Na posse no Uruguai, Lacalle Pou critica ideologias no Mercosul

O Estado de S. Paulo

 

Ao tomar posse ontem, o novo presidente do Uruguai, Luis Alberto Lacalle Pou, defendeu o fortalecimento do Mercosul e a flexibilização para que os membros fechem acordos bilaterais com outros países. Com o presidente Jair Bolsonaro presente na cerimônia, Lacalle Pou disse também que questões ideológicas não podem atrapalhar os interesses comuns do bloco.

 

Lacalle Pou prometeu trabalhar para concluir o acordo de livre-comércio do Mercosul com a União Europeia. “É preciso fortalecer o Mercosul e, ao mesmo tempo, flexibilizar o bloco para que os sócios possam firmar acordos bilaterais com outros países. Queremos terminar o processo de internalização do tratado firmado pelo Uruguai e pelo Mercosul com a União Europeia”, disse o presidente uruguaio.

 

O tratado, no entanto, enfrenta muita resistência na Europa. O presidente da França, Emmanuel Macron, vem sofrendo pressão do setor agrícola e retirou seu apoio ao acordo criticando a política ambiental de Bolsonaro. O Parlamento da Áustria e o da Valônia, região autônoma da Bélgica, também rejeitaram o texto.

 

Ontem, Lacalle Pou tentou se manter distante de questões ideológicas e defendeu o pragmatismo para que os países do bloco avancem seus interesses comuns. “Não deveria importar a orientação de cada um dos membros do Mercosul. Para afiançar nossos interesses comuns, devemos deixá-los de lado, reduzidos às questões particulares de cada país. Se deixarmos de lado essas questões ideológicas, o bloco se fortalecerá no cenário internacional.”

 

Ao sair do Parlamento uruguaio, onde ocorreu parte da cerimônia de posse, Bolsonaro, que estava acompanhado da mulher Michelle, acenou e fez uma reverência para o pequeno público. Houve vaias e aplausos de pessoas com bandeiras do Uruguai. O brasileiro é um dos seis chefes de Estado que participam da posse de Lacalle Pou.

 

O momento que marca a volta da centro-direita ao poder no Uruguai, após 15 anos de presidentes da Frente Ampla, de esquerda, é cercado de expectativas do governo brasileiro que espera ter um aliado em temas regionais. Do lado uruguaio, no entanto, a perspectiva de analistas é que Lacalle Pou adote posição mais pragmática. Ele buscará a aproximação comercial, mas quer distância das pautas ideológicas de Bolsonaro.

 

O posicionamento tem uma justificativa. Bolsonaro é mal visto pela população uruguaia e está mais à direita que Lacalle Pou. Associar-se ao brasileiro, portanto, traria prejuízos internos para a governabilidade do país. Embora conservador, o novo presidente do Uruguai defende algumas pautas sociais identificadas com a esquerda. Foi ele quem apresentou o primeiro projeto de legalização do cultivo para consumo pessoal de maconha na América Latina, em 2010.

 

Ele também propôs a união estável entre pessoas do mesmo sexo como alternativa ao casamento e até votou em favor de que as pessoas trans fossem reconhecidas pela identidade que escolheram – e não pela imposta no nascimento.

 

Essas posições pouco convencionais para um conservador foram decisivas para que Lacalle Pou vencesse o esquerdista Daniel Martínez, da Frente Ampla – ainda assim, a vitória foi apertada, por menos de 29 mil votos (pouco mais de 1%). Logo após vencer as eleições, ele disse que “não faria parte do clube de amigos com base em ideologia, nem de um lado, nem do outro”. (O Estado de S. Paulo/Jussara Soares)