Veja os carros que começaram mal

Jornal do Carro

 

“Como pode uma montadora lançar um carro com um motor cuja ‘morte’ já está anunciada e deverá ocorrer em, no máximo, um ano?” Questionamentos como esse têm sido feitos por especialistas de mercado desde a chegada do Mobi, em abril, e ajudam a explicar a razão de um dos principais lançamentos da Fiat nos últimos anos ter começado mal sua carreira no País. Em maio, primeiro mês completo de vendas, o compacto teve 2.407 emplacamentos – ficou na 21ª posição do ranking nacional.

 

À frente do novato, que parte de R$ 31.900, há vários modelos bem mais caros, como Toyota Corolla, Honda HR-V, Jeep Renegade e sua “irmã” Fiat Toro. O Mobi não conseguiu largar na frente nem do Volkswagen Up!, com o qual veio disputar compradores e que, até hoje, mais de dois anos após seu lançamento, também não chegou a deslanchar.

 

Por causa do começo ruim, a Fiat já revisou sua meta de vendas para o carro – de 7 mil para cerca de 5 mil unidades por mês. Mas fontes ligadas à empresa admitem que 4 mil é um número mais realista.

 

O Mobi é um dos exemplos de carros que tiveram mau começo nos últimos anos. A maioria nunca conseguiu se recuperar. “O principal problema é o momento do mercado, que fez o consumidor, especialmente desse segmento, tornar-se mais racional na hora da compra”, explica o consultor Paulo Roberto Garbossa, da ADK Automotive.

 

“Quando o cliente vai à concessionária e vê o Palio Fire (a partir de R$ 29.160), maior e mais barato, não pensa duas vezes: escolhe o veterano”, diz.

 

Ser um subcompacto é outro ponto contra o Mobi. Esse segmento, no qual os carros têm dimensões internas diminutas, mas diversas soluções modernas, de apelo emocional, ainda não caiu no gosto do brasileiro. Exemplos são a primeira geração do Ka, que nunca fez sucesso, e o próprio Up!.

 

Ainda assim, as marcas estão investindo na categoria. É o caso da Renault, que lançará o Kwid no mercado brasileiro no segundo semestre.

 

O Mobi também traz motor defasado. Trata-se do mesmo 1.0 de oito válvulas e 75 cv do Uno. Antes do fim do ano o carrinho receberá um três-cilindros mais moderno, que deve aposentar o quatro-cilindros veterano. Isso afasta o consumidor mais antenado, pois não faz sentido adquirir uma versão que em breve deixará de existir.

 

Problema semelhante vem prejudicando o Peugeot 2008, lançado em 2015. A versão com motor mais potente, 1.6 turbo, não tem opção de câmbio automático, um erro que, no Brasil, é grave para um carro tabelado acima de R$ 70 mil.

 

Durante o lançamento do utilitário-esportivo, a projeção de vendas da marca foi até modesta: mil unidades por mês. Ainda assim, o carro não alcançou esse patamar, embora tenha se aproximado em maio.

 

Adaptação para conseguir a virada. O início ruim nem sempre é sinônimo de carreira condenada. Há exemplos em que a capacidade de adaptação da montadora foi capaz de virar o jogo.

 

Com visual pouco atraente, a linha Etios (hatch e sedã) não caiu no gosto do público quando chegou ao mercado, em 2012. A boa mecânica e o preço atraente do Toyota não foram suficientes para suprir suas deficiências, que incluíam interior pobre, marcado pelo painel de instrumentos confuso.

 

A montadora esperava vender cerca de 5.800 unidades das duas versões por mês, mas os emplacamentos ficaram em torno de 2,3 mil unidades. “A Toyota já tinha enfrentado algo parecido com o primeiro Corolla brasileiro”, conta Garbossa. “Nos anos 90, o sedã chegou primeiro importado e seu visual não agradou. Na hora da nacionalização, a marca fez adaptações para garantir o sucesso do carro.”

 

Neste ano, a linha Etios recebeu melhorias, como câmbio automático, velocímetro digital e central multimídia. A recuperação foi quase imediata: no mês passado, foram emplacados 4.946 exemplares da linha, número bem mais próximo da estimativa inicial da Toyota. Isso em um mercado bem menos aquecido que o de 2012, quando a projeção foi feita.

 

“A Volkswagen é outra que sabe adaptar seus produtos”, afirma Garbossa, citando o Gol. O hatch veterano, que perdeu a liderança de vendas em 2014 e correu o risco de ficar de fora da lista dos dez mais vendidos, deu a volta por cima. Em abril e maio, ficou na terceiro posição entre os mais emplacados.

 

Para melhorar sua competitividade, a VW reestilizou o modelo e introduziu um motor mais moderno, além de central multimídia. Nos anos 80, aliás, o Gol da primeira geração ficou longe de ser um sucesso. Suas vendas só deslancharam quando os motores refrigerados a ar foram substituídos pelos a água.

 

Condenados pelo início ruim. Errar na “largada” pode ser fatal para a trajetória do carro. É o caso do Linea, sedã feito sobre a base do compacto Punto e lançado em 2008. Posicionado pela Fiat com um médio, o modelo deveria brigar com Corolla e Civic, entre outros.

 

Mas, além de mais estreito, o Linea veio com um motor antigo e menos potente que os dos rivais. Quando ganhou opção sem pedal de embreagem, a Fiat optou pela caixa automatizada Dualogic, mesma solução usada em seus modelos de entrada.

 

Na época do lançamento, o Linea vendeu cerca de 900 unidades por mês, bem abaixo dos números dos rivais. Em 2014, a Fiat até tentou consertar o erro e reposicioná-lo, para brigar com Chevrolet Cobalt, por exemplo, mas a estratégia não deu certo. No mês passado, o sedã, que deve sair de linha até o fim do ano, teve apenas 138 emplacamentos, ante os mais de cinco mil exemplares do líder, Corolla.

 

Outro exemplo é o Mégane, feito no Paraná entre 2005 e 2011. A Renault cometeu o erro de lançar o carro apenas com motor 1.6, enquanto os consumidores de sedãs médios privilegiam versões mais potentes e bem equipadas. Quando a opção 2.0 chegou, era tarde: o modelo nunca conseguiu fazer sucesso no País. (Jornal do Carro/Rafaela Borges e Hairton Ponciano)