O Estado de S. Paulo/The New York Times
Estamos acrescentando mais uma à lista das coisas “inteligentes” que acabamos conhecendo nos últimos anos, o pneu inteligente. Por mais de um século, os pneus foram apenas borracha em forma de rosquinha. Nos últimos anos, os pneus acrescentaram uma vantagem, chamada talão, que os mantém preso ao aro da roda.
Mas os pneus convencionais não deixam de ter defeitos. Praticamente sem nenhum aviso para o motorista, furos, rasgos, derrapadas na água ou no gelo, perda de pressão, um pneu que murcha na faixa da esquerda de uma ponte atulhada de veículos, são coisas que podem acontecer a todos. Nos horários de pico, é claro.
Eles são tudo menos inteligentes. Surge então o Pirelli Cyber Tire, um componente de alta tecnologia recheado de sensores avançados capazes de transmitir informações via rádio e avisos a um receptor eletrônico a bordo do automóvel. Se o carro derrapa em uma poça, o pneu sabe. Se a tração está indo embora, o pneu sabe. A informação pode alertar o motorista ou, em alguns casos, “dizer” para a unidade de controle do veículo que deve ajustar a velocidade do motor, o controle da tração ou outras coisas.
Os dispositivos são capazes de “conversar” com uma rede sem fios 5G, permitindo que eles se comuniquem com os motoristas em outros veículos equipados com receptores, ou, por exemplo, uma infra-estrutura sem fios em uma pista de corrida. E se não houver nenhum motorista no carro?
“O nosso sistema acrescentaria a dimensão ‘do toque’ ao visual na direção autônoma,” disse Corrado Rocca, diretor de pesquisa e desenvolvimento do projeto do pneu inteligente da Pirelli. “Por exemplo, você pode imaginar que um automóvel está recebendo informações da estrada alertando para evitar um obstáculo ou um pedestre, dizendo: ’Reduza a velocidade’. Isto complementará os dados visuais fornecidos pelas câmeras – do lidar, sonar, radar. Este é o próximo passo”.
O sensor implantado, como Rocca o define, tem o formato de um ‘sombrero’ pequenino, mais ou menos do tamanho de uma moeda, que contém um processador, um rádio e eletrônica de comunicações. Usando o software, ele emite dados para a unidade de controle do motor do carro, ou módulo.
A Pirelli planeja oferecer aos proprietários de automóveis de performance nos Estados Unidos um dispositivo pós-venda montado a bordo que juntamente com os sensores dos pneus high-tech Trofeo da companhia podem comunicar informações sobre as condições do pneu, tempo da volta e posição na pista.
“Falamos também com várias montadoras sobre a possibilidade de integrar os sistemas, mas trata-se de um processo que poderá demorar de três a cinco anos”, disse Rocca. “Não se trata apenas de acrescentar a nossa tecnologia, mas de integrá-la a todo o software” nos carros.
A Pirelli testou recentemente um Audi equipado com Cyber Pneus. Rocca disse que ele transmitiu as informações para outro carro por meio de uma rede 5G a respeito das condições da estrada molhada. No momento, os planos para a instalação do pneu cibernético nos ambientes de corrida são vagos, embora aparentemente os carros da Fórmula 1 permitiriam o teste ideal. Nos próximos três anos, a Pirelli será a única fornecedora de pneus para todas as equipes da Fórmula 1 sob o controle da Fédération Internationale de l’Automobile, o organismo que governa a Fórmula 1.
Este arranjo não é algo inusitado: a Michelin fornece pneus a todas as equipes das séries de corridas de carros elétricos da Fórmula E, e a companhia trabalha com um sensor de pneu para estes carros que monitora a pressão do ar. “Há normas rigorosas na Fórmula 1, normas do jogo que estão fora dos nossos objetivos hoje”, disse Rocca. “Não estamos concentrados nisso por enquanto. Mas no futuro…” E não concluiu a frase.
A Pirelli busca outros avanços no desenvolvimento de pneus para veículos comuns, como questões de materiais, peso e ruído na estrada, e comportamento térmico. Um exemplo da tecnologia que está migrando para o seu uso na estrada é o simples talão que fixa a borracha ao aro.
“Há enorme estresse no aro e no pneu na Fórmula 1”, disse Mario Isola, diretor do programa de corridas da Pirelli. Embora os céticos afirmem que o conceito de transferência de tecnologia seja apenas uma manobra de marketing, as montadoras de carros como Ferrari e Mercedes-Benz, há muito enfatizam a relação entre os pitstops e o showroom.
Ganhar uma corrida é uma coisa; pôr essa tecnologia para funcionar nos carros de estrada – e vender muitos desses carros – é outra completamente diferente. “Posso dizer pra você que companhias como Mercedes, Renault, não estão na Fórmula 1 somente porque adoram o esporte”, disse Mario Andretti, que parou para conversar enquanto andava na faixa do pit stop em uma recente corrida de Fórmula 1 em Austin, Texas. Andretti ganhou o campeonato mundial de Fórmula 1 em 1978, bem como quatro títulos com carros da categoria Indy, inclusive o das 500 de Indianapolis.
“Ali dentro vai uma quantidade de desenvolvimento, por causa dos testes vigorosos que estão sendo feitos”, acrescentou. “E há uma urgência para todo este trabalho. A Fórmula 1 está na tecnologia de ponta, é o seu DNA, e é por isso que as montadoras gastam todo o dinheiro que podem para participar”. (O Estado de S. Paulo/The New York Times/Stephen Williams, tradução de Anna Capovilla)