Queda do PIB é culpa da má política

O Estado de S. Paulo

 

A atividade econômica voltou a cair no primeiro trimestre deste ano, à taxa de 0,2%, após oito trimestres de variação positiva do Produto Interno Bruto (PIB), relativamente aos respectivos trimestres anteriores, no período 2017-2018. E permanece fragilizada pela depressão, ainda não revertida, em que se afundou nos oito trimestres dos anos 2015 e 2016.

 

Fragilizada porque nesses dois anos (2015 e 2016) seu PIB teve duas fortes quedas anuais, totalizando 6,7%, enquanto os oito trimestres de aumento, no biênio 2017-2018, somaram apenas 2,1%. Longe de suficientes, portanto, para superar a enorme perda de 6,7% no biênio anterior.

 

Sobre o PIB menor no primeiro trimestre de 2019, o IBGE, que elabora as contas nacionais trimestrais, calcula também as variações do PIB do lado da oferta por setor e ramo de atividade, no primeiro caso, a agropecuária, a indústria e os serviços. E a demanda: o consumo das famílias, do governo, os investimentos, as exportações e as importações.

 

Quanto às causas do retrocesso, soube que fatores isolados atuaram, como a menor mineração em razão do desastre de Brumadinho e a contínua queda da indústria, agravada pelas menores exportações para a Argentina.

 

Contudo, o fator que mais vem atuando no negativo ou fraco desempenho do PIB desde o governo Dilma é a forte desconfiança quanto à péssima situação fiscal dos governos federal, estaduais e municipais, com destaque para o federal, o maior ente da economia.

 

Ficando neste nível de governo, ele aumenta rápida e continuamente sua dívida, o que gera o temor de dificuldades futuras na rolagem dela com credores, com eventual recurso à expansão monetária como saída para o serviço da dívida, um cenário com sérias implicações inflacionárias e cambiais, entre outras.

 

O que mais agrava as contas federais é o enorme déficit da Previdência Social, cujo papel foi realçado após a aprovação, em 2016, de teto anual para a expansão dos gastos federais. Em razão deste teto, os crescentes gastos previdenciários comprimiram outras despesas, como as de educação, saúde e investimentos públicos.

 

Os vários índices de confiança – sigo seis mensais da Fundação Getúlio Vargas, cobrindo a de empresários de vários setores e a dos consumidores – têm perfil comum e se deterioraram muito no governo Dilma. Ainda que não voltando a seus picos anteriores, mostraram boa recuperação em seguida, mas sofreram novo abalo, ainda que pequeno, na sequência da greve dos caminhoneiros em 2018. No fim desse ano, eleito Bolsonaro, estes índices recuperam essa perda e até subiram um pouco mais, por causa da esperança de que ele encararia decisivamente a questão fiscal e o mau estado geral da economia.

 

Já na campanha, Bolsonaro afirmou que nada entendia dela e delegou o assunto ao ministro Paulo Guedes, inclusive a reforma da Previdência Social (RPS). Mas esta necessita do exercício da boa política pelo presidente, no sentido de mostrar as virtudes da iniciativa e granjear apoio político de muitos parlamentares do Congresso Nacional, do qual depende a aprovação. Bolsonaro, com sua ojeriza ao que chama de velha política, vendo-a como um nefasto toma lá dá cá, não demonstra talento quanto à boa, que sem cair neste esquema exige muita conversa e dar aos apoiadores algum protagonismo no governo. Avesso a isso, o presidente opta por má política, gastando tempo e energia em questões não prioritárias, e comanda equipe em que grupos disputam espaço, como os militares, os olavistas e o grupo mais próximo do presidente, como seus filhos.

 

No Congresso, o governo não consegue coordenar nem os parlamentares de seu partido, o PSL, que tem posições às vezes conflitantes com as do Executivo. Aliás, este pessoal não percebeu que muitos foram eleitos pela onda bolsonarista e antipetista e, se o presidente fracassar, correm o risco de ter apenas um primeiro e único mandato.

 

No Congresso, a má política é prática institucionalizada e as exceções, cada vez mais excepcionais. Má, neste caso, porque aética, não centrada no bem comum, o do País e seu povo, com parlamentares mais voltados para interesses de grupos e temerosos da reação de eleitores se votarem a favor da RPS. Deveriam pensar, também, no futuro de seus filhos e parentes. Mantido o cenário fiscal atual, esse futuro será comprometido, pois tal quadro agravará ainda mais a escassez das oportunidades de trabalho e as menores remunerações nas oportunidades encontradas. Muitos não querem aprovar também a extensão desta reforma aos Estados e municípios, o que complicaria a já também gravíssima situação fiscal de muitos deles, levando ainda a sérios embates nos seus Legislativos sobre suas próprias reformas previdenciárias, repetindo batalhas similares à que hoje ocorre em Brasília, agravadas por pressões contrárias locais e, assim, bem mais próximas.

 

Também a frustração com os rumos do governo Bolsonaro, já demonstrada por pesquisas, levou a uma nova queda dos índices de confiança no início deste ano. E o que isso tem que ver com o PIB? Ora, a economia tem muito de Psicologia. Investimentos privados dependem muito do estado de ânimo dos empresários, que aqui se revela abalado pelas incertezas que cercam a gestão do governo e sua dívida. Já os consumidores, mesmo sem entender o significado disso, têm algo mais próximo a assustá-los: o próprio desemprego ou o observado no seu entorno, com o risco de passarem para este grupo.

 

Isso leva à contenção das despesas de consumo, junto com os investimentos prejudicados pelo mau humor dos empresários. Não sem razão, os investimentos sofreram forte queda no trimestre passado, à taxa de 1,7%.

 

Ou se opta pela boa política no Executivo e no Congresso ou a economia do País vai continuar no buraco em que está.

 

Ou se opta pela boa política ou a economia do País vai continuar no buraco em que está. (O Estado de S. Paulo/Roberto Macedo, economista – UFMG, USP E HARVARD-, professor sênior da USP, consultor econômico e de ensino superior)