O Estado de S. Paulo
O vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, afirmou ontem que o Brasil vai procurar o governo americano para negociar uma solução para as tarifas de 25% sobre o aço e alumínio, anunciadas na segunda-feira pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Ele disse já ter conversado com a embaixadora do Brasil nos EUA, Maria Luiza Viotti, para iniciar o contato. “Sempre é um bom caminho a gente buscar o ganha-ganha”, disse Alckmin, ao ser questionado sobre medidas de reciprocidade. Alckmin deu as declarações em entrevista a jornalistas no Palácio do Planalto.
Para o vice-presidente, uma boa alternativa a ser negociada seria a manutenção de cotas para importação de aço pelos Estados Unidos. A taxa de 25% imposta pelo governo americano atinge diretamente o Brasil, que em 2024 foi o segundo maior exportador de aço para os EUA, só atrás do Canadá. Segundo Alckmin, há “várias interlocuções” com o país.
Atualmente, o Brasil exporta para os americanos pelo sistema de cotas, de 3,5 milhões de toneladas de aço semiacabado e 687 mil toneladas de laminados por ano. O modelo foi estabelecido em 2018, durante o primeiro governo Trump, quando o País negociou uma saída para escapar da sobretaxa imposta pelo republicano à época. O governo brasileiro quer fazer o mesmo agora.
“Porque, quando lá atrás foi aumentado (a tarifa), foram estabelecidas as cotas. Que é um mecanismo inteligente, porque, se você aumenta o Imposto de Importação, o aço, para os Estados Unidos, isso tem um efeito na cadeia. Você tem um encarecimento na cadeia. Então, o que foi feito anteriormente? Cotas. Essa é uma boa solução. Então, o caminho é o diálogo”, disse.
Alckmin foi questionado sobre a possibilidade de o Brasil responder com tarifas para produtos americanos, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia indicado que poderia fazer na semana passada, e desconversou. Repetiu que o caminho é o diálogo.
Foco na negociação
As declarações de Alckmin confirmam que, ainda que a sanção imposta pelo governo Trump afete todos os países que exportam aço e alumínio para os EUA, o Brasil deve iniciar uma negociação individual com o governo americano – e não retaliar, como chegaram a defender aliados do presidente Lula.
A sinalização ocorre nas primeiras reuniões de auxiliares de Lula com representantes do setor privado para coletar informações sobre como atuar contra a tarifa de 25%. Nas conversas de técnicos e diplomatas com representantes do setor privado, os auxiliares do presidente têm se concentrado em questões sobre o que é prioritário para as empresas brasileiras. E a resposta tem sido manter o atual acordo de comércio. Ou seja, agir de maneira pragmática.
Pessoas que acompanham esse trabalho afirmam que o Brasil tem uma situação diferente da europeia, por exemplo, que na terça-feira se manifestou com críticas à decisão de Donald Trump e ameaçou retaliar os EUA. Em 2018, os europeus não escaparam da taxação dos americanos e, provavelmente, isso deve se repetir agora.
O governo brasileiro está reunindo informações das siderúrgicas brasileiras, mas principalmente está formando opinião sobre quais argumentos deve defender na negociação com os Estados Unidos.
Já o setor privado se prepara para contratar escritórios de lobby e de consultoria em Washington, nos mesmos moldes do que foi feito em 2018, e elaborar material em inglês que possa subsidiar missões brasileiras aos Estados Unidos. A expectativa é de que governo e empresários atuem juntos na negociação com os representantes comerciais americanos.
Um dos pontos que, já se sabe, deverão ser destacados nessas tratativas é o superávit que os americanos têm na relação comercial com o Brasil, além da relevância das siderúrgicas brasileiras na compra de carvão de coque dos Estados Unidos. No caso do aço, as atividades das fábricas americanas e brasileiras são consideradas complementares e não concorrentes, uma vez que o Brasil exporta matéria-prima. Os argumentos são semelhantes aos apresentados na negociação de 2018.
Dessa vez, porém, há informações falsas sobre as exportações do Brasil que precisarão ser atacadas, como o argumento de que o País passou a importar aço da China para vender aos Estados Unidos. As empresas brasileiras reuniram dados para mostrar que o País vem tentando se defender da enxurrada de produtos siderúrgicos chineses desde então. Em outra frente, afirmam que, pelo sistema alfandegário americano, é impossível entrar mais produtos nos Estados Unidos do que o fixado pelas cotas, como também chegou a especular o decreto de Trump.
O momento é de coleta de informações para abrir a negociação, com o argumento de que não se trata de uma medida contra o Brasil ou contra setores específicos, mas uma estratégia política de Trump que pode ter efeitos negativos para os próprios americanos.
Publicamente, o governo brasileiro tem mantido uma postura de cautela que vem sustentando desde domingo, mantendo o trabalho nos bastidores, o que provocou alívio entre empresários do setor siderúrgico e a confiança de que o caminho será pela negociação. A diplomacia brasileira aguarda ainda a comunicação formal, pelos EUA, das sanções impostas e considera haver tempo para negociar, dado que a medida só entrará em vigor em 12 de março. (O Estado de S. Paulo/Caio Spechoto, Amanda Pupo e Mariana Carneiro)