Procura por carro 1.0 despenca na crise; é o fim dos “milzinho”?

UOL Carros

 

A atual crise do mercado brasileiro levou a mudanças no comportamento dos consumidores. Para a maioria dos analistas o grau de exigência dos compradores aumentou e o tempo dos carros básicos (também chamados de “pelados”) terminou. Pode não ser bem assim.

 

Atualmente quase todos os modelos vendidos ao cliente final (varejo) têm ar-condicionado. Tal fenômeno se explica pelo clima do país, as horas passadas em congestionamentos e, em especial, o poder aquisitivo de quem conseguiu manter sua renda nesses tempos de severa retração econômica, nunca vista antes com esse grau de intensidade em dois anos seguidos.

 

O chamado tíquete médio de venda subiu mais de 20% no acumulado de quase 24 meses consecutivos de mergulho do mercado. A parcela de pessoas que compravam o primeiro carro zero-quilômetro, depois de anos restrita a modelos usados por força de sua menor renda e da falta de boas condições de financiamento, foi reduzida drasticamente desde 2014.

 

Houve forte migração para a parte baixa da pirâmide social. Esse, aliás, é um ciclo que se repete. Na crise dos anos 1980, por três vezes seguidas o modelo mais vendido no país foi o Chevrolet Monza, um médio-compacto equivalente hoje a Cruze, Toyota Corolla ou Honda Civic.

 

Naquela época os modelos de entrada também sofreram forte retração, mas parte desse resultado se deveu a Fusca e Gol terem convivido por seis anos. Agora, apesar de o mercado continuar dominado por modelos compactos, o Corolla já aparece com certa frequência entre os cinco mais vendidos. Não chega a ser uma surpresa.

 

SUVs tomaram espaço

 

Outro fenômeno aliado a variações de poder aquisitivo envolve os modelos 1.0. Com o IPI mais baixo desde 1990, os compradores exauridos financeiramente concentraram neles suas preferências, mesmo com potência inadequada para a maioria dos carros da época.

 

Em 2001 os chamados “carros mil” representaram nada menos do que 70% dos automóveis novos vendidos no Brasil. No ano passado, esse percentual caiu para 34%. Isso ocorreu mesmo com a grande evolução de desempenho e a chegada de motores modernos de três cilindros.

 

Há, entretanto, o fenômeno de crescimento dos SUVs compactos em que o propulsor de 1 litro de aspiração natural não mostra adequação. Já entre os hatches que oferecem também motores acima de 1 litro, os de menor cilindrada reinam: Uno, 85%; Ka, 84%; Palio, 80%; Gol, 67%; HB20, 65%; Sandero, 65; e Onix, 61%.

 

Esses compradores preferem adquirir um carro com mais itens de conforto a um preço menor. Trocam potência por equipamentos.

 

Dá para reagir?

 

Quando o mercado retornar ao patamar de quatro milhões de unidades anuais (incluídos veículos leves e pesados), que muitos esperam só ocorrer em 2022 ou 2023, podem voltar aqueles que perderam a oportunidade de sair de um modelo usado para um novo.

 

Economia estabilizada e em crescimento autossustentável, baixa inflação, financiamentos a juros menores e empregos seguros formarão o cenário ideal para atrair compradores de carros básicos. Eles não se importam com rodas de liga leve ou vidros, espelhos e travas elétricos. Talvez abram mão até do ar-condicionado.

 

O sonho do carro zero-quilômetro poderá recuperar uma oportunidade perdida com tantos erros de gestão econômica nos últimos anos. (UOL Carros/Fernando Calmon)