O Estado de S. Paulo
O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Carlos Moraes, afirmou ontem que existe o risco de as montadoras paralisarem a produção no fim de março ou em abril por causa dos efeitos econômicos da epidemia do coronavírus, que, no caso do setor automotivo, afeta principalmente a importação de autopeças da China.
Apesar do alerta, o executivo buscou passar tranquilidade. Ressaltou que os fornecedores internacionais do setor estão espalhados pelo mundo e não concentrados na China, que representa 13% das importações de autopeças. Afirmou também que ainda não há nenhum problema e que as empresas têm alternativas para driblar possíveis efeitos, como importar produtos por via aérea ou calibrar a velocidade das linhas de produção.
“O risco existe, mas temos como fazer a melhor gestão disso”, afirmou o presidente da Anfavea em coletiva de imprensa, que apresentou os resultados do setor em fevereiro.
“Alguma montadora pode ter um risco maior do que outra, mas se alguma delas tiver de parar, a compensação pode ser feita no mês seguinte, dá para fazer o ajuste”, disse o executivo, que dedicou uma parte da coletiva para falar dos efeitos da epidemia.
Segundo Moraes, os fornecedores de autopeças da China relatam que a produção tem voltado ao normal “gradativamente”.
Medidas
Mesmo que tenha evitado alarmismos, o presidente da Anfavea lembrou que outros países têm adotado medidas para tentar neutralizar ou minimizar os prejuízos econômicos causados pela epidemia, principalmente, com reduções de juros, e ressaltou que nada ainda foi feito no Brasil, apesar da sinalização do Banco Central (BC) de que pode haver um novo corte da Selic, taxa básica de juros, na próxima reunião da diretoria da instituição, ainda neste mês.
“Ainda é cedo para falar em impactos do coronavírus na economia do Brasil, mas não é melhor fazer algo para a bicicleta continuar andando em vez de esperar ela parar? É a reflexão que nós deixamos, se não é o caso de o Brasil tentar alguma coisa”, afirmou o presidente da Anfavea, que reconheceu que o País tem problemas fiscais que limitam alguma ação.
Em seguida, Moraes abordou o tema do cenário econômico e lamentou que a redução histórica da taxa Selic não tenha chegado, na mesma proporção, aos juros praticados no mercado de veículos, mesmo com a baixa inadimplência. “Não adianta o BC reduzir a Selic para 3,5% ou 3,75% se os bancos não reduzem os juros também, alguma coisa não está funcionando”, disse.
O executivo fez uma sugestão para estimular os financiamentos de veículos: reduzir a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que, pelas contas dele, afeta mais o mercado de veículos do que o de outros. “É um imposto regulatório e não arrecadatório’, argumentou o executivo, em relação às dificuldades fiscais do governo. “Talvez seja necessária uma medida emergencial para reativar a economia”, afirmou.
Moraes também lamentou a volatilidade, em função do nervosismo nos mercados causado pela epidemia e pela instabilidade política, que eleva a cotação do dólar e afeta a confiança das pessoas para consumir e investir. “Precisamos de um pacto pela estabilidade”, disse. “Precisamos de mais Brasil e menos Brasília, de menos barulho e mais atenção à questão do crescimento econômico”, afirmou.
Dólar
A Anfavea procurou demonstrar que a alta do dólar afeta o setor, em função do custo de importação de peças. Em estimativa apresentada pela associação, o aumento de R$ 0,60 na moeda americana, de R$ 4 para R$ 4,60, representa, em média, um impacto de R$ 2,6 mil no custo de produção de um veículo.
Para chegar a esse número, a Anfavea considerou o total importado em autopeças em 2019, de US$ 13 bilhões, extrapolou o aumento da cotação do dólar sobre esse valor e dividiu pela projeção de vendas para 2020, de 3,05 milhões de unidades.
O dólar, por sua vez, não tem ajudado o setor nas exportações, uma vez que o principal destino, a Argentina, está em crise. “Não adianta o dólar subir se o nosso maior comprador não está bem”, afirmou o executivo. “Não há o que comemorar do ponto de vista de exportações”. (O Estado de S. Paulo/André Ítalo Rocha)