O Estado de S. Paulo
A proposta do governo de isentar de Imposto de Renda salários até R$ 5 mil mensais não deve ter análise rápida no Congresso. De acordo com os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSDMG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a aprovação vai depender da existência de “condições fiscais”. Após essas declarações, o dólar, que no início do dia era cotado a R$ 6,11, chegou a recuar para R$ 5,95, mas fechou em R$ 6, recorde nominal. Ontem, ao participar de evento promovido pela Febraban, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, voltou a dizer que o governo está aberto a discutir novas propostas de ajuste se isso for necessário. Na análise do mercado, o Copom vai acelerar a elevação da Selic como consequência do pacote. Analistas já estimam alta de 0,75 ponto para a taxa básica de juros em dezembro. Com isso, ela passaria a 12% ao ano.
Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), indicaram ontem que a proposta do governo para isentar de Imposto de Renda os salários até R$ 5 mil mensais não terá uma análise rápida no Congresso e que a sua aprovação vai depender de “condições fiscais”.
“A questão de isenção de IR, embora seja um desejo de todos, não é pauta para agora e só poderá acontecer se (e somente se) tivermos condições fiscais para isso. Se não tivermos, não vai acontecer”, disse Pacheco, que divulgou nota. “Mas essa é uma discussão para frente, que vai depender muito da capacidade do Brasil de crescer e gerar riqueza, sem aumento de impostos.”
Pacheco afirmou ainda que é preciso “afastar o medo da impopularidade que ronda a política” quando se trata de política fiscal e que o Congresso deve apoiar “as medidas de controle, governança, conformidade e corte de gastos, ainda que não sejam muito simpáticas”. “Inclusive, outras podem ser pensadas, pois esse pacote deve ser visto como o início de uma jornada de responsabilidade fiscal”, acrescentou.
O presidente da Câmara foi na mesma linha. Em publicação no X (antigo Twitter), disse que haverá celeridade na análise de propostas para o ajuste das contas, mas que iniciativas que implicam renúncia fiscal terão de passar por análise “cuidadosa” e “realista”. “Qualquer outra iniciativa governamental que implique renúncia de receitas será enfrentada apenas no ano que vem, e após análise cuidadosa e sobretudo realista de suas fontes de financiamento e efetivo impacto nas contas públicas. Uma coisa de cada vez. Responsabilidade fiscal é inegociável.”
Promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a mexida no IR foi anunciada pelo governo com o pacote de corte de gastos. A indicação da equipe econômica é de que seria uma reforma “neutra” do ponto de vista tributário, já que o aumento da isenção seria compensado pela taxação dos salários superiores a R$ 50 mil mensais. O temor do mercado, porém, é de que a isenção do IR seja aprovada com maior velocidade no Congresso – por se tratar de uma medida popular –, enquanto a compensação com a tributação dos mais ricos não avance nas discussões.
Divulgadas no início da tarde, as declarações de Pacheco e Lira tiveram inicialmente efeito positivo sobre o dólar, que até então era cotado a R$ 6,11. Esse valor chegou a recuar para R$ 5,95. “O mercado interpretou essas mensagens como um movimento em direção à responsabilidade fiscal, ajudando a amenizar a tensão provocada pelos anúncios de ontem (quinta-feira)”, afirmou o head de câmbio da B&T Câmbio, Diego Costa.
No fim do dia, porém, o dólar retomou a trajetória de alta, fechando em R$ 6, recorde nominal, com alta de 0,2%. Só nesta semana, a valorização acumulada foi de 3,21%.
Ontem, ao participar de evento promovido pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, voltou a dizer que o governo está aberto a discutir novas propostas se isso for necessário.
Como informou o Estadão, o anúncio do aumento da isenção de IR para a faixa de até R$ 5 mil representou uma derrota para a equipe econômica nas discussões internas do governo. Nos bastidores, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vinha tentando dissuadir o presidente Luiz de anunciar a medida neste momento, por entender que ela merece uma discussão à parte, dentro da reforma da renda – que ainda está em fase de elaboração.
Acabou prevalecendo, porém, a ideia de que o anúncio poderia contrabalançar o efeito negativo de medidas para a contenção de despesas do governo. Entre outras propostas, o pacote prevê alteração da correção do salário-mínimo e para concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC, pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda) e do abono salarial.
Ministro da Fazenda diz que pacote não é ‘bala de prata’ para resolver o desequilíbrio fiscal
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse ontem que o pacote de ajuste anunciado na quarta-feira não representa o “gran finale” do esforço do governo em reequilibrar as contas públicas. Ele reiterou que, se necessário, a equipe econômica apresentará outras medidas para a contenção de gastos.
“Esse conjunto de medidas não é o ‘gran finale’, não é bala de prata. Daqui a três meses, posso voltar à planilha para discutir a evolução do BPC (Benefício de Prestação Continuada, pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda) e da Previdência”, afirmou o ministro, durante almoço de fim de ano com dirigentes da Febraban, a entidade que representa os bancos.
Haddad pediu um “pouco de cautela” dos analistas na avaliação “rubrica a rubrica” das medidas propostas. Se houver algum erro de cálculo, o ministro disse que voltará a conversar com o Congresso e com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ele salientou que o governo está cumprindo a promessa, feita há dois anos, de buscar o equilíbrio fiscal e atendeu, com o pacote, aos pedidos do mercado para reforçar o arcabouço. E frisou que todos os Poderes precisam entregar a sua cota de contribuição ao ajuste. “Não é tarefa só do Executivo. Temos que convencer o Congresso Nacional que bondades precisam ser compensadas”, declarou o ministro, acrescentando que o Legislativo fez um “belo trabalho” para diminuir os gastos tributários no País.
O ministro disse ainda que o governo tenta corrigir dez anos de déficit primário, e assegurou que a meta fiscal será cumprida em seu limite inferior. Mais uma vez, afirmou que o objetivo de déficit zero só não será entregue neste ano porque não houve aprovação da proposta de acabar com a desoneração da folha de pagamento e os incentivos ao setor de serviços.
Ele reforçou também sua crença no ajuste fiscal e disse que “ninguém quer vender fantasia ou mágica”. “Eu acredito no ajuste, defendo ele onde vou, é crença minha. Agora, não vamos conseguir fazer tudo o que tem que ser feito com bala de prata”, concluiu.
Tebet
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, disse que o governo vai mirar o centro da meta de déficit zero no primário do ano que vem. “Vamos fazer ajustes sem retirar nenhum direito, mas tudo tem que estar no orçamento”, disse Tebet. A ministra enfatizou que não estaria no governo Lula se não acreditasse na responsabilidade fiscal.
Tebet lembrou que o País deve crescer acima de 3% este ano, com desemprego menor, após ter crescido quase 3% no ano passado. (O Estado de S. Paulo/Antonio Perez e Fernanda Trisotto)