitos do vírus, como é esperado, haverá forte impacto na retomada da confiança nas políticas públicas e, consequentemente, nos investimentos, ambiente de negócios e geração de oportunidades de emprego. De todo modo, as perspectivas de crescimento para China, Europa e EUA foram muito reduzidas, com cautelosa previsão de retomada gradual da produção para níveis projetados antes do surto.

 

Se a pandemia teve impacto significativo sobre indústria, aviação civil, turismo e negócios, expressivos também foram os prejuízos causados às atividades de educação, entretenimento e lazer. Os sistemas educacionais foram afetados, levando ao fechamento generalizado de escolas e universidades. Governos de 73 países implementaram, de imediato, o fechamento parcial ou total de escolas, o que afetou 420 milhões de alunos no mundo. Segundo dados da Unesco, 1 em cada 5 estudantes ficou fora da escola. Acrescente-se, em vários graus, o fechamento de cinemas, teatros e restaurantes, bem como o cancelamento de grandes festivais e shows. Curiosamente, o aumento expressivo do streaming e do estoque de filmes da Netflix evidenciou a conscientização geral da necessidade de permanência nos domicílios.

 

Este panorama geral da gravidade da pandemia mostra que, apesar da histórica e renitente tradição de isolamento e resistência à inserção no mundo globalizado, o Brasil não é uma ilha e tem fortes conexões mundiais em viagens internacionais, como também em grande multiplicidade de cadeias produtivas. Infelizmente, o impacto da crise gerada pelo coronavírus

 

Sem picuinhas e provocações, teremos condições de superar este momento difícil para todos atinge o País no momento em que já se constatavam sinais incipientes, mas muito positivos, de retomada do crescimento.

 

A reação das autoridades responsáveis pela saúde pública brasileira foi, de modo geral, rápida e eficiente. Para um país com 210 milhões de habitantes (85% em áreas urbanas), as ações têm sido eficazes em termos de informação e conscientização. O Brasil tem, afinal, grandes infectologistas e sanitaristas em centros de excelência. Que os economistas sigam os mesmos padrões dos profissionais de saúde e convirjam para a rápida retomada do crescimento e do emprego. Sem as picuinhas, provocações e descaso com a gravidade do momento, se “esquerda” e “direita” (propositalmente entre aspas) tiverem a grandeza de manter o foco no bem-estar e conceder uma trégua aos brasileiros, teremos condições de superar este momento difícil para todos. (O Estado de S. Paulo/Josef Barat, economista, consultor de entidades públicas e privadas, é coordenador do núcleo de estudos urbanos da ACSP)