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Outubro de 2010: o Latin NCAP estreava com a premissa de ser a versão para América Latina e Caribe do programa independente de testes de segurança em veículos reconhecido em regiões como Europa, Estados Unidos, Ásia/Austrália. Com apoio do Proteste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor), o programa apresentou resultados que variavam da decepção ao vexame.
Nesta segunda-feira (16), o instituto celebra cinco anos de vida, entregará os resultados de mais seis testes e pode-se dizer: vingou. Montadoras estabelecidas no Brasil já sabem quais regras seguir em termos de segurança, ao passo em que o governo encontra base para cobrar mais.
Para 2016, o Latin NCAP incorporará testes universais de colisão lateral (a 50 km/h) e poste (a 29 km/h) a todos os veículos que passarem pelo programa. Além disso, só levarão nota máxima automóveis e utilitários que oferecerem como item de série o controle eletrônico de estabilidade (ESP). “Também passaremos a sugerir que os governos autorizem a divulgação de um selo com o número de estrelas que cada carro alcançou”, completou o engenheiro uruguaio Alejandro Furas, secretário-geral da entidade.
20 anos defasado em segurança
Ainda que longe do ideal, o avanço é notório: por ocasião da primeira fase do Latin NCAP, os líderes de vendas Volkswagen Gol e Fiat Palio receberam apenas uma estrela (de cinco possíveis) no teste de segurança para ocupantes dos bancos dianteiros, feito com simulação de impacto frontal a 64 km/h. Em ambos, airbags eram apenas opcionais. Rivais como Fiat Uno, Renault Sandero, Peugeot 207 e até JAC J3 se igualaram em resultados medíocres em diferentes fases de testes.
Mais bem qualificado, o Toyota Corolla (de geração anterior à atual), com dois airbags frontais, recebeu quatro estrelas na proteção à adultos – ainda assim, o sedã obteve uma estrela em proteção infantil. Acima dele, com Chevrolet Cruze e Ford Focus receberam também três estrelas para crianças.
Em sua avaliação, à época, o Latin NCAP era enfático ao dizer que o país estava pelo menos vinte anos atrasado em termos de segurança: “Os testes evidenciam carrocerias frágeis e incapazes de aguentar fortes impactos, além de estruturas perigosas que apresentam graves riscos de lesão e até de morte a seus passageiros, especialmente a região da cabeça do motorista”.
Sobre apenas modelos mais caros receberem notas melhores, o programa foi óbvio, mas por isso mesmo preciso: segurança ainda era tratada como artigo de luxo. “Na Europa, até os carros mais baratos contam com airbags (motorista, passageiro e cortina lateral), e oferecem melhor segurança estrutural. Isso mostra que os maiores fabricantes de veículos sabem como fazer veículos com preços acessíveis que estejam de acordo com os padrões da ONU (Nações Unidas)”.
Tais resultados repercutiram negativamente e, enfim, o mundo percebeu que carros feitos no Brasil eram inseguros.
Evolução
Não dá para negar que a segurança dos carros brasileiros melhorou muito nos últimos anos. Com a pressão dos dados, houve evolução nas exigências oficiais, por parte do governo, dos consumidores e, de certa forma, das próprias montadoras – algumas já vendem segurança como diferencial de suas linhas, como o Latin NCAP previu que fosse ocorrer, quando do início de suas operações.
Medidas como a obrigatoriedade de freios ABS (antitravamento) e airbags frontais em carros novos correram o risco de serem adiadas, mas acabaram validadas pela pressão de órgãos da sociedade. Basta lembrar do adeus moroso de Kombi, Gol G4 e Mille, com tentativas fracassadas de reviravolta. Enfim, viraram peças de museu automotivo.
Com isso, o nível das avaliações foi melhorando e obter cinco estrelas se tornou objetivo relevante no setor. Volkswagen Golf e Jetta, Ford EcoSport e Focus 3 são alguns modelos a receber a nota máxima em um dos critérios do Latin NCAP. E, em julho deste ano, o SUV compacto Jeep Renegade se tornou o primeiro veículo fabricado a receber cinco estrelas tanto na proteção para adultos, quanto na infantil.
Ainda há muito a avançar: modelos campeões de venda, como Chevrolet Onix (atual “best seller” no Brasil) e Hyundai HB20, ainda são mal-avaliados em alguns dos quesitos. De toda forma, o Latin NCAP já avisou que seguirá cobrando mais. Mas o próprio programa precisa melhorar.
Por conta, o programa latino-americano ainda não consegue acompanhar o ritmo de lançamentos das fabricantes, e demora para avaliar veículos importantes. Um exemplo é o Honda HR-V, SUV compacto lançado há oito meses, que já é o mais vendido do Brasil, mas não tem notas de segurança.
Além disso, os métodos seguem aquém daqueles praticados na Europa, mesmo com as novas regras, mais duras, previstas para serem aplicadas em 2016. Em entrevista exclusiva para UOL Carros via e-mail, o secretário-geral da entidade, Alejandro Furas, afirmou que falta apoio dos governos locais para que os testes de segurança atinjam o mesmo patamar do Euro NCAP.
“Somos uma organização independente e com fundos limitados. Por isso não conseguimos avaliar todos os modelos disponíveis no mercado. Na Europa há mais dinheiro, porque o apoio dos governos nacionais, da Comissão Europeia de Segurança na Estrada e das montadoras é maior”, declarou.
Ainda assim, o secretário-geral acredita que o órgão tem conseguido cumprir com seus objetivos: “As montadoras já estão levando em conta nossos critérios na hora de desenvolver seus novos produtos. Também temos sido fonte mais constante de consulta para os governos”, apontou. Este é o caminho. (UOL Carros/Eugênio Augusto Brito e Leonardo Felix)