O Estado de S. Paulo/Mobilidade
Embora as vendas de veículos eletrificados estejam em alta no Brasil, as montadoras ainda desconhecem qual é, exatamente, o perfil do consumidor interessado nesse tipo de tecnologia, que ainda é relativamente recente no País.
Para jogar luz sobre o que pensa esse público, a Associação Brasileira de Empresas Importadoras de Veículos Automotores (Abeifa) encomendou para a empresa Dados X uma ampla pesquisa denominada “A jornada de compra de veículos eletrificados”.
Com duração de dois meses, o levantamento acompanhou inicialmente o movimento de 3 milhões de pessoas nas ferramentas digitais. Depois de um primeiro funil, passou a se concentrar em 268 mil potenciais clientes que, efetivamente, iniciaram o processo de aquisição. “Trata-se de uma análise minuciosa do comportamento de quem pretende comprar carros elétricos e híbridos”, afirma Galileu Prezzotto, CEO da Dados X.
A primeira conclusão do estudo chama atenção: no ano passado, 88.250 veículos eletrificados deixaram de ser vendidos para os chamados “early adopters”, os consumidores que correm para comprar pela primeira vez uma novidade. Os motivos passam pela indecisão se o carro se encaixa no estilo de vida do consumidor (29%), insegurança provocada pelas análises negativas publicadas em sites e mídias sociais (25%), falta de confiança no momento da compra (22%) e resistência familiar (13%).
Efeito Tesla
Segundo a pesquisa, o aumento do interesse por um automóvel 100% elétrico ou híbrido é determinado por uma série de fatores promovidos pela indústria automotiva e políticas do governo.
A previsão é que no primeiro trimestre deste ano a jornada de compra cresça de 24% a 32%. “Cerca de 54 mil pessoas demonstraram ser movidas por certos estímulos, como desconto nos preços, entrada facilitada e financiamento”, diz Prezzotto.
O estudo apontou que o tempo médio da jornada de compra de um automóvel com motor a combustão vai de um a dois meses. Mas, quando os interessados se deparam com a possibilidade de escolher um eletrificado, o período se estende: 53% que queriam, inicialmente, um carro tradicional demoraram mais três ou quatro meses, porque também começaram a pesquisar veículos elétricos e híbridos. Desse universo, 72% eram mulheres.
“O carro elétrico é para quem deseja muita tecnologia e ele não tira o público de quem prefere motor a combustão. Ainda não existe esse impacto de um sobre o outro”, conta o CEO da Dados X. “O mercado brasileiro é muito peculiar. Apesar do dólar em alta, o modelo eletrificado tem consumo garantido.”
De 2022 até o primeiro semestre de 2023, 95% dos clientes concluíram a jornada de compra de um carro totalmente elétrico e 5% de um híbrido, graças ao “efeito Tesla”. “Naquele momento, os modelos da fabricante americana ocupavam o noticiário e muita gente ficou curiosa para entender aquela tecnologia”, explica.
Em 2023, a divisão mudou para 70% de aquisição de elétricos, 25% híbridos e 5% híbridos plug-ín. No ano passado, os veículos híbridos viraram o jogo: 65% do total. A pesquisa revela certa frustração do cliente ao ter contato com as limitações do carro elétrico, o que leva a maioria a optar pelo híbrido.
Haters
Das 18 milhões de buscas de informações sobre os eletrificados, entre dezembro de 2024 e janeiro de 2025, 38% eram de questionamentos a respeito de funcionamento, custos, além de vantagens e desvantagens. “Essas dúvidas causaram algumas desistências”, salienta Prezzotto.
A pesquisa identificou que as faixas etárias mais propensas a comprar um eletrificado são de 35 a 40 anos (26%) e 41 a 45 anos (25%). Em seguida, aparecem 30 a 34 anos (15%), 50 a 55 anos (14%) e mais de 55 anos e de 25 a 29 anos empatados com 10%. Ou seja, os extremos – os mais jovens e os mais velhos – ainda não abrem mão do veículo a combustão.
Um dado estarrecedor colhido pelo levantamento diz respeito à guerrilha digital presente, atualmente, nas mídias sociais. O veículo eletrificado também está no alvo do bombardeio. O contingente avaliado detectou a presença de 16 mil haters, cujos posts contrários aos veículos eletrificados impactam cerca de 2 milhões de pessoas.
Diante disso, as montadoras que mais se empenham para a eletrificação automotiva estão diante de uma missão difícil. A pesquisa aponta quatro tarefas importantes para elas: aumentar a confiança do cliente, reduzir o tempo da jornada de compra, facilitar a escolha do modelo e gerar confiança na indústria. “Agora, a batata quente está em nossas mãos”, afirma Marcelo Godoy, presidente da Abeifa. “Precisamos fazer a lição de casa e melhorar o trabalho de informação e educação para dar uma resposta eficiente aos haters”, finaliza. (O Estado de S. Paulo/Mobilidade/Mário Sérgio Venditti)