Financiamentos recuam ao menor nível desde 2005 e agravam cenário

DCI

 

Diante do quadro persistente de incertezas na economia, o brasileiro está adiando cada vez mais a troca do automóvel. O financiamento, responsável pela maior parte das vendas de veículos no País, caiu ao menor nível dos últimos 11 anos, aprofundando a crise da indústria automotiva.

 

“O consumidor está mais hesitante para trocar o automóvel e o quadro deve piorar ao longo do ano”, diz o analista da Gipa consultoria automotiva, Rodrigo Mariotti.

 

Segundo ele, o tempo médio de troca do veículo novo era de 2,6 anos em 2013 e, no ano passado, ficou em 3,3 anos. “Para 2016, certamente essa média deve subir.”

 

Para o consultor da Route Automotive, Wladimir Molinari, mesmo com promoções, condições de “taxa zero”, valorização do usado na troca, entre outras ações, o setor não está conseguindo alavancar as vendas.

 

“De um lado, os bancos estão restringindo o crédito e aumentando os juros. Do outro, o consumidor não sente confiança para conseguir honrar as prestações”, observa Molinari.

 

Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), o financiamento automotivo caiu muito e os juros para o setor tiveram um crescimento médio de 5 pontos percentuais no último ano.

 

“Essa queda é significativa”, avaliou ontem o diretor executivo da entidade, Aurélio Santana. Ainda de acordo com a Anfavea, o uso do financiamento para a compra de veículos é o pior da série histórica (2005).

 

O presidente da entidade, Luiz Moan, explica que a queda do financiamento de veículos se deve a uma combinação de fatores. “O nível de confiança do consumidor está muito afetado pelo fantasma do desemprego e a restrição ao crédito está mais alta”, pontua.

 

De acordo com o dado mais recente da Cetip, os financiamentos de automóveis novos e usados, em fevereiro, foram de 88,4 mil unidades, queda de 9,1% na comparação anual.

 

“O crédito está muito caro e, como o pessimismo é grande no País, os financiamentos só vêm caindo”, pondera Santana.

 

Molinari, da Route, destaca que o cenário brasileiro precisa de mudanças para que as vendas voltem à estabilidade. “Enquanto a situação política não clarear, a economia não vai entrar nos trilhos.”

 

Estagnação

 

As vendas de veículos leves e pesados, em março, mostrou perda de fôlego perante o mês anterior. De acordo com a Anfavea, a venda média diária foi de 8.146 unidades no mês passado, ante 8.156 unidades em fevereiro, que teve quatro dias úteis a menos.

 

“Houve casos de concessionárias que não receberam um cliente sequer em dia de manifestação”, diz Moan.

 

Em março, a indústria emplacou 179,2 mil veículos, aumento de 22,1% em relação ao mês anterior. “Não podemos considerar o resultado como recuperação, pois praticamente mantivemos a média diária de fevereiro”, declara Moan.

 

No entanto, na comparação anual, as vendas tiveram retração de 23,6% em março. Com isso, os estoques passaram de 41 dias, em fevereiro, para 43 dias no mês seguinte.

 

Já no acumulado do trimestre, os emplacamentos recuaram 28,6%, para 481,3 mil unidades. “Sabíamos que as vendas de janeiro e fevereiro seriam ruins, mas o resultado de março descolou da nossa projeção”, acrescenta Moan.

 

Diante do quadro, a produção de veículos continua patinando. Segundo a Anfavea, em março a indústria produziu 23,7% menos do que um ano antes. No acumulado do trimestre, houve queda de 27,8%, para 482,2 mil unidades.

 

“A produção de veículos continua muito baixa, considerando os ajustes de estoques feitos pelas associadas”, observa o dirigente.

 

Com isso, o nível de emprego na indústria em março (incluindo máquinas agrícolas) recuou 1,1% na comparação anual, para 128,5 mil postos de trabalho. Atualmente, as montadoras possuem 8,24 mil trabalhadores em regime de suspensão temporária do contrato de trabalho (layoff) e 30,5 mil no Programa de Proteção ao Emprego (PPE).

 

A ociosidade média em veículos leves e pesados atingiu 61,8% no primeiro trimestre, de acordo com a Anfavea. Somente em pesados, a utilização da capacidade foi de apenas 18,4%. “O nível de produção no trimestre é o pior desde 2003”, diz Santana.

 

Exportações

 

O único indicador positivo do setor vem das exportações, que no acumulado do ano apresentaram crescimento de 24%, para 98,8 mil unidades. “Estamos reforçando o diálogo com os países do Mercosul para buscar um aumento das vendas externas”, diz Moan.

 

De acordo com a Anfavea, as exportações de veículos leves ao México tiveram um aumento de 94% no trimestre. Para o Chile, houve crescimento de 146% e, para o Peru, de 24%.

 

A entidade também está intermediando uma disputa global que prevê uma megavenda de quase 200 mil veículos – leves e pesados – ao Irã. Após a queda das sanções ao país persa, Teerã negocia a renovação de boa parte da sua frota. (DCI /Juliana Estigarríbia)