The Wall Street Jornaul
A desaceleração econômica da China que está agitando os mercados globais também está mudando o destino das multinacionais que atuam no país.
Aquelas que alimentaram os setores tradicionais da China de infraestrutura, energia e aço como a mineradora angloaustraliana BHP Billiton Ltd. e a produtora francesa de equipamentos de energia Schneider Electric SE estão vendo um colapso em suas receitas depois de anos de lucros impulsionados pelo crescimento econômico de mais de 10% ao ano do país. Muitas também enfrentam grandes baixas contábeis à medida que seus planos de investimento prevendo um aumento da demanda chinesa agora se tornam irrealistas com a desaceleração da economia.
Em contraste, empresas como a Apple Inc., fabricante do iPhone, e a Samsonite International SA, de malas, que servem consumidores chineses, especialmente sua emergente classe média, estão obtendo melhores resultados, já que a demanda no varejo permanece forte.
“Nós estamos gastando o mesmo de sempre”, diz a editora de revista Zhen Lin, de 27 anos e em licença maternidade, ao sair de um supermercado em Pequim com um carrinho cheio de produtos. Ela diz que come fora de casa várias vezes por semana e não está reduzindo seus gastos. Entre as compras que está planejando estão um computador novo ainda este ano e um carro novo nos próximos dois anos.
A mudança na sorte das empresas internacionais na segunda economia do mundo ocorre depois de 20 anos em que a China não foi só o chão de fábrica do mundo, mas um Eldorado para firmas estrangeiras de todo tipo.
Grandes marcas de luxo e outras de varejo, assim como as montadoras ocidentais, tornaramse tão comuns nas ruas de Xangai quanto nas de Nova York ou Londres. A China se tornou o maior mercado de carros do mundo um ponto de vendas fundamental para empresas como General Motors Co. e Volkswagen AG. As vendas de produtos de luxo na China saltaram 30%, para 266 bilhões de yuans (US$ 41,1 bilhões) em 2011. Em 2012, os consumidores chineses foram responsáveis por 25% de todas as compras de itens de luxo do mundo. A Giorgio Armani SpA tinha cerca de 300 lojas na China na época, um pouco menos que as 380 pontos do WalMart Stores Inc.
Grandes petrolíferas como BP PLC e a Royal Dutch Shell PLC investiram em projetos na China, e centenas de outras empresas industriais ampliaram a produção no mundo todo para atender a demanda chinesa. A China ainda consome quase 50% do cobre produzido no mundo e é o segundo maior importador de petróleo. Ela também consome 45% do aço mundial, mas alguns analistas reconhecem que sua demanda pode já ter atingido o pico.
A desaceleração no crescimento chinês que começou em 2011 está mudando a equação. A produção industrial em julho cresceu 6% em relação ao mesmo período do ano anterior, menos que a metade de seu crescimento anual de 14% de julho de 2011. Os empreendimentos imobiliários estão paralisados, com shoppings e apartamentos residenciais vazios pontilhando muitas das cidades menores do país. Novas construções de prédios de escritórios caíram quase 15% nos primeiros sete meses do ano ante o mesmo período do ano anterior. Em 2014, elas cresceram 6,7%.
As vendas do varejo se mantiveram relativamente bem durante os últimos anos, com o crescimento desacelerando para 10,5% em julho ante 12,2% no mesmo mês de 2014 e 17,2% em 2011.
Os contrastes no mundo corporativo têm sido gritantes. A BHP Billiton, maior mineradora do mundo, que lucrou US$ 23,6 bilhões há quatro anos, teve lucro de apenas US$ 1,9 bilhão em 2014. Na terçafeira, ela descartou a crença duradoura de que a China produziria mais de 1 bilhão de toneladas de aço por ano até meados da próxima década e agora prevê que a produção atingirá no máximo 935 milhões de toneladas. A petrolífera americana Chevron Corp. registrou baixas contábeis de US$ 2 bilhões no segundo trimestre depois que a queda nos preços do petróleo a levou a suspender projetos. A decisão, em parte, foi tomada devido à desaceleração chinesa.
A Schneider Electric, uma das principais fornecedoras mundiais de interruptores, disjuntores e outros equipamentos elétricos usados em edifícios e redes de energia, rebaixou sua meta de lucro para o ano, atribuindo isso em grande parte à desaceleração do crescimento da China.
A Caterpillar Inc. informou no mês passado que as vendas na região da Ásia e Oceania de seus equipamentos de construção recuaram 30% no segundo trimestre, com grande parte desse declínio vindo da China.
Enquanto isso, a fabricante de malas Samsonite informou que as vendas na China no primeiro semestre subiram 30% excluindo os efeitos do câmbio, ajudando a elevar a receita geral para o valor recorde de US$ 1,2 bilhão. A Apple informou que seus negócios na China mais que dobraram para US$ 13,23 bilhões no último trimestre, e seu diretor-presidente, Tim Cook, assegurou a investidores assustados no início da semana que os negócios ainda estavam fortes em julho e agosto.
A marca esportiva alemã Adidas AG elevou suas vendas na China no primeiro semestre em 1,16 bilhão de euros (US$ 1,34 bilhão), alta de 20% em relação ao ano anterior excluindo os efeitos cambiais. Grande parte do crescimento veio da expansão agressiva em todo o país, onde a Adidas tem mais de 8.400 lojas.
“Os velhos condutores de crescimento estão no fundo do poço. Os novos condutores consumo e serviços estão se mantendo até agora, mas o debate ainda está aberto”, diz Andrew Polk, economista do grupo de pesquisa Conference Board.
Algumas das empresas com melhor desempenho estão se concentrando em uma nova fatia da população que está crescendo e se parece cada vez mais com a classe média americana. Essas pessoas estão gastando pela primeira vez com viagens internacionais, alimentos importados e ingressos para shows.
A renda está subindo para boa parte da população. Entre 2005 e 2012, cerca de 50 milhões de domicílios urbanos entraram na classe média, que agora totaliza 147 milhões de domicílios, cerca de 49% da população urbana da China, segundo a Boston Consulting Group. Esses consumidores agora compram produtos como o shampoo Dove da Unilever PLC e a pasta de dente Crest da Procter & Gamble Co. em vez de marcas locais. Mais de 25 mil domicílios também estão na classe média alta. Segundo o BCG, esse número deve triplicar até 2020.
Mas o consumo não é suficiente para substituir o investimento industrial que deu impulso ao boom econômico da China e, se a economia continuar a cair, muitos chineses podem perder os empregos que alimentam seus gastos. O crescimento dos salários do país já abrandou em 2014. As cidades menores, alvos de expansão das empresas, talvez deixem de oferecer oportunidades de crescimento, alerta Polk. (The Wall Street Jornaul/Laurie Burkitt, Brian Spegele e Phred Dvorak.)