São números alarmantes: com apenas 12% do esgoto tratado no Rio Grande do Sul, metade das águas do Rio Gravataí, na Região Metropolitana de Porto Alegre, está inutilizada. Análises da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) mostram que o oxigênio no rio Gravataí, o 5º entre os mais poluídos do Brasil, é quase inexistente, com níveis abaixo do recomendado para a vida de peixes e outros seres vivos. Além de garrafas, objetos de plástico e até eletrodomésticos, há a contribuição do esgoto de cidades vizinhas. Por lei, o número de coliformes não deve ultrapassar 1 mil a cada 100 ml de água, mas os níveis encontrados superam 142 vezes o volume permitido.
Ao contrário de outras regiões do país, no Rio Grande do Sul cabe à indústria e não ao Estado a destinação e tratamento do esgoto sanitário, e o Consema (Conselho Estadual do Meio Ambiente) estabelece como padrão a concentração máxima de 20 mg/l de Nitrogênio Amoniacal para qualquer efluente a ser lançado, independentemente da vazão. Na Dana, embora na média a meta fosse atendida, em eventuais condições isso poderia não ocorrer, já que se trata de um processo biológico. Para evitar esse risco, a empresa adotou uma abordagem inédita do processo de tratamento deste efluente.
O efluente no complexo onde trabalham 1.200 pessoas é composto por 60% de efluente cloacal e 40% industrial. A análise da composição do efluente tratado identificou, além do Nitrogênio Amoniacal, Fósforo e Potássio em níveis legalmente aceitáveis. Essa interessante combinação é a base dos principais fertilizantes comercializados. Surgia ali a base do Projeto Zero Efluente, que além de atender às premissas internas de sustentabilidade, se ajusta à legislação. A iniciativa propõe um novo enfoque para a solução do que é visto tradicionalmente como um problema – um projeto inovador em sua concepção e altamente sofisticado em seus controles e indicadores de gestão. Embora, entre 2012 e 2015, o investimento para implantação do sistema tenha sido considerável (R$ 350.000,00), o custo com a manutenção mensal é de apenas R$ 1.000,00 devido à originalidade da proposta: sofisticação e automação do sistema.
O Projeto Zero Efluente passou por licenciamento da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (FEPAM), órgão regulador ambiental do Estado do Rio Grande do Sul. O volume de resíduos licenciado é de 100 m³/dia, ou 100 mil litros/dia. Embora a questão do tratamento do esgoto não seja o principal viés deste projeto, ele é parte importante. De acordo com dados mundiais, o consumo médio de água tratada e encanada numa residência com quatro pessoas é estimado em aproximadamente 22m³. Assim, o volume tratado em apenas um dia pelo Projeto Zero Efluente equivale ao consumo de água tratada de quatro famílias ao longo de um mês.
Quanto à área licenciada, não se trata de uma propriedade degradada. Optou-se por utilizar no experimento uma parte do terreno ligada à área da empresa, dividida em nove módulos, totalizando 2,87 hectares. Inicialmente foram projetados quatro módulos para aplicação do efluente: as quatro áreas foram subdivididas, constituindo-se os nove módulos entre 0,17 e 0,34 hectares. Em cada um deles foram analisadas características de solo e cultura e a capacidade de absorção, evitando a geração de escoamento superficial que poderia provocar erosão.
Assim, o sistema irriga alternadamente cada módulo. Toda a aplicação do efluente no solo, nas nove áreas fertirrigadas, é balizada por um Controlador Lógico Programável (CLP). O equipamento, projetado para comandar e monitorar máquinas ou processos industriais, funciona aqui como um computador especializado e, baseado em um microprocessador, desempenha funções de controle com softwares desenvolvidos pela empresa. Assim, estão programados o volume de efluente tratado máximo diário para cada módulo, de acordo com os volumes licenciados. Além do CLP, o sistema possui também um detector de umidade que interrompe a aplicação dos efluentes nos dias de chuva a fim de evitar escoamento superficial e o risco de erosão.
Antes de ser lançado ao solo por meio de aspersão, o efluente bruto (efluente industrial e cloacal) recebe tratamento, que consiste na oxidação da matéria orgânica complexa, a carga poluidora, através de reações de oxidação geradas por micro-organismos que utilizam a carga poluidora existente nos esgotos como substrato (alimento). Utiliza-se a tecnologia skid para tratamento de águas residuárias domésticas/industriais, baseada na tecnologia de leitos móveis, na qual os micro-organismos crescem fixados em um meio suporte móvel, formando um biofilme de intensa atividade biológica, alto tempo de retenção celular e alta concentração de biosólidos com grande remoção de carga orgânica e carga nitrogenada. O tratamento é contínuo e ocorre em meio aeróbio (em presença de oxigênio). O lodo, resíduo sólido resultante do processo tem como destino, previsto na legislação, a ETE.
Uma vez que os propósitos do Projeto Efluente Zero estão, mensalmente, atingindo seus objetivos, a continuidade é uma decorrência, garantindo que os KPIs (Key Process Indicators) se mantenham e fazendo as correções necessárias dentro da gestão prevista do projeto. Contudo, considerando a perspectiva de evolução, mesmo sem uma data definida, o próximo passo envolve estudos de viabilidade para produção de adubo sólido, por meio de compostagem, da vegetação proveniente das áreas fertirrigadas.
Benchmarking
O Projeto Efluente Zero rendeu à Dana o Prêmio Selo de Compromisso Ambiental 2016, na categoria Empresas/Indústrias, concedido pela Câmara de Vereadores de Gravataí (RS), e o Prêmio Benchmarking Brasil pela segunda consecutiva. Além de obedecer aos parâmetros legais, meta não negociável e explicitada nos valores corporativos da empresa, sugere um modelo replicável e sustentável para o setor industrial, instalado naquela região que tem o Rio Gravataí como corpo receptor. A amplitude da disseminação e replicabilidade estão no fato de que o projeto contempla o tratamento e destino dos efluentes brutos, que combinam os de origem industrial e o esgoto cloacal. Toda iniciativa em transformar um potencial impacto ambiental adverso em benéfico, que não só cessa o dano, mas apresenta uma aplicação de uso alternativo, deve ser comemorada.
Política ambiental da Dana
A política ambiental da Dana foi firmada em 1999 e se tornou a raiz de muitas ações implementadas, inclusive no Brasil, estabelecendo as diretrizes para a prevenção da poluição e geração de resíduos resultante das operações e da aplicação de produtos no mercado, com ênfase na redução da geração de resíduos sólidos, efluentes líquidos e consumo de recursos naturais. A Dana acredita que a verdadeira sustentabilidade exige equilíbrio entre progresso social, proteção ambiental, utilização econômica dos recursos, crescimento econômico e emprego e está comprometida com as comunidades do entorno. Em 2007, por exemplo, a empresa recuperou uma área proveniente de um Aterro de Resíduos Industriais Perigosos (ARIP) para depósito de lodo industrial. Na década de 1990, os aterros eram a alternativa mais segura para a natureza, pois não havia processos modernos de reciclagem. O processo envolveu análises do solo e da água subterrânea na área do extinto aterro, confirmando que nenhum resíduo contaminou o meio ambiente gaúcho, mas foi uma ação preventiva, alinhada à política ambiental. A área foi completamente recuperada e homologada pelos órgãos competentes, dando lugar a um jardim de plantas nativas.