General Motors estuda cancelar investimento no País

O Estado de S. Paulo

 

A General Motors pode rever seu plano de investimento no Brasil de R$ 6,5 bilhões, anunciado em julho passado, e com previsão de cobrir gastos até 2019. O presidente mundial da empresa, Dan Ammann, teme que o País continue com a economia paralisada, o que impedirá a reação do mercado automobilístico nos próximos anos. “Tenho esperança de ver sinais de avanços políticos e econômicos nos próximos 6 a 12 meses, o que vai nos permitir seguir o curso do investimento planejado.” Do contrário, afirma ele, “vamos reavaliar”.

 

Número dois no comando da GM global – ele se reporta à executiva Mary Barra –, Ammann esteve no País na terça­feira e na quarta-feira para ver o andamento de novos projetos. Em entrevista ao Estado, mostrou­se bastante preocupado com a situação local.

 

“Estamos aqui há 91 anos e estamos acostumados com ciclos de altas e baixas no Brasil e na América do Sul, mas o que mais nos preocupa agora é que pode não haver solução nos próximos três anos”.

 

Em julho de 2015, Ammann esteve com a presidente Dilma Rousseff, em Brasília, e anunciou o aporte de R$ 6,5 bilhões, boa parte para o desenvolvimento de novos produtos e tecnologias. Na época, o mercado automobilístico como um todo já registrava queda de vendas na casa dos 20%. Mas, de lá para cá, o cenário piorou. Os negócios caíram 26,6% em relação a 2014. Fábricas suspenderam a produção várias vezes e reduziram o quadro de pessoal em 14,7 mil trabalhadores. Este ano, o mercado começou com nova queda de quase 40% nas vendas anualizadas em janeiro.

 

Ammann ressalta que o novo pacote de investimento só começará a ser efetivamente aplicado em 2017, o que dá tempo para avaliar seu cancelamento. “Dividimos nossas responsabilidades com os acionistas e qualquer investimento tem de ser avaliado à luz de um retorno”, reforça Barry Engle, presidente da GM para a América do Sul.

 

Embora não citem a palavra impeachment, os executivos da GM defendem mudanças para a volta do crescimento. “Como isso vai acontecer, depende da população brasileira”, diz Engle. “Precisa haver desesperadamente uma revisão fiscal e reformas tributária, trabalhista e regulatória. O Brasil é terrivelmente não competitivo”.

 

“A pergunta mais importante é saber quando vamos ver a estabilidade para criar uma situação que permita continuar nossos investimentos”, diz Ammann. “Estamos preocupados, pois o ambiente está instável e sem previsão para os próximos anos.” Ele sugere ao Brasil observar o que ocorre na Argentina. “O país demonstrou como a situação pode mudar rapidamente com uma liderança correta na economia.” Para ele, o mesmo tipo de perspectiva pode ocorrer no Brasil, “se as mudanças corretas acontecerem”.

 

Fábricas

 

Como as demais montadoras, a GM opera com elevada ociosidade, mas é a marca com maior número de fábricas no País. São três de automóveis – São Caetano do Sul, São José dos Campos (SP) e Gravataí (RS) – e duas de componentes – Joinville (SC) e Mogi das Cruzes (SP). Ao ser questionado sobre possível desativação de alguma delas, Ammann afirma ser “muito cedo para decidir isso”. No ano passado, o grupo encerrou atividades na Rússia por não ver futuro no negócio.

 

“Obviamente, as condições atuais do mercado são muito desafiadoras, mas estamos tocando nosso negócio de forma a otimizar os recursos numa situação difícil”, afirma ele. “Mantemos a visão de que, no longo prazo, existe um grande potencial de mercado no Brasil, mas é preciso uma grande mudança para se chegar a esse potencial”.

 

Há até pouco tempo, as montadoras falavam num mercado de quase 5 milhões de veículos no Brasil. Em 2012, as vendas atingiram 3,8 milhões de unidades (com caminhões e ônibus), mas, desde então, passaram a cair. Em 2015, foram comercializados 2,6 milhões de veículos. A GM trabalha com projeção de 2 milhões para este ano, abaixo da aposta da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), que é de 2,37 milhões de veículos.

 

O câmbio desvalorizado poderia ajudar na exportação, mas, no caso da GM, acaba atrapalhando, diz Ammann. “Temos nossas receitas e custos em moeda local, e importamos alguns componentes. Por isso, uma moeda fraca é negativa para a gente.” Ele diz ainda que, para criar oportunidades de exportação de longo prazo é preciso ter um ambiente regulatório estável, regras comerciais, regime mais simples de impostos, “e a gente não tem nada disso aqui”.

 

Além disso, segundo a GM, mesmo com dólar a R$ 4,50 o Brasil não é competitivo, pois outros países também desvalorizaram suas moedas, especialmente na América do Sul, principal cliente da marca. (O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)